Depois do sucesso retumbante da PagSeguro, outro IPO da América Latina promete decolar na NYSE na próxima semana. 

A Corporación América, um grupo argentino que opera mais de 50 aeroportos (incluindo os de Natal e Brasília), quer levantar até US$ 750 milhões numa oferta que será precificada no dia 31. A demanda está aquecida e a expectativa é que o preço saia acima do piso da faixa, que vai de US$ 19 a US$ 23 por ação.

Maior operadora do mundo em número de aeroportos e a décima em número de passageiros, a Corporación América tem 52 concessões, a maior parte deles na Argentina, onde opera 37 dos 56 aeroportos nacionais, incluindo os dois maiores, Ezeiza e Aeroparque, em Buenos Aires.

Com foco em terminais de médio porte – que atraem menos interesse das gigantes mundiais do setor, como a alemã Fraport – a companhia tem ainda concessões no Uruguai, Equador, Peru e na Europa, onde opera o aeroporto de Firenze, na Itália, e algumas concessões na Armênia, país de origem da família do controlador, Eduardo Eurnekian.

O empresário de 85 anos – a segunda pessoa mais rica da Argentina com uma fortuna estimada em US$ 2,5 bilhões – começou no setor de comunicação, com o canal Cablevision em 1980. A companhia acabou se tornando uma das maiores operadoras argentinas de TV a cabo. Eurnekian vendeu a companhia em 1995 e partiu para a administração de aeroportos, seu negócio mais promissor. (A lista de negócios de Eurnekian é extensa e envolve agricultura, parques eólicos, uma fábrica de semicondutores, além de um banco digital que está prestes a ser lançado.)

Eurnekian sempre teve muito trânsito junto ao governo – qualquer que fosse ele. O ex-CEO da Corporación América, Rafael Bielsa, foi ministro das relações exteriores de Cristina Kirchner, e durante seu mandato à frente da companhia houve um aumento expressivo nas tarifas aeroportuárias argentinas. 

Com Macri no comando, Bielsa foi substituído. Mas Eurnekian não ficou a pé. Em seu lugar assumiu Martin Eurnekian, o sobrinho e braço-direito do patriarca (que nunca se casou nem teve filhos). A biografia de Eduardo inclui ainda um pedido de prisão preventiva em 2003, por acusações de evasão fiscal. Ele pagou a fiança e anos depois o processo foi arquivado. 

“É meio como ficar sócio da JBS. Quem olhou mais de perto sabia que tinha alguma relação suspeita ali, mas a verdade é que a maior parte dos gringos não olha com essa lupa”, diz um gestor.

Numa entrevista recente à Bloomberg, o bilionário exaltou as reformas da administração Macri, mas guardou os maiores elogios para o Governo Temer. Segundo a reportagem, Eurnakian “espera que as mudanças no Brasil vão levar a Argentina a ser mais ousada nas tentativas de tornar sua economia mais competitiva.”

A Corporación América entrou no Brasil em 2011 num consórcio com a Engevix para operar o aeroporto de Natal; no ano seguinte, repetiu a parceria e levou Brasília. Em 2015, com a derrocada da empreiteira envolvida na Lava Jato, comprou a participação do sócio.

O Brasil é o segundo maior mercado da Corporación em número de passageiros: são cerca de 21 milhões ao ano, comparados a 33 milhões na Argentina. A receita gerada aqui, de US$ 127 milhões/ano, equivale a 9% do faturamento global.

Os coordenadores da oferta, liderados pelo Oppenheimer, estão vendendo a companhia mais como uma aposta na infraestrutura global do que uma história de crescimento em países emergentes.

É a mesma abordagem que foi usada pelos bancos coordenadores da PagSeguro, que venderam a empresa como um caso de tech, e não de emerging markets – isolando em parte a volatilidade normalmente associada à América Latina.

Mas o bom desempenho da Argentina, onde a Corporación faz 65% das suas receitas, também dá respaldo à tese de investimento. “É um país com um presidente reformista que tem a maior taxa de aprovação entre as democracias ocidentais e apoio do Congresso”, diz um gestor que acompanha a oferta. “Além disso, há poucas oportunidades de investimento líquidas no país.”

Em novembro, o IPO da Loma Negra, a cimenteira argentina controlada pela Intercement, teve uma demanda que superou em 11 vezes a oferta. (Ao contrário da Loma, que listou seus papéis na Bolsa de Buenos Aires, com emissão de ADRs nos Estados Unidos, a Corporación América vai se listar só na NYSE.)

A Corporación América faturou US$ 1,1 bilhão nos nove primeiros meses de 2017, 18% a mais que no mesmo período do ano anterior. O lucro saiu de US$ 41 milhões para US$ 72 milhões. No intervalo proposto na oferta, deve chegar à Bolsa com um valor de mercado entre US$ 3 e US$ 3,4 bilhões.

Enquanto isso, na Infraero….