Não importa quem seja o próximo Presidente, ele terá que enfrentar uma fragilidade histórica da economia brasileira: a baixa produtividade.
O que os candidatos têm a dizer sobre isso? Ninguém sabe.
Não existe desenvolvimento social sem avanço da produtividade – ela é praticamente sinônimo do nível de renda de uma nação.
“Produtividade não é tudo, mas no longo prazo é quase tudo,” o economista Paul Krugman escreveu certa vez.
Nesse aspecto, o Brasil tem tido um resultado pífio. Nos últimos anos, o país viu períodos de breve melhora, e em seguida fases de retração. No final, nossa produtividade andou quase nada nas últimas quatro décadas.
A produtividade da mão de obra até registrou um avanço tímido, resultado de conquistas como a expansão do ensino. Há 40 anos, a média de escolaridade da população brasileira adulta não chegava a 4 anos de estudo; hoje se aproxima de 10.
Por outro lado, a chamada produtividade total dos fatores – PTF no jargão dos economistas e que mede a eficiência dos investimentos em capital – teve um resultado desanimador.
Entre 1981 e 2021, a produtividade por hora trabalhada, ou seja, o total produzido pelos trabalhadores para cada hora de trabalho, registrou um avanço médio de 0,6% ao ano.
Foi um resultado bastante modesto mas, ainda assim, melhor do que o avanço da PTF. Nessa métrica, a produtividade avançou 0,3% em média no mesmo período.
O aumento da produtividade da economia depende desses dois fatores, trabalho e capital. Historicamente, a produtividade de ambos oscilava em sintonia: subiam e caíam ao mesmo tempo, com um resultado bastante similar.
Mas segundo os pesquisadores do Observatório da Produtividade Regis Bonelli, da Fundação Getúlio Vargas, a partir de 2010 ocorreu uma discrepância pouco comum.
Ao fazer um zoom nos dados, os pesquisadores notaram uma anomalia: uma “boca de jacaré” começou a se abrir. A produtividade dos trabalhadores continuou crescendo, ainda que num ritmo mais lento, mas o indicador que mede a eficiência do capital caiu.
Entre 2010 e 2020, a produtividade do trabalho avançou em média 0,5% ao ano, enquanto a PTF regrediu 0,2% ao ano nesse período.
A razão da marcha à ré pode ser resumida em um nome pomposo: a Nova Matriz Econômica, o conjunto de intervenções heterodoxas na economia lideradas pelo então ministro Guido Mantega. Iniciadas no final do Governo Lula e aprofundadas no Governo Dilma, essas políticas resultaram numa queda da eficiência da economia – que, ao final, refletiu-se na queda da produtividade.
Historicamente, o País tem sérias dificuldades para aumentar a sua produtividade por questões como o custo do sistema tributário e a infraestrutura precária. Mas, com a Nova Matriz, o que era ruim ficou ainda pior, e a economia regrediu nesse quesito.
“Até 2008 o Brasil estava no caminho certo, embora em ritmo mais lento do que outros países. As reformas dos anos anteriores incentivaram o aumento da eficiência do capital. O câmbio forte também havia colaborado para o aumento dos investimentos,” diz a economista Silvia Matos, da FGV. “Mas a crise financeira internacional deu espaço à narrativa do estado como tutor.”
Em uma política então classificada pelo governo como “contracíclica”, houve, em meio ao colapso mundial, o aumento dos financiamentos dos bancos públicos. A taxa de investimento chegou a 22% do PIB, um número relativamente elevado para o padrão recente da economia brasileira, mas que não trouxe o resultado esperado.
“Foi muito limão, mas pouca limonada: o estoque de capital aumentou, mas o retorno foi negativo,” diz Silvia.
No livro Para não esquecer: políticas públicas que empobrecem o Brasil, organizado pelo economista Marcos Mendes, pesquisador do Insper, há capítulos com a análise de casos emblemáticos de como medidas aparentemente bem-intencionadas podem redundar num tremendo fracasso.
Um exemplo foi a política de exigência de conteúdo local para a indústria de exploração do petróleo. A P-66, uma plataforma produzida no Brasil, demorou 44 meses para ser entregue. Uma outra fabricada na Coreia do Sul ficou pronta em 12 meses, apesar de ter quase o dobro do tamanho.
Pior: muitos projetos simplesmente não conseguiam cumprir as exigências de conteúdo nacional, retardando o desenvolvimento dos campos de exploração. Um estudo estimou que a rentabilidade dos investimentos ficaria em 19% num cenário normal, mas caía praticamente pela metade com as exigências de conteúdo local.
Outro caso de má alocação de recursos foi o Programa de Sustentação do Investimento (PSI), do BNDES, que virou entre 2009 e 2015. Os dados mostram que o avanço do crédito direcionado não se traduziu em aumento da produtividade. Pelo contrário, houve queda da PTF nesse período, como mostra análise de Vinicius Carrasco e Guilherme Marçal de Freitas.
Para completar, o programa de financiamento subsidiado teve um custo fiscal acumulado de R$ 285 bilhões, de acordo com estimativas do Ministério da Economia.
O desequilíbrio fiscal causado por essas e outras medidas, como a intervenção nos preços da energia elétrica, trouxe mais inflação e jogou os juros para cima.
De acordo com os pesquisadores da FGV, a produtividade do capital parou de piorar a partir de 2019, saindo de sua década perdida.
Nos últimos anos, houve reformas positivas, como a trabalhista. O Banco Central lançou o Pix, entre outras medidas de aumento da competição no setor financeiro. Foi aprovado o novo marco do saneamento. Entretanto, em meio à crise da pandemia e queda de sua popularidade, Bolsonaro partiu para medidas populistas e distribuição de benefícios, aprovados em conluio com o Congresso – e isso terá, mais uma vez, uma carga negativa para a produtividade futura.
“Houve uma distribuição generalizada de benesses, que geram distorções sistêmicas,” afirma Marcos Mendes. “As decisões de investimentos são tomadas levando em conta a proteção criada pelos benefícios, não pela eficiência.”
Para o economista, o próximo governo terá que retomar a agenda de reformas em prol da produtividade, entre elas a abertura comercial – essencial para a absorção de tecnologia – e a reforma tributária – por exemplo, revendo os incentivos para que as empresas se mantenham pequenas e pouco competitivas.
“O que traz crescimento de longo prazo é a inovação e a circulação de ideias. É produzir mais coisas novas e melhorar coisas antigas. Para isso, é preciso investir em capital humano,” diz o economista. “Historicamente, o Brasil optou por subsidiar empresas em vez de pessoas. Isso não dá certo.”
No passado, Lula já disse que o governo precisa ensinar as pessoas a pescar, em vez de dar o peixe. A Nova Matriz Econômica distribuiu muito peixe, mas o País não saiu do lugar.