SANTA CLARA, Califórnia – O investimento de venture capital nas empresas brasileiras e de outros países da América Latina caiu pela metade em 2022, mostra um estudo da McKinsey apresentado hoje aqui na conferência Brazil at Silicon Valley.

O capital ficou mais escasso e seletivo. Ainda assim, o total de capital de risco investido nas startups da América Latina se mantém acima dos níveis registrados antes da pandemia.

A reversão da liquidez obrigou muitas startups a aceitar novas capitalizações a valuations abaixo das rodadas anteriores. No último ano, 33% das startups tiveram um down round.

“Isso era um super tabu e era evitado pelas startups, mas elas precisam aceitar as novas condições para ter caixa,” disse Marina Mansur, sócia da McKinsey e coordenadora do estudo.

A boa notícia é que a maior parte das startups continua crescendo de maneira sólida, conquistando consumidores num ambiente de avanço da digitalização da economia. Com relação ao Brasil, 51% das empresas relataram que tiveram um aumento no faturamento no último ano.

Os números do estudo mostram como a América Latina conquistou uma fatia relevante no portfólio dos VCs nos últimos anos. Em 2018, os investimentos estimados ficaram em US$ 3 bilhões. Em 2021, atingiram o pico de US$ 18 bilhões.

Outra maneira de observar o dinamismo das startups na região é pelo número de unicórnios. Nesse período, as startups com valuation superior a US$ 1 bi subiram de 9 para 34.

“O grande dilema para as startups neste momento é como equilibrar o crescimento e a lucratividade,” afirmou Marina.

Marina dividiu as startups pesquisadas em quatro categorias.

As melhores foram chamadas de “rockstar”, por aliarem crescimento e lucratividade. Nesse quadrante ficaram 19% das empresas avaliadas.

Mas 35% ficaram na categoria “Great Gatsby”, porque são promissoras e crescem bastante, mas “esbanjam” demais – consomem mais capital do que seria recomendável, sacrificando a rentabilidade.  

Um grupo de 12% das empresas pesquisadas recebeu a classificação de “Peter Pans”: são lucrativas, mas não crescem. Por fim, existem aquelas em estágio embrionário: 34% do total.

O estudo avaliou aproximadamente 200 startups e ouviu fundadores, CEOs, colaboradores e investidores. 

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O Softbank fez fama por suas apostas gigantescas em negócios extremamente disruptivos – e o fim da Grande Era de Liquidez não mexeu nessa mentalidade.

Mas a mensagem a suas investidas agora é que o “momento é de permanecer à tona”, ou seja, sacrificar as metas de crescimento em prol da saúde do bottom line.

“É necessário manter o olhar focado nos prêmios lá na frente, mas eles não precisam ser capturados agora,” disse o CEO global do Softbank, Alex Clavel. “Nosso times estão na rua trabalhando. Continuamos bullish em relação a nosso portfólio no longo prazo.” 

O executivo, entretanto, disse que há agora mais seletividade nas decisões, e que o portfólio passou por ajustes. Mas “o mercado ainda está lá.” 

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O Brasil está entre os cinco mercados mais propensos à adoção de criptoativos – e a regulação, ao contrário do que ocorre nos EUA, tem contribuído para o desenvolvimento do mercado, disse Emilie Choi, a chief operating officer da Coinbase.

A plataforma acaba de entrar com uma ação judicial contra a SEC, pedindo uma definição a respeito da classificação dos criptoativos. Desde julho passado a Coinbase pede um esclarecimento se devem ser seguidas as regras para commodities ou ativos mobiliários (securities).

A SEC vem apertando a fiscalização das exchanges e combatendo manipulações – mas as plataformas se queixam da indefinição regulatória que, segundo elas, está colocando obstáculos ao desenvolvimento do mercado cripto nos EUA. 

“Queremos transparência, queremos clareza sobre o ambiente,” disse Emilie. “O que vemos no Brasil, ao contrário, é que o Banco Central e os reguladores estão abertos à inovação. E o País, por razões econômicas e geopolíticas, está entre os mais propensos a adotar criptoativos.”

Emilie disse que cripto é “a nova internet,” por isso não é possível manter a tecnologia “presa numa caixa.” 

Ainda num paralelo com a internet, ela disse que as empresas de cripto ainda não sabem ao certo para onde irá o mercado e onde estará o valor a ser capturado: se nas plataformas, nos aplicativos ou nos serviços. 

“Então precisamos desenvolver várias áreas, para os consumidores poderem fazer suas escolhas,” disse Emilie.

O repórter viajou a convite da Brazil at Silicon Valley.