Vamos combinar que as coisas não estão saindo como esperado.

O dólar— que deveria cair — explodiu; o crescimento, que deveria bombar com a confiança no novo Governo, murchou; o otimismo do investidor local — expresso num rali épico na Bolsa — está sendo revertido; e os empresários continuam reticentes em retomar o investimento.

Um ano depois de tomar posse, o Governo do Presidente Jair Bolsonaro entregou muito barulho e pouco progresso.

Uma pequena parte disso tem a ver com o coronavírus — um pânico que força aviões a ficar no chão, prostra as grandes economias e infecta com desesperança um mundo já terrivelmente complexo.  

Mas em termos estruturais, o messiavírus faz mais mal ao Brasil que o corona.

Ele causa a síndrome do messianismo e do voluntarismo personalista, aumenta a temperatura do País e impede o organismo social de trabalhar nos problemas reais que todos enfrentamos.

Infelizmente, o messiavírus infectou o Presidente da República e alguns de seus auxiliares e seguidores.  A patologia pode levar à falência institucional se não tratada. Apesar de se manifestar em espectros ideológicos opostos, esse tipo de populismo levou a resultados desastrosos para o tecido social na Argentina e Venezuela.

O messiavírus quer fazer o paciente acreditar que só ele faz bem para o País.  Pior: alucinado, o paciente acredita que todos que divergem em algum grau de suas ideias são, de alguma forma, “traidores da Pátria”.  Só ele presta e, se você não está com ele, está contra ele — e contra o Brasil.

Semanas atrás, Jair Bolsonaro tentou passar o messiavírus adiante: distribuiu pelo Whatsapp um vídeo chamando para uma manifestação no dia 15.  Cobrado pelos outros Poderes, disse que tudo foi um mal entendido.  Neste sábado, voltou à carga: conclamou a população às ruas (adicionando a vacina retórica de que a manifestação “não é contra o Congresso, mas pró-Brasil”.) 
 
O messianismo empurra o Brasil cada vez mais perto de uma crise institucional — e num momento de incerteza máxima na economia global conjugada com fragilidade interna.

Político sem grande expressão durante décadas, Bolsonaro encontrou um veio que o levou à Presidência. É muito bom de campanha, mas quando é que o trabalho vai começar de verdade?  Onde estão as reformas?  Onde está a serenidade para lidar com os problemas do mundo e a habilidade política e técnica para encaminhar soluções na economia?

A manifestação do dia 15 não terá vencedores:  se o povo comparecer, enfraquecerá o Congresso, que é vital para as mudanças que o Brasil precisa fazer na economia.  Se os números forem pífios, o Presidente ficará enfraquecido e pode entrar na mira do impeachment.

A queda do investimento estrangeiro — seja direto ou na Bolsa — reflete em parte o desconforto do mundo com a retórica de Bolsonaro.  Por enquanto, o otimismo veio majoritariamante dos brasileiros, mas agora até isso está começando a mudar.  

O Brasil elegeu Bolsonaro por horror a dois legados do PT:  a corrupção institucionalizada e a economia arrebentada.

Mas se o Presidente não enxergar a gravidade do momento, empresários e investidores que viram Bolsonaro como o presidente da travessia começarão a ter dúvidas.

‘Político que tem medo de rua não serve para ser político’, mas Presidente que não entrega e só insufla a rua talvez não sirva pra ser presidente.