Um dos investidores mais respeitados do País usou sua carta mensal para denunciar o surto populista do Governo Bolsonaro, que nas últimas semanas vem propondo medidas fiscalmente insanas numa tentativa desesperada de se reeleger.

Num comentário intitulado “Terraplanismo econômico,” a Verde Asset Management, de Luis Stuhlberger, diz que já não há mais diferença entre as agendas econômicas de Bolsonaro e do PT, e alerta para uma ‘bola de neve’ nos juros se as propostas da dupla Centrão-Bolsonaro prosperarem.

Stuhlberger disse ao Brazil Journal que a Verde decidiu fazer “uma carta dura” para alertar a sociedade sobre a gravidade dos problemas gerados pelo populismo do final de mandato.  “Não tem limite o estrago,” disse Stuhlberger.

“No réveillon governista, parece difícil encontrar o que manter,” escreveu Daniel Leichsenring, economista-chefe da Verde. “Em praticamente todas as áreas de atuação, o que se viu foi um desastre. Da ação deliberada de atrasar a vacina e jogar insistentemente contra, com o suprassumo das fake news antivax, à política econômica. No entanto, ao invés de rever, o governo acena com a aceleração dos erros.”

Para a Verde, o Ministério da Economia trabalhou para destruir o Teto de Gastos em parceria com o chefe do Executivo e o Congresso, e a destruição da credibilidade do Teto e da Lei de Responsabilidade Fiscal serviu para acomodar um volume extraordinário de gastos a mais com o fundo eleitoral e as emendas parlamentares “sob a esfarrapada desculpa de atender aos mais pobres com o Auxílio Brasil.”

Mas, escreve a Verde, engana-se quem achava que as coisas não poderiam piorar.

“No afã de tentar reverter a absoluta impopularidade de seu governo, eis que o Presidente revela um plano infalível: reduzir a tributação sobre os combustíveis e energia elétrica,” escreve o economista, lembrando que nos “anos dourados” (contém ironia) de Dilma-Mantega, houve várias incursões no terreno da desoneração de curto prazo, temporárias.

“Quem poderia imaginar que o governo eleito em 2018 acusando o governo petista de instaurar o comunismo e implementar políticas econômicas totalmente equivocadas iria começar o último ano de seu mandato recorrendo às piores práticas do governo petista, de um populismo eleitoreiro barato, totalmente irresponsável?” questiona Daniel. “No final, são irmãos gêmeos, separados no nascimento,” ele escreve.

Para o economista do Verde, a  proposta de eliminar os impostos sobre os combustíveis é um “desvario completo,” e não resiste a “1 minuto de considerações sobre sua qualidade ou conveniência.”

“Se o ajuste fiscal não pode mais ser feito via gasto, só pode ser feito via arrecadação, e eis que surge essa proposta incompreensível de baixar os impostos em mais de 1% do PIB, sob a chocante justificativa do Ministério da Economia de que há excesso de arrecadação”, escreveu o economista.

O economista, que estima o déficit nominal de 2022 próximo a R$ 730 bilhões, e diz que a proposta de eliminar impostos sobre os combustíveis elevaria o déficit a pelo menos R$ 800 bilhões. Com isso, a dívida passaria de 80,3% do PIB em 2021 para 85% do PIB em 2022, “e seguirá subindo nessa intensidade.”

É claro que, diante dessa dinâmica, a taxa de juros acabará aumentando, numa bola de neve, alerta o economista.

Outra questão: a redução de impostos irá para os mais pobres? Ou beneficiará os mais ricos? Quem consome gasolina tem que ter no mínimo algum bem que a utilize, como carro ou moto, por exemplo, o que para a realidade brasileira já o distingue da parcela mais pobre da população e a mais carente de algum tipo de ajuda, escreve o economista.

Segundo a Verde, a mensagem que se está passando para a sociedade é a de que não existe qualquer problema fiscal no Brasil, “que vai tudo muito bem, a dívida pública (uma das maiores entre os países emergentes, senão a maior, e com a taxa de juros mais alta) não é um problema, nem o déficit público de 8% do PIB”. “Há ‘excesso de arrecadação’.”

Já para o Congresso, a mensagem é que o guardião abriu a porta do cofre; “venham com qualquer proposta que tenha algum benefício eleitoral que será contemplada”.

“Que venham as desonerações, a correção da tabela do IR, as pressões por reajustes de salários da elite do funcionalismo público com força política (que estão entre os 0,1% de maior renda do Brasil). A irresponsabilidade fiscal virou a regra”, diz Daniel na carta, já que quando o Presidente quer e o Ministro da Economia autoriza, não será o Congresso a instituição que evitará o abismo fiscal eleitoreiro.

Curiosamente, a Verde nota que, com a volta do juro alto e do investidor estrangeiro para a Bolsa brasileira, a reação natural do mercado à insanidade fiscal não está acontecendo.

“O termômetro quebrou. Com dólar caindo e bolsa subindo no ano, não há amarras para atitudes ainda mais populistas,” ele diz.

Para o economista do Verde, o governo Bolsonaro chega ao fim de maneira “praticamente indistinguível” do governo Dilma do ponto de vista econômico, bem como o ministro da Economia “converge para o ministro da Fazenda que gerou o maior desastre econômico de que se tem registro”.

A Verde também não poupa os empresários.  Segundo a gestora, é chocante ver o silêncio das associações de classe empresariais sobre as desonerações. “Infelizmente não é surpresa: são os mesmos que clamaram pelas intervenções do governo Dilma (fechamento da economia, incentivos, desonerações e redução forçada do custo de energia).”

A Verde diz que essas associações sempre buscam extrair o máximo de benefícios em causa própria, independente das consequências para o País. “Convém lembrar que quando o fiscal explodir, todos no barco afundarão. E o que entristece é que quando isso ocorrer, estarão de volta a Brasília a pleitear ajuda para salvá-los da crise!”

A Verde encerra a carta exortando o Brasil a encontrar um caminho longe das pseudo-soluções do populismo.

“Oxalá que as pessoas de bem acabem por perceber que este caminho traçado pelo governo será tão desastroso na economia quanto o implementado no governo do PT (no passado e no projeto), com consequências dramáticas sobre a renda real, a pobreza, as oportunidades, a esperança de termos um futuro melhor. Ainda há tempo para barrar essa proposta e encontrar uma alternativa política viável para o Brasil.”