Os investidores esperando um ponto de inflexão no negócio da Ambev talvez tenham que esperar sentados.

O resultado do primeiro trimestre da Heineken, divulgado hoje, diz que “no Brasil, o volume [do mercado de cerveja] declinou dois dígitos, refletindo a continuada fraqueza macroeconômica no segmento mainstream”, no qual a Ambev faz a maior parte de seu volume e faturamento.

Mas se as coisas no segmento econômico não foram bem, no mercado premium a Ambev também enfrenta dificuldade: os comentários da Heineken sugerem que ela continua a ganhar share.  “O portfólio premium performou acima do mercado com a continuação do crescimento de dois dígitos da Heineken,” a empresa disse aos investidores, acrescentando que a marca Amstel “também entregou um crescimento forte.”

O segmento premium — no qual a Ambev trabalha com as marcas Corona, Stella Artois e Budweiser — tem margens substancialmente maiores que o mercado mainstream, e é hoje o grande ‘cash cow’ das cervejarias.

Em diversos mercados regionais, a Ambev tem tido dificuldade em manter o prêmio da marca Budweiser, cuja precificação está cada vez mais próxima ao segmento mainstream e cada vez mais sujeita à atividade promocional, fontes do setor disseram ao Brazil Journal.

No mesmo release de resultados, a Heineken — que hoje distribui seus produtos no Brasil através do Sistema Coca-Cola — disse que vai passar a usar a rede de distribuição da Brasil Kirin (antiga Schincariol), cuja aquisição a Heineken anunciou há dois meses.

Esta, na opinião do analista do Credit Suisse Sanjeet Aujla, é uma boa notícia para a Ambev.

“Vimos a decisão da Heineken de levar seu portfólio para a rede da Kirin como surpreendente.  Estimamos que os distribuidores do sistema Coca-Cola atinjam cerca de 1 milhão de pontos de venda no Brasil, enquanto a rede da Kirin deve atingir apenas uns 550 mil. A lógica de longo prazo por trás desta decisão parece se apoiar no fato de que a Heineken poderá desenvolver um canal de distribuição próprio no Brasil, que já é o segundo mercado da Heineken em faturamento, sem depender mais da Coca-Cola.”

“Ainda assim, no curto prazo, achamos que esta opção feita pela Heineken será disruptiva, e deve criar oportunidade para os concorrentes ganharem share. Como a Ambev está focada em melhorar sua distribuição e aumentar seu faturamento (talvez em detrimento de suas margens), achamos que ela pode ser favorecida por essa distribuição mais estreita da Heineken.”

A distribuição da Brasil Kirin é forte no Nordeste mas tida como deficiente no resto do País.  A decisão da Heineken é uma aposta arriscada porque vai exigir investimentos pesados por parte dos pequenos distribuidores, que terão que investir em mais caminhões, armazéns, sistemas de roteirização e equipes de execução.  Se a transição não for bem feita, pode haver gargalos na distribuição levando à falta de produto.

 

UPDATE:  

A Heineken entrou em contato com o seguinte posicionamento oficial:
 
“Com relação a matéria publicada hoje no Brazil Journal a HEINEKEN esclarece que anunciou em seu balanço trimestral que confirma sua intenção em alavancar o modelo de “route to market” existente na Brasil Kirin. A conclusão da aquisição está sujeita à aprovação regulatória habitual e está prevista para o primeiro semestre de 2017.  A empresa não confirma o encerramento da parceria com a Coca-Cola.”