A edição 2021 da pesquisa “A Mente do Agricultor Brasileiro na Era Digital”, que acaba de ser lançada pela McKinsey & Company em evento organizado em 25/3 pelo Insper Agro Global e pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), traz insights valiosos sobre a evolução do comportamento digital dos agricultores brasileiros, abordando tópicos como o crescimento do nível de adoção de canais digitais no processo de compras necessárias à operação e no processo de comercialização de produtos, além do uso de tecnologias de precisão nas operações agrícolas. Seja para realizar transações comerciais, se relacionar com fornecedores ou realizar operações mais complexas, o uso de canais e plataformas digitais cresceu bastante e está cada vez mais presente na jornada de decisão dos agricultores de todas as regiões do país, nas diferentes culturas agrícolas. 

Os agricultores brasileiros estão à frente de seus pares americanos e europeus na preferência por canais digitais para compras agrícolas. No Brasil, a preferência por esses canais passou de 36% para 46% dos produtores nos últimos 12 meses, um aumento de 10 pontos percentuais, enquanto nos Estados Unidos e Europa, ao longo desse mesmo período, o crescimento desse índice foi de 7 pontos percentuais. Nos Estados Unidos, o número atual de preferência por canais digitais para compras está em 31%, e é ainda menor na Europa, que fica no patamar de 22% (Figura 01). O crescimento da preferência por canais digitais é observado principalmente na jornada de compra de insumos agrícolas, seguido pela compra de peças de reposição e maquinário. Esse crescimento se sustenta principalmente no uso intenso do WhatsApp e no avanço acelerado de marketplaces agrícolas. O estudo mostra que o lançamento e desenvolvimento de marketplaces agrícolas no Brasil é uma realidade em expansão, apesar do mercado ainda ser bastante fragmentado, sem a presença um competidor dominante. 

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Os canais digitais ganharam popularidade não apenas no número de agricultores usuários, mas também na representatividade dos gastos totais do agricultor nestes canais. No último ano, a participação média de gastos realizados em ambiente online cresceu quase 40%, subindo de 21% para 29% dos gastos totais. Esse processo foi impulsionado principalmente pela compra de sementes, fertilizantes e produtos de proteção e nutrição vegetal. Destaque para a cultura do algodão, onde aproximadamente 60% dos valores comprados já são feitos através dos canais digitais. 

O estudo nos mostra ainda que interações digitais são relevantes em todas as etapas da jornada de compra do agricultor brasileiro. Cerca de 40% dos agricultores entrevistados já preferem o uso dos veículos digitais ao longo de todas as etapas dessa jornada. E o nível de adoção digital é maior na pesquisa por produtos e serviços, no processo de cotação para compra destes e no processo de recompra, atingindo nestas etapas entre 60% e 70% de preferência. 

No processo de comercialização também vemos a evolução do nível de adoção de ferramentas e canais digitais: 50% dos agricultores brasileiros estão dispostos a vender metade ou mais de sua produção por meio de canais digitais. Essa tendência pode ser observada entre todos os perfis de agricultores. 

Quanto ao canal utilizado para transações digitais, o WhatsApp ainda é o principal, conforme mostra a Figura 02. Marketplaces agrícolas digitais estão emergindo e conquistando espaço, ainda sem um vencedor claro. A experiência digital do usuário é apontada por 62% dos agricultores como principal fator para escolha da plataforma, havendo ainda oportunidade para substancial melhoria neste quesito. Espera-se para os próximos anos uma maior penetração e consolidação dessas plataformas para o varejo agrícola, atraindo inclusive empresas de fora desse setor. 

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O comportamento mais ousado do agricultor brasileiro frente às opções digitais também se reflete no aumento do nível de adoção de tecnologia em suas operações agrícolas, que está correlacionado com o uso de canais digitais para compra e venda (Figura 03). Agricultores mais jovens em geral tem maior nível de adoção da digitalização e da agricultura de precisão. Mais de 50% dos agricultores respondentes da pesquisa usam ou estão dispostos a usar pelo menos uma tecnologia de agricultura de precisão em suas operações. Entre os motivos apontados para uso destas tecnologias estão o aumento do rendimento da produção e a redução de custos das operações, além da melhoria da qualidade do produto final. E quase 50% deles estão dispostos a experimentar essas novas tecnologias com base em um modelo de negócio onde os ganhos de custo e/ou produtividade são compartilhados e vinculados ao desempenho da solução. 

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No entanto, os custos elevados destas soluções tecnológicas e a falta de infraestrutura em áreas remotas são os principais obstáculos citados por profissionais do campo para adesão às mesmas. O estudo mostra que produtores de algodão, de grãos do Cerrado e da região de MATOPIBA (região formada pelos estados do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia) apresentam um nível de conhecimento maior sobre os benefícios e funcionamento das soluções de tecnologia de precisão, quando comparados com produtores de outras culturas no sul e sudeste do país. 

Ao analisar o comportamento digital do agricultor brasileiro pelo segundo ano consecutivo, percebemos que o movimento de adesão a canais e ferramentas digitais – que já era notável – foi fortemente acelerado no último ano, principalmente em função das condições impostas pela pandemia. 

O uso dos canais digitais ainda é muito heterogêneo entre as culturas e regiões do País. Vale destacar, conforme mostra a Figura 4, que o perfil do agricultor mais propenso à digitalização, tanto na compra quanto na venda, é de menos de 45 anos ou com tamanho de propriedade superior a 500 ha. Ou seja, o agricultor jovem ou com maior escala de produção está puxando a revolução digital da agricultura brasileira. 

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Embora o contato pessoal no ambiente agrícola ainda seja muito relevante, a estratégia omnichannel para interagir com o agricultor veio para ficar. Nos próximos anos, com o avanço do conhecimento e com mais agricultores tendo sucesso em suas experiências digitais, o caminho natural é de que o uso dessas ferramentas siga crescendo, o que cria novas oportunidades e um imperativo de modernização para todos os atores do ecossistema agrícola. 


Nelson Ferreira é sócio sênior da McKinsey.

Adriano Canela é sócio associado da McKinsey. 

Marcos Jank é professor de Agronegócio Global do Insper. 

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