O Brasil havia suspirado aliviado no dia 2 de abril, o Liberation Day de Donald Trump, ao ter sido um dos países menos atingidos pelo tarifaço do presidente americano – e até se via em uma situação de sair ganhando em alguns mercados.

Not anymore.

Trump anunciou que as exportações brasileiras passarão a pagar tarifas de 50% a partir de 1° de agosto, e não mais ‘apenas’ 10%, como fora divulgado em abril.

O percentual ficou bem acima do que estava no radar dos analistas e pegou de surpresa o Governo. O Presidente Lula convocou uma reunião emergencial para avaliar a reação.

O EWZ, o ETF de ações brasileiras, entrou em queda de 2% depois do anúncio de Trump.10108 758bd999 9090 00d0 0000 96a1aedf939d

No mercado brasileiro, os futuros ainda estavam em negociação quando veio a notícia do tarifaço contra o Brasil. O futuro do Ibovespa fechou em queda de 2,4%, e o dólar futuro subiu 2%.

Em uma carta endereçada ao Presidente Lula, Trump voltou a criticar o tratamento que vem sendo dado ao ex-presidente Jair Bolsonaro e condenou “os ataques insidiosos contra as eleições livres e os direitos de liberdade de expressão dos americanos,” citando as ordens do STF contra plataformas digitais dos EUA.

Por isso, escreveu Trump, “a partir de 1° de agosto de 2025, cobraremos uma tarifa de 50% sobre qualquer produto brasileiro enviado aos EUA, além de todas as tarifas setoriais existentes.”

“Se, por algum motivo, o senhor decidir aumentar suas tarifas, então qualquer que seja o número que escolher aumentá-las será acrescentado aos 50%,” ameaçou Trump.

O presidente americano disse ainda que a relação comercial entre os países “tem sido muito injusta, marcada por políticas e barreiras tarifárias e não tarifárias.”

Trump conclui afirmando que se o Brasil abrir os seus mercados para os EUA e “eliminar” tarifas e barreiras comerciais, “nós talvez consideremos um ajuste desta carta.”

Lula respondeu, em nota, dizendo que “o Brasil é um país soberano com instituições independentes, que não aceitará ser tutelado por ninguém”.

“O processo judicial contra aqueles que planejaram o golpe de estado é de competência apenas da Justiça Brasileira e, portanto, não está sujeito a nenhum tipo de ingerência ou ameaça que fira a independência das instituições nacionais,” disse Lula. “No contexto das plataformas digitais, a sociedade brasileira rejeita conteúdos de ódio, racismo, pornografia infantil, golpes, fraudes, discursos contra os direitos humanos e a liberdade democrática.” 

O brasileiro disse também que o americanos tiveram com o Brasil um superávit registraram um superávit de US$ 410 bilhões ao longo dos últimos 15 anos, nas transações comerciais de bens e serviços.

Em um texto publicado no Substack, o economista Paul Krugman disse que Trump praticamente não indica uma razão econômica para a retaliação. “Isso diz respeito apenas a punir o Brasil por colocar Jair Bolsonaro em julgamento,” afirmou.

Segundo Krugman, Trump usa as tarifas “para ajudar um wannabe dictator.”

O Nobel de Economia lembrou que as exportações para os EUA representam menos de 2% do PIB brasileiro, um percentual relativamente baixo. “Trump realmente imagina que pode usar tarifas para intimidar uma nação enorme, que nem sequer é muito dependente do mercado americano, a abandonar a democracia?”

O Brasil subiu ao topo entre os países mais castigados pela guerra tarifária de Trump. Nas revisões divulgadas pela Casa Branca nos últimos dias, nenhum foi tão penalizado quanto o País, como mostra o quadro abaixo, divulgado pelo multifamily office WHG.

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O País ficou em uma situação pior até mesmo que a China.

As tarifas impostas contra os produtos chineses, que chegaram a ser de 60%, estão agora em 30%, depois de os países fecharem um acordo.

Pelo histórico do que aconteceu com a China e outros países, as autoridades brasileiras terão que se sentar à mesa com os americanos para obter uma redução na alíquota.

O Brasil exporta aproximadamente US$ 40 bilhões ao ano para os EUA, o equivalente a 11% das exportações brasileiras. Pelas contas do economista Fernando Fenolio, da WHG, o superávit da balança comercial brasileira poderá ter um impacto de US$ 20 bilhões, caso as empresas encontrem dificuldades para redirecionar as suas vendas.Luiz Inácio Lula da Silva

A queda no superávit comercial aprofundaria o déficit na conta corrente, que poderia se aproximar de 4% do PIB – um patamar historicamente elevado, com potencial de impacto significativamente o câmbio. Mas esse seria um worst case scenario, uma vez que boa parte das commodities podem ser destinadas a outros mercados.

“O que preocupa, no teor da carta, é que há pouca margem de manobra para o Brasil ceder e negociar,” disse Fenolio. “Cita questões como o julgamento de Bolsonaro e ações do STF sobre mídias digitais – itens que são muito caros para o Presidente Lula.”

A Goldman Sachs estimou que a tarifa efetiva média paga pelas exportações brasileiras suba 35,5 pontos percentuais. O efeito negativo no PIB brasileiro poderá ficar entre 0,3 e 0,4 ponto percentual – isso se não houver retaliação brasileira, o que poderia agravar as consequências para a atividade econômica e a inflação.

“Não está claro se e como o Brasil vai retaliar,” disse a Goldman em relatório. “A inclinação política deve ser por fazer algo, mas esperamos que os exportadores locais pressionem o Governo para não aliviar a pressão.”

Praticamente 80% das exportações brasileiras para os EUA são de commodities e mercadorias pouco elaboradas.

As exportações de produtos como petróleo e minério de ferro poderão mais facilmente ser redirecionadas para outros mercados – e a China tende a se beneficiar disso, possivelmente tendo acesso a mercadorias em melhores condições.

No setor siderúrgico, as exportadoras brasileiras já haviam sido atingidas pelas tarifas setoriais sobre o aço e atualmente exportam pouco para os EUA, disse o Citi em um relatório. “De maneira geral, a exposição é baixa,” disse o banco.

Para a Suzano, de celulose, o mercado americano representa quase 15% de suas exportações. A Klabin vende pouco para os EUA.

A Embraer é uma das companhias brasileiras mais expostas. A ação da empresa caiu 5,7% no after hours da NYSE, depois de ter caído 4,1% no fechamento do dia.

Igor Barenboim, economista-chefe da Reach Capital, comentou que a cotação política da carta de Trump traz o risco de uma radicalização do discurso do Governo brasileiro, com possíveis impactos na dinâmica política interna, num momento em que se discute uma saída para o impasse em torno do IOF.

“Do ponto de vista macro, é importante lembrar também que boa parte da queda do dólar no Brasil veio do enfraquecimento global da moeda americana,” afirmou Barenboim. “Corremos o risco agora de não aproveitar essa tendência internacional.”