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Nos últimos nove anos, uma empresa fundada por dois irmãos paulistanos construiu silenciosamente um império no mundo mobile.

Agora, a Wildlife Studios, que faz games para celulares, acaba de ser avaliada em US$ 1,3 bilhão numa rodada liderada pelo Benchmark Capital, o que faz dela a mais valiosa empresa de tecnologia fundada no Brasil e de alcance global. O Benchmark está pagando o maior valuation que já atribuiu a uma empresa em um primeiro investimento.

10862 1c1ddb8a 30ae ede5 74a1 4b88518f2ad1Mais de 1 bilhão de pessoas ao redor do mundo já jogaram os jogos da Wildlife — como Sniper 3D e Tennis Clash — num total de 2 bilhões de downloads. (Para efeito de comparação: o TikTok, fenômeno chinês que vem ameaçando o Facebook, acumula 1,5 bilhão de downloads no mundo todo.)

Como a maioria das empresas de mobile gaming, a Wildlife trabalha num modelo de negócios freemium.  O jogador baixa o jogo de graça e só coloca a mão no bolso se desejar acelerar seu progresso no jogo.  Na média da indústria, de 90% a 95% de todos os jogadores jogam sem pagar nada, mas os jogadores pagantes tornam o negócio um ‘cash cow’.

A Wildlife dá lucro desde o primeiro ano.  A companhia, que nasceu como TFG e foi rebatizada recentemente, não abre seu faturamento, mas diz que ele cresce 80% ao ano nos últimos cinco anos. Em linhas gerais, os usuários de seus jogos acompanham a penetração de smartphones: 40% nas Américas, 30% na Europa e 30% no resto do mundo.

O mercado de mobile gaming movimenta US$ 80 bilhões por ano e já é maior do que os jogos de console (como o PlayStation) e os de PC combinados. 

O segmento é o filé mignon do mercado de games: o faturamento com jogos de celular cresce 25% ao ano, comparado a apenas 4% para os jogos em PC e console.

10863 66785c2e c48a b053 9865 6c108f17e5d1Numa indústria em que muitos jogos viram hits mas morrem após um ano, a Wildlife tem dois sucessos longevos.  O Sniper 3D, o maior sucesso da empresa, foi lançado em 2013, e bate recorde de usuários a cada ano.  Outro jogo, o Bike Race, existe há sete anos. Tennis Clash, lançado há dois meses, está entre os top 10 downloads em mais de 100 países e no topo do ranking em mais de 40.

A barreira de entrada em mobile gaming costumava ser baixa.  A Wildlife começou com US$ 100 e dois irmãos trabalhando na cozinha dos pais.  Mas hoje, o nome do jogo é a distribuição: as app stores estão lotadas de ofertas concorrentes e é preciso expertise para fazer um jogo se destacar e ser notado.

Além disso, os gatekeepers Apple e Google cobram um pedágio de 30%.

“Eu e meu irmão tivemos a sorte de entrar no mercado na hora certa,” diz Victor Lazarte, o CEO da companhia. “A concorrência era muito baixa, havia poucas pessoas fazendo jogos para celular.  Em 2011, se você fizesse um jogo de qualidade, os usuários te encontravam.  Hoje, isso não é mais verdade.” 

A Wildlife é ao mesmo tempo a desenvolvedora e publisher de seus jogos, e estuda passar a oferecer o serviço de publishing para terceiros. (O publisher é quem leva o jogo ao mercado, interagindo com as app stores e criando estratégias para maximizar a monetização.)

Enquanto Victor, que tem 33 anos, cuida das decisões de negócio, seu irmão Arthur, de 35, é o chefe de produto da empresa, responsável por todas as decisões criativas.  A Wildlife publica cerca de três jogos por ano, que são geralmente traduzidos para 10 idiomas e lançados em 120 países.   

A rodada liderada pelo Benchmark trouxe US$ 60 milhões para o caixa da companhia — uma cifra relativamente imaterial perto do que se presume ser a geração de caixa da empresa. Para os Lazarte, it was not about the money.

“O Benchmark é o mais capaz de ajudar a Wildlife a atrair top talent e inserir a gente no ecossistema do Vale,” diz Victor.   (Como talvez seja a maior empresa de tecnologia da qual ninguém nunca ouviu falar, a Wildlife pode usar a ajuda.)

Os irmãos conversaram com fundos que ofereceram valuations maiores, mas o histórico do Benchmark desempatou o jogo.

Peter Fenton, sócio do Benchmark, terá um assento no conselho.  Fenton é um dos investidores de tecnologia mais influentes do planeta: já assinou cheques para o Twitter, Ebay, Instagram, Dropbox e Snapchat. Na média, as investidas do Benchmark se valorizaram 10 vezes nos últimos sete anos.

Além do Benchmark, participaram da rodada outros cinco investidores-anjo: Javier Olivan, o chefe de produto do Facebook; Ric Elias, co-founder e CEO da Red Ventures; Micky Malka, sócio da Ribbit Capital; Divesh Makan, sócio do ICONIQ Capital; e Hugo Barra, VP de realidade virtual do Facebook, amigo e mentor dos irmãos. 

O Bessemer Venture Partners, que investiu na empresa em 2012, acompanhou a rodada.

O mercado de mobile gaming é muito fragmentado e ainda não produziu uma companhia icônica. Gigantes como Electronic Arts e Activision Blizzard dominam o segmento de consoles e PCs mas enfrentam dificuldades para se firmar no mobile.

No segmento de mobile, a Supercell foi vendida à Tencent por US$ 10 bilhões, e a King Digital — que deu ao mundo o Candy Crush — foi comprada pela Activision por US$ 5,9 bi há quatro anos.  A Zynga — dona do Farmville — é uma das raras listadas e vale US$ 6 bi na Nasdaq.

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