Cresceram nas últimas semanas as especulações de que a AB Inbev terá que diminuir ou até zerar a distribuição de dividendos nos próximos anos para digerir a compra da SABMiller.
O movimento repetiria uma estratégia utilizada em 2008: um ano após a Inbev comprar a Anheuser-Busch, o payout caiu de 70% para 25%.
A especulação já roda o buyside há alguns meses, mas ganhou força nos últimos dias, diante da proximidade da divulgação do balanço do terceiro trimestre – previsto para o dia 25 –, quando a empresa tradicionalmente anuncia seus dividendos.
Apesar de não ter uma política oficial de dividendos, a ABI aumentou a distribuição de proventos nos últimos anos e desde 2015 vem distribuindo € 3,60 por ação. A expectativa inicial do mercado era de que essa distribuição, equivalente a cerca de 100% do lucro esperado para 2018, pudesse se repetir neste ano.
O problema é que os países emergentes – que respondem por 60% do lucro da companhia – estão crescendo menos que o esperado e as moedas sofreram uma desvalorização brutal em relação ao dólar, reduzindo a geração de caixa e dificultando o processo de desalavancagem após a compra da SABMiller.
O Citi publicou um relatório na semana passada mostrando que, sem a redução de proventos, a relação entre dívida líquida e EBITDA cairia de 4,9 vezes para apenas 4,2 vezes em 2020 – enquanto a companhia sinaliza um patamar de 2 vezes como o nível considerado confortável para o longo prazo.
O cenário considerado mais provável pelo Citi é a redução de cerca 40% a distribuição de dividendos, o que ainda manteria o dividend yield no patamar dos 3% – em linha com outras empresas de staples. Neste cenário, o banco estima que a alavancagem possa cair para 3,7 vezes até 2020. O Jefferies também cortou ontem sua previsão de dividendos de € 3,60 para € 2,35 por ação, o que renderia um yield de 2,8%.
O Citi não descarta ainda uma suspensão total de dividendos para os próximos anos ou uma bonificação, com emissão de ações em vez de pagamento em cash. Mas os analistas afirmam que, ainda que o corte possa tirar a companhia do radar de fundos mais voltados para proventos, a redução mais rápida do endividamento tiraria uma das principais incertezas sobre o papel e poderia servir como um catalisador para a alta.
“O que me interessa não é o dividendo, é a trajetória de criação de valor, que depende dessa desalavancagem do médio prazo”, diz um gestor brasileiro comprado no papel.
Ele aponta, no entanto, que a situação é diferente de 10 anos atrás, quando a Inbev comprou a Anheuser-Busch. “Naquela época tinha a crise financeira, hoje a empresa tem muito mais liquidez e a dívida é bem mais longa, não tem desespero nenhum com a estrutura de capital, não me surpreenderia se eles mantivessem os dividendos”.
Quando questionado sobre a distribuição de dividendos em teleconferências e encontros com investidores, o CFO Felipe Dutra vem repetindo uma ordem de prioridade na alocação de capital: crescimento orgânico, desalavancagem, M&As seletivos e só então remuneração dos investidores.
Apesar de estar conseguindo integrar a SABMiller com sinergias maiores que as inicialmente esperadas, a ABI vem passando por uma tempestade perfeita no cenário macro. Ao mesmo tempo em que as economias emergentes estão crescendo menos que o esperado e com desvalorização cambial, os preços das commodities estão subindo, prejudicando as margens.
Desde o começo do ano, o ADR negociado na NYSE acumula queda de 22%. Ontem, o Jefferies reduziu a recomendação para as ações de ‘compra’ para ‘neutro’.
No Brasil, o UBS fez um corte ainda mais seco: reduziu ontem a recomendação de Ambev de ‘compra’ para ‘venda’, citando, além do cenário macro, as dificuldades de competir com a Heineken no segmento mais premium.
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