A Hypera está comprando a marca Buscopan da Boehringer Ingelheim por R$ 1,3 bilhão.  (A Sanofi, antiga dona da marca, ainda tem direito de preferência, mas é improvável que vá exercê-lo.)

Com o Buscopan, a Hypera complementa sua oferta de medicamentos anticólica, onde a companhia já atua com a marca Atroveran. O Buscopan é a marca líder no segmento, e a família Buscopan e Buscofem são a segunda maior franquia no mercado de medicamentos isentos de prescrição (OTC) no Brasil.

No mundo todo, as farmacêuticas globais estão segregando seus negócios de OTC para desinvestimento ou IPOs. GlaxoSmithKline, Pfizer e Sanofi já seguiram este caminho.

“O OTC tem deixado de ser relevante porque cresce pouco, mas é um cash cow,” diz o analista de uma gestora. “É um business sem graça, mas como é um fluxo de caixa muito previsível, as companhias conseguem vender a um múltiplo alto para reinvestir os recursos em pesquisa e desenvolvimento de moléculas complexas, principalmente na oncologia.” 

10880 9391fd85 3194 508e e0ce be649f1c719eA Hypera não divulgou números, o que deixou os analistas em cólica para fazer as contas. Mas o mercado estima que o Buscopan fature R$ 300 milhões ano, o que daria à transação um múltiplo de 4,33 vezes receita.  No mundo todo, os múltiplos de negócios envolvendo OTC tem variado dramaticamente — de 3,5 vezes a até 9x receita — mas a média tem sido 4,5x.

Como a Hypera tem um dos canais de distribuição mais capilares da indústria, analistas estimam que as sinergias sejam significativas e o Buscopan adicione até R$ 150 milhões de lucro à empresa por ano, ou 12% dos R$ 1,2 bilhão que a Hypera deve lucrar este ano.  “Eles só tem que plugar o produto no canal, talvez passar a fabricar em Goiás, onde a empresa tem incentivos fiscais, e não vai ter despesa administrativa nenhuma.”  
 
O tamanho do cheque não traz efeitos colaterias: a alavancagem da Hypera deve terminar 2020 em 0,4 vez a geração de caixa, nas contas do Credit Suisse.  No meio da tarde, a ação da Hypera avança 2,5% depois de chegar a subir mais de 4%.

Para um veterano da indústria, o Buscopan melhora a margem, mas não traz crescimento. “O Buscopan é um produto consolidado, que não cresce, assim como a maioria das marcas OTC da Hypera.  Se você quiser crescer, tem que investir em marketing, força de vendas, e talvez você consiga.  Mas se você não fizer nada, ele só tende a melhorar a margem.”

10163 6794c8b1 fa1e 0000 0000 7f1c3af32d0aO próximo grande negócio do segmento deve ser a venda da divisão de OTC da japonesa Takeda na América Latina, que inclui a Neosaldina. Segundo o Valor reportou em outubro, EMS, União Química, a italiana Menarini e a uruguaia Mega Labs estão na fase final de propostas.

A transação de hoje pode ser oportunística ou indicar que o controlador da Hypera, João Alves de Queiroz Filho, o “Júnior”, está de volta ao jogo do M&A — o playbook que usou para construir a companhia, dona de marcas centenárias como Maracujina, Engov e Biotônico Fontoura — depois de dois anos turbulentos de desaceleração de vendas, aumento da concorrência e investigações policiais.

Mas o negócio também vem num momento em que players como a Cimed conquistam mais espaço, lançando antigripais e vitaminas que competem com a Hypera.  [Somados, os antigripais Coristina D e Benegripe e o vitamínico Addera D respondem por 40% do negócio de OTC da Hypera, que faz 36% do seu faturamento neste mercado.]
 
O aumento da concorrência tem forçado a Hypera a investir mais nos pontos de venda e no trade marketing, o que pressiona as margens. Além disso, o modelo de marketing tradicional da companhia — investimento pesado em televisão — está sofrendo com a dispersão da audiência para plataformas de streaming e internet.  Em outras palavras, o mesmo real gasto hoje compra menos eyeballs do que comprava 10 anos atrás.
 
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