Primeiro arranha-céu da América Latina, o edifício Joseph Gire acaba de ser vendido pela Prefeitura do Rio de Janeiro, dando início a um retrofit que simboliza o desejo dos cariocas de revitalizar seu Centro.
As incorporadoras QOPP, do Grupo Vetorazzo, e a Konek Transformação Imobiliária pagaram R$ 36 milhões pelo imóvel, a antiga sede da Rádio Nacional e do jornal A Noite – o que deu ao prédio o apelido homônimo.
A torre de 22 andares fica em frente à Praça Mauá, com vista para o Museu do Amanhã e a Baía da Guanabara. Depois de um retrofit que pode durar quatro anos, será transformada em um residencial de alta renda.
Serão 424 apartamentos entre 30 e 48 m2, 23 unidades duplex no 21º andar, um bar no 22º com lounge aberto ao público, e um restaurante público no terraço com vista para a Baía da Guanabara. Os moradores também terão salão de jogos, cinema, spa e academia.
Inaugurado em 1929, o prédio passou para as mãos da União dez anos depois por conta das dívidas com o governo federal.
Vazio desde 2012, foi tombado em 2013 pelo Iphan, o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. Em 2020, quando o governo federal decidiu leiloá-lo por R$ 90 milhões, poucas repartições ocupavam dois de seus andares, gerando um custo mensal de manutenção de R$ 300 mil para a União. Na época, não houve interessados.
Este ano, a Prefeitura do Rio comprou o imóvel por R$ 28,9 milhões, já com o objetivo de repassá-lo à iniciativa privada. Quando o prédio estiver pronto, o grupo vencedor da concorrência vai devolver os R$ 24 milhões em incentivos fiscais recebidos do programa municipal Reviver Centro, que começam a valer agora.
Em estilo art déco com 102 metros de altura, o Joseph Gire leva o nome do arquiteto francês que foi um dos coautores da obra (o outro foi o brasileiro Elisário Bahiana, que projetou o Viaduto do Chá). Gire também participou dos projetos dos hotéis Copacabana Palace e Glória.
Pouco depois de inaugurado como “o maior arranha-céu da América Latina”, o A Noite foi ultrapassado pelo paulistano Martinelli, de 105 metros. Em 1936, ambos seriam superados pelo Kavanagh, de Buenos Aires, com 120 metros – o único dos três que conserva o glamour original.
Num País acostumado a deixar à míngua prédios públicos – que ficam décadas abandonados – o retrofit do A Noite é uma clara vitória do Rio, mas foi imediatamente criticado pelos que cultuam o passado em detrimento do presente.
Em suas redes sociais, o prefeito Eduardo Paes recebeu inúmeros comentários criticando “a venda para um imóvel de luxo” ou reclamando que a cidade deveria ter outras prioridades.
Devolver a vida ao A Noite é parte do esforço da Prefeitura de reenergizar um Centro que já tinha poucos moradores antes da pandemia e ainda sofreu um esvaziamento do comércio depois dela.
“Eduardo Paes tirou a perimetral, construiu dois museus maravilhosos, reinventou a Praça Mauá e agora consegue, finalmente, ressuscitar o Edifício A Noite. Já pode pedir música no Fantástico, prefeito!” Washington Fajardo, o ex-secretário de planejamento urbano da cidade e pai do Reviver Centro, escreveu em suas redes sociais.
Leilões bem-sucedidos assim são raros. Quando o governo federal tentou vender o edifício Wilton Paes de Almeida, em São Paulo, em 2015, por R$ 25 milhões, não apareceu nenhum comprador. O marco modernista construído nos anos 1960 continuou a ser invadido e desocupado rotineiramente. Em 1º de maio de 2018, um incêndio o derrubou. O governo federal passou o terreno com entulho para a prefeitura de São Paulo fazer habitação popular. O terreno continua vazio.