Os investimentos guiados pelo critério ESG estão chegando aos emissores de dívida brasileiros. 

Nos últimos meses, pelo menos dois bancos fizeram emissões de ‘green bonds’, levantando recursos para destinar a projetos com algum impacto ambiental positivo. Trata-se de um mercado incipiente no Brasil, mas que movimentou mais de US$ 250 bilhões no mundo ano passado. 

E a pandemia deve acelerar essa mudança de paradigma. A Moody’s projeta que o mercado global de ‘dívida verde’ chegue a US$ 400 bilhões este ano, uma alta de 60%. 

10903 056ce015 4ad7 0d77 30a5 47c256a8b2c7“A covid-19 é o maior exemplo da força da natureza,” Gabriel Ferreira, o CEO do Banco BV (o antigo Votorantim), disse ao Brazil Journal. “Estamos vendo na prática o que um evento da natureza pode gerar de crise econômica e sanitária em escala global. E qual o próximo evento que pode ter um impacto desses? O aquecimento global de um lado, e a exclusão social, de outro.”

Mês passado, o BV captou US$ 50 milhões na primeira emissão de títulos verdes por um banco privado brasileiro. 

Os recursos vão financiar projetos específicos de geração eólica e engrossar a carteira de financiamento do banco para placas solares residenciais, que deve chegar a R$ 500 mi este ano — um crescimento de 5 vezes ano contra ano.

Em janeiro, o BTG Pactual estruturou um produto semelhante para um de seus clientes: a britânica Faro Energy. A geradora de energia captou R$ 15 milhões por meio de sua subsidiária brasileira para financiar a construção de um projeto de energia eólica em Pirapora, no interior de São Paulo.

De 2014 a 2019, foram emitidos R$ 5,3 bilhões em títulos de ‘dívida verde’ no Brasil — quase metade de tudo que foi levantado na América Latina (R$ 12,4 bi). Foram 52 ‘green bonds’ de 38 emissores diferentes no período, segundo Mariana Oiticica, uma das responsáveis pela área de investimentos de impacto do BTG.

“É um assunto que tem crescido muito nos últimos cinco anos, principalmente nas novas gerações de famílias ricas,” diz ela. A captação da Faro, por exemplo, foi feita apenas com clientes do wealth management do banco, que administra R$ 160 bilhões. “Queríamos testar o interesse desses clientes, e a demanda foi muito boa.”

Na prática, os ‘green bonds’ funcionam como uma emissão de dívida tradicional. A única diferença é que o dinheiro é ‘carimbado’ — só pode ser usado para projetos com impacto positivo para o meio ambiente — e há uma fiscalização rigorosa da alocação.

Para o emissor, os custos são maiores do que uma dívida comum. 

As taxas exigidas pelo mercado estão em linha com as emissões tradicionais, mas a companhia precisa contratar uma consultoria externa para acompanhar a alocação dos recursos e investir numa estrutura interna de fiscalização — o que encarece a operação. (Em mercados mais maduros, como a Europa, há benefícios fiscais que acabam compensando esses custos maiores). 

Por que, então, optar pelos green bonds no Brasil?

“Existe um benefício reputacional,” explica Marcelo Bacci, o CFO da Suzano, uma das primeiras empresas brasileiras a emitir um green bond, em 2016. “Além disso, queremos nos posicionar nesse mercado porque achamos que ele vai crescer muito nos próximos anos e trazer benefícios — inclusive de custos — mais pra frente.”

Gestoras como a BlackRock já se comprometeram a investir apenas em empresas com um alto padrão de ESG (environmental, social and governance), criando um pool de dinheiro ‘carimbado’. 

Em julho de 2016, a Suzano captou US$ 500 milhões com a emissão de um green bond no mercado externo; alguns meses depois, fez a primeira emissão do que chama de um CRA ‘verde’ (uma versão tropicalizada dos green bonds), captando R$ 1 bilhão. 

“A hora que esse pool ficar realmente grande vamos estar bem posicionados para ter acesso a esses recursos,” diz Bacci. “A verdade é que no futuro empresas que não tenham bons padrões ESG vão ter grandes dificuldades para acessar o mercado. O mundo está indo nessa direção e o investidor, ficando cada vez mais exigente.”

ARQUIVO BJ

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