Tabelar juros sempre foi uma má ideia – mas a cada 5 anos, alguém no Brasil a ressuscita.
Um projeto de lei que está ganhando força no Congresso tem potencial de tirar uma fatia relevante do lucro dos bancos – com o maior impacto, em termos relativos, recaindo sobre o Nubank e o Inter.
O PL 2685/2022, do deputado Elmar Nascimento, o líder do União Brasil na Câmara, propõe impor um teto aos juros cobrados pelos bancos no crédito rotativo do cartão. A proposta é que esse teto seja de 8% ao mês, um gap relevante em relação aos juros praticados hoje pelos bancos.
A média dos juros do rotativo do cartão de crédito hoje é de 14%.
O PL foi apresentado em dezembro e está na Comissão de Finanças e Tributação (CFT) da Câmara dos Deputados. Como foi apresentado em caráter terminativo, ele não precisa passar pelo plenário. Se for aprovado em duas comissões – a CFT e a Comissão de Constituição e Justiça – ele segue direto para o Senado.
“Se for aprovado, o impacto vai ser relevante pra cace&*,” disse o analista de uma gestora.
No sellside, alguns analistas já começam a tentar estimar o tamanho do rombo. Num relatório hoje, o Santander estima um impacto de US$ 144 milhões no lucro do Nubank neste ano, dado que os cartões de crédito representam 82% da carteira total do banco, e o crédito rotativo é 7% dessa fatia.
O analista Henrique Navarro estima que a penetração do crédito rotativo nos empréstimos de cartões de crédito “deve aumentar ao longo de 2023, impulsionado pelo crescimento da carteira de crédito e por um cenário macroeconômico mais desafiador.”
Para o Santander, o rotativo deve chegar a 16,3% da carteira de cartão de crédito do Nubank este ano, o que levaria ao impacto dos US$ 144 milhões no lucro do ano, ou 38% do total.
O Itaú BBA tem uma estimativa semelhante. O analista Pedro Leduc projeta que o PL tiraria R$ 400 milhões do R$ 1,5 bi projetado para o lucro do Nubank este ano (cerca de 30% do total).
Para Leduc, o maior impactado seria o Inter, que poderia perder 86% do seu lucro de 2023: R$ 300 milhões de um lucro estimado de R$ 400 milhões.
Já os bancões teriam um impacto menos relevante, em termos relativos, por terem um portfólio mais diversificado. No Bradesco e Banco do Brasil, a rasteira deve girar em torno de R$ 3 bilhões, nas contas do Itaú, o equivalente a 13% e 9% do lucro estimado para o ano.
Henrique, do Santander, tem uma visão mais otimista. Para ele, o Bradesco terá um impacto de R$ 1,2 bilhão no lucro (6% do total), o Itaú de R$ 1,4 bi (4% do total) e o Banco do Brasil de R$ 1,3 bi (3,6% do todo).
Esses impactos ainda não foram incorporados pelo sellside em seus modelos. Em outras palavras: se o projeto de fato for adiante, todos os analistas do setor terão que ajustar seus modelos, o que deve causar um impacto relevante no valor justo das empresas.
“O governo teria que considerar o efeito que isto vai ter no consumo. Boa parte dos clientes novos de cartões, de baixa renda, não vão ganhar mais cartão ou vão ter os limites reduzidos,” disse um analista do setor. “Então quem vai sofrer é o bom pagador.”
Outro analista notou que os bancos podem acabar criando um novo arcabouço para a cobrança dos juros. Hoje, quando um cliente atrasa e entra no rotativo, os juros só começam a ser cobrados a partir desta data.
“O retorno do cartão de crédito não é tão alto que permita sustentar essa mudança. O que eles devem fazer é começar a cobrar o juros de quem entrou no rotativo a partir da data que a compra foi feita, de forma retroativa. Cobrariam um juro menor, mas por um período maior,” disse ele. “O Itaú chegou a propor isso no passado.”