O Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN) é a segunda e última instância administrativa para as principais autarquias que regulam e fiscalizam o dinheiro no Brasil: a CVM, o COAF e o Banco Central. 

É o Conselhinho que dá a última palavra sobre multas e inabilitações aplicadas a bancos, agentes do mercado de capitais e apurações de lavagem de dinheiro — evitando, em muitos casos, que os processos acabem na Justiça, onde uma solução pode demorar anos.

10245 37b3420e 04e1 0344 2363e7f00 4d8cc66386a9Mas agora, o Conselhinho está lutando para sobreviver.  Um decreto presidencial de 11 de abril acabou com dezenas de conselhos e comissões, incluindo o Conselhinho (o número total é desconhecido; nem o Governo sabe a conta).  O órgão vai lutar para ser recriado — uma hipótese prevista no decreto — mas a palavra final dependerá do Ministro Paulo Guedes.

O Conselhinho nunca teve vida fácil.

O órgão foi criado em 1985, quando o Conselho Monetário Nacional (CMN) transferiu a ele a competência de julgar os processos punitivos.  São oito julgadores: metade nomeados pelo Estado (incluindo Ministério da Economia, BC e CVM) e metade pelo setor privado.

O Conselhinho tem 12 funcionários (quatro dos quais são servidores de carreira comissionados) e um orçamento de irrisórios R$ 20 mil (vinte mil reais) por mês. 

Sua presidente, Ana Maria Netto, é funcionária de carreira do Estado e advogada com mestrado em Chicago. Já rodou pela Esplanada: antes de ir parar na Economia, trabalhou anos com defesa da concorrência no Ministério da Justiça.

Desde que foi indicada para presidir o Conselhinho, há seis anos, Ana Maria tirou o órgão da Idade da Pedra e o colocou na Era Digital. Até 2016, todos os documentos do Conselhinho estavam apenas em papel, e os processos tinham que viajar por malote dos Correios.

“Um processo não podia estar ao mesmo tempo em vários lugares,” diz um ex-integrante. “O processo só estava à disposição do relator; os outros tinham acesso só ao relatório.  Você lia o relatório e ia julgar.” 

Ana Maria digitalizou tudo, e hoje o Conselhinho julga 30% do que entra em no máximo seis meses.  As decisões, que antes demoravam anos para ganhar publicidade, hoje são divulgadas em até 60 dias, e algumas já ficam disponíveis horas após o julgamento.

10672 794dbe91 3ff8 6169 c5cd 8026700136d6Mais:  uma mudança normativa drástica aumentou a barra de qualidade na escolha dos julgadores.  Segundo fontes que participaram das mudanças, a presidente fazia questão de que os representantes do mercado fossem pessoas com experiência operacional.  

“Ela dizia que não adianta botar advogado de grande firma, porque eles só entendem de tese de defesa, e não do operacional. Ela falava pro mercado, ‘Não mandem juristas pra cá, mandem gente com a mão na massa!’”

Com isso, além de julgar os processos, o Conselhinho começou a dar orientações sobre o que os órgãos de Estado esperam do comportamento dos agentes privados — um guidance importante para o departamento jurídico de bancos, investidores e demais regulados.

Este ano, os novos conselheiros de mercado são Maria Rita Drummond, diretora jurídica da Cosan há oito anos; Pedro Frade de Andrade, o executivo responsável pelo jurídico e compliance da PIMCO na América Latina (com passagens pelo Itaú pelo HSBC); e Alvaro Affonso Mendonça, diretor de produtos financeiros da BM&F entre 1998 e 2009 e autor do livro “Hedge para Empresas.” 

Apesar de todo o progresso feito por seu exército de Brancaleone, em janeiro o Conselhinho levou um tiro na asa.  O decreto que criou o novo Ministério da Economia significou, na prática, a extinção dos quatro cargos comissionados. 
 
Ana Maria estava fazendo um périplo entre as secretarias do Ministério para tentar reaver os cargos e dar continuidade ao trabalho quando o outro decreto extinguiu a coisa toda. 

A extinção do Conselhinho parece contrária à própria agenda do Governo.

Raras vezes um órgão público se esforçou tanto para se tornar ágil e ter uma interlocução com o mercado.  Se os processos sancionadores forem parar na Justiça, será um tiro no pé para instituições financeiras e empresas reguladas:  num mundo de inovação e mudança de regras constante, ninguém pode esperar 10 ou 15 anos por uma solução judicial — pior: correndo o risco de ficar afastado do mercado todo esse tempo, já que o cumprimento de inabilitações aplicadas pelo BC e pela CVM tem efeito imediato.

Se a bandeira do Goveno é enxugar e ‘botar pra funcionar’, então o Conselhinho é um modelo a ser seguido, e não um dos culpados.