Tem cara de Nova Matriz Econômica, tem cheiro de Nova Matriz Econômica, mas não é a Nova Matriz Econômica. 

É a Nova Indústria Brasil, a “nova” política industrial apresentada hoje pelo Governo Lula. 

10203 7507252c d455 0000 0001 565943e8487aJá na largada, o Governo promete R$ 300 bilhões em financiamento com dinheiro público até 2026. O BNDES, que vai administrar o plano de investimentos, entrará com a maior parte dos recursos, destinando R$ 250 bilhões para o “apoio a projetos de neoindustrialização.” 

Outros R$ 50 bilhões virão do caixa da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii). 

O presidente do BNDES, Aloizio Mercadante, afirmou que os R$ 300 bilhões são um “piso.” Sem pretensão de substituir o mercado, disse ele, o objetivo é contribuir para enfrentar “desafios históricos” na área tecnológica e ambiental. “A transição para a economia verde exige a participação do Estado,” Mercadante afirmou. 

Dessa vez, a política industrial vem com o verniz da consultoria da economista italiana Mariana Mazzucato, professora da University College London e fundadora do Institute for Innovation and Public Purpose. 

Trata-se de uma defensora apaixonada do “Estado empreendedor” que vem prosperando prestando consultoria para governo de esquerda da América Latina, enamorados pelos livros e análises de Mazzucato a favor de uma liderança estatal em projetos de investimento de longo prazo, em oposição ao mercado. 

“É garrafa nova para bebida velha,” resumiu um economista que acompanha o trabalho de Mazzucato. 

A “nova garrafa” é a transição tecnológica e a economia verde, duas das áreas que, segundo o Governo, serão prioritárias na nova política industrial. 

Mas as comparações com a “velha” Nova Matriz Econômica são inevitáveis. 

Em 2008, sob o impacto da grande crise financeira internacional, Lula, já com Guido Mantega no comando da economia, deu início a um grande avanço nos gastos financiados pelos bancos públicos, sobretudo o BNDES. 

Entre 2008 e 2014, o Tesouro injetou, em valores ajustados, R$ 809 bilhões no BNDES. O Governo aumentava seu endividamento, pagando juros de mercado, enquanto o banco público de desenvolvimento concedia empréstimos subsidiados. 

Segundo estimativas do próprio Tesouro, os subsídios custaram R$ 340 bilhões. 

Esse dinheiro todo não trouxe crescimento econômico, muito pelo contrário. Legou uma coleção de projetos fracassados, pilhas de denúncias de corrupção, pedaladas contábeis e uma das mais severas recessões da história do País.    

“O Governo causou um desastre imenso,” disse o economista Marcos Mendes “Terá que provar que desta vez será diferente.” 

Mas o BNDES, com o respaldo do Governo, já vem buscando maneiras criativas de ampliar sua atuação, conceder mais empréstimos subsidiados e driblar as restrições impostas depois da criação da TLP, a nova taxa de longo prazo de referência para os empréstimos do banco sem os subsídios implícitos da antiga TJLP. 

10061 49d58434 9b61 0dbb 25da ccc0eb033752Parte dos recursos do novo programa serão concedidos por meio do Programa Mais Inovação, criado por lei no ano passado e operado pelo BNDES, ao lado da Finep. Os juros das linhas são de TR + 2% – bem abaixo, portanto, do custo de mercado. 

A criatividade não para por aí. Um projeto de lei em discussão abre a possibilidade de o banco emitir as suas próprias letras de crédito, as Letras de Crédito do Desenvolvimento, ao largo do Tesouro, e apresenta mudanças no cálculo da TLP, dando margem a novas linhas subsidiadas.  

No auge da Nova Matriz, as concessões do BNDES chegaram a representar o equivalente a quase 4% do PIB. Desde 2014, entretanto, o banco diminui de tamanho. Em 2023, mesmo com a retomada de seu ativismo sob Lula-Mercadante, o total de concessões foi de 0,8% do PIB. 

O “saneamento” nos Governos Temer e Bolsonaro deixou o BNDES com índice de Basileia baixo e folga para se alavancar. Segundo uma análise recente do Itaú, o BNDES tem à disposição o equivalente a 1,3% do PIB para novas concessões. 

Para Marcos Mendes, só faz sentido o Governo financiar projetos cuja taxa de retorno interna seja inferior ao custo de oportunidade se esses projetos gerarem externalidades sociais positivas – como, por exemplo, no caso de certos investimentos na saúde ou na despoluição. 

“São projetos que reduzam a pobreza e aumentem a produtividade no longo prazo,” disse Marcos. 

O “novo” plano, entretanto, carrega um dos vícios de projetos anteriores semelhantes, que são as regras protecionistas de exigência de conteúdo nacional – historicamente, uma das travas ao avanço da produtividade no País. 

Parece que ninguém se lembra da nada nova Lei de Informática. 

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