A Liqi – uma startup de tokenização e blockchain fundada há apenas seis meses – acaba de levantar R$ 27,5 milhões numa rodada que vai financiar os planos do fundador de conectar o mundo cripto com o mercado financeiro tradicional.
O cheque veio da Kinea, a gestora de private equity e venture capital do Itaú Unibanco; da Oliveira Trust, uma das principais empresas de administração fiduciária do Brasil; e do Honey Island by 4UM, um fundo de VC criado pelos fundadores do Ebanx e a 4UM Investimentos.
Daniel Coquieri, o fundador da Liqi, disse ao Brazil Journal que conversou com vários fundos mas viu nesse pool de investidores skills complementares que podem ajudar na tokenização do mercado tradicional.
“Precisamos de bons parceiros que consigam ajudar a gente com a agenda regulatória,” disse o fundador. “Queríamos montar uma espécie de ‘sandbox’ dentro da Liqi que realmente pudesse mudar o mercado.”
Daniel é um empreendedor serial que já fez duas saídas de sucesso. Em 2012, fundou uma startup que ajudava grandes empresas a anunciar no Facebook, vendida em 2015 para um grupo americano.
Dois anos depois, criou a BitcoinTrade – uma exchange de criptomoedas que chegou a ter 400 mil clientes e R$ 600 milhões sob custódia antes de ser vendida para a argentina Ripio.
A Liqi opera com dois produtos: o Tokenize, que permite a empresas transformar seus ativos financeiros em tokens usando o blockchain e construindo smart contracts em cima deles; e uma plataforma de negociação (também chamada Liqi) onde investidores podem comprar os tokens emitidos pela Tokenize.
A Tokenize fez seis emissões de tokens até agora.
Ela tokenizou, por exemplo, um contrato de aluguel da incorporadora Nigri com a Porsche. A Nigri alugou a fachada de um de seus empreendimentos para a Porsche num contrato de 10 anos. Para antecipar parte desse fluxo de receitas, ela tokenizou 2 anos e meio do contrato com a Liqi, que vendeu os tokens para investidores.
“No mercado tradicional, a Nigri teria que ir ao banco antecipar esses recebíveis, pagando um juro super alto, enfrentando burocracia, e consumindo o seu limite de crédito com o banco,” disse José Alexandre Freitas, da Oliveira Trust. “Nesse modelo, ela conseguiu o mesmo resultado com um custo muito menor, o que garantiu que sobrasse mais spread pra todo mundo, tanto para a Nigri quanto para o investidor.”
A amortização foi dividida em 25 parcelas mensais: em cada parcela, o investidor vai receber de volta 1/25 do principal mais os juros.
Em outra operação semelhante, a Liqi tokenizou junto com a PagCartão os recebíveis de cartão de uma das franquias da GrandCru.
O token da Liqi é uma espécie de contrato virtual dentro do blockchain com todas as informações da cessão dos recebíveis e das amortizações.
Por enquanto, a Liqi pode tokenizar diversos ativos financeiros (como os recebíveis dos exemplos acima), mas ainda não pode tokenizar valores mobiliários. Para isso, ela precisaria de uma autorização da CVM, que tem olhado para o tema mas ainda não regulou esse tipo de operação.
Quando a regulação vier, a Liqi poderá tokenizar também títulos de dívida públicos e privados, ações e cotas de fundos – ampliando seu mercado endereçável.
“Mas mesmo sem a regulação o potencial já é gigantesco,” disse Philippe Schlumpf, da Kinea. “95% dos ativos financeiros que existem hoje não são mobiliários.”
A entrada do Kinea e da Oliveira Trust deve ajudar nessa frente – afinal, uma coisa é uma startup de seis meses bater na porta da CVM para falar de tokenização, outra muito diferente é um bancão e uma custodiante com mais de 30 anos de estrada.
Segundo Daniel, a Liqi pretende levar à CVM já nos próximos meses dois casos concretos de estruturação de tokens com valores mobiliários para pedir a autorização da emissão.