A decisão da Totvs de vender sua unidade de hardware para a Elgin põe fim a um dos investimentos mais mal sucedidos — e mal explicados — de sua história: a compra da Bematech. 

A empresa de Laércio Cosentino pagou R$ 550 milhões pela Bematech no fim de 2015, numa operação que em tese lhe daria acesso ao mercado de varejo, onde sempre foi fraca e a concorrente Linx nada de braçada.

Menos de quatro anos depois, o negócio de hardware foi revendido por apenas R$ 25 milhões. 

O business de software — que inclui programas voltados principalmente para o mercado de hotelaria e foodservice e o Bemacash, uma solução para pequenos varejistas — não fez parte da transação.

“Temos um histórico longo de M&As bem sucedidos, com muito valor criado ao longo dos anos, mas claramente a gente não acertou 100% dos casos – e essa compra de hardware da Bematech foi um desses casos”, o CEO Dennis Herszkowicz reconheceu numa teleconferência com analistas hoje pela manhã.

Quando foi comprada, a Bematech já tinha um modelo de negócios relativamente arcaico, precisando de um bom banho de loja. 

A Bematech tinha um pezinho em softwares de gestão voltados para o pequeno varejo, mas seu ponto forte sempre foi o hardware. Até hoje, seu principal produto são as impressoras de cupom fiscal, um negócio que anda para trás com a migração para a nota fiscal eletrônica.

Seu ativo mais valioso, no entanto, era a rede de mais de 5 mil revendedores em todo o País, que ajudaria a Totvs — focada em clientes de médio e grande porte — a aumentar sua capilaridade. 

Mas a coisa não vingou. 

No último número específico sobre a divisão, divulgado pela Totvs no fim de 2017, o Bemacash, onde estava a maior avenida de crescimento, tinha uma base de apenas 7 mil clientes. 

Uma das primeiras providências de Dennis ao assumir o comando foi tornar o Bemacash uma solução ‘agnóstica’, que será vendida associada a qualquer dispositivo e não mais apenas integrada ao hardware produzido pela Bematech. 

Mas o modelo de distribuição ainda patina, mostrando a fragilidade da tese de ganho de capilaridade. 

“Como a Bemacash é focada num cliente pequeno e muito pulverizado, a gente vai resolver essa questão de distribuição através de parcerias, mas ainda não temos uma novidade completa para passar para vocês”, Dennis disse aos analistas.

Enquanto os negócios de software — que respondem por quase 90% da receita da Totvs — tiveram uma margem EBITDA de 14,6% em 2018, na unidade de hardware a rentabilidade foi negativa em 3,9%. As baixas contábeis em hardware somam R$ 132 milhões. 

A venda do negócio de hardware é mais um passo de Dennis, o executivo egresso da Linx que assumiu a Totvs em novembro passado, substituindo Cosentino – o fundador que sempre comandou a empresa com mão forte.

A chegada do novo CEO coincide com um período de forte valorização da Totvs, cuja ação negocia na máxima histórica.

“O Dennis está com o discurso certo, de foco em softwares, em crescimento e em aumentar a receita recorrente”, diz um gestor que já foi acionista. “Depois de anos insistindo nos mesmos erros, parece que a empresa finalmente está conseguindo olhar na direção certa”. 

Apesar do bom desempenho do papel, a Totvs ainda está longe de uma unanimidade. 

“Os acionistas estão pagando na frente por uma melhora que ainda não aparece muito no balanço”, diz um analista. “E que deve demorar para se concretizar num negócio de ciclo longo e alto nível de complexidade”. 

A tentativa anterior de sucessão na Totvs falhou de forma épica. Em 2015, Rodrigo Kede deixou a IBM para comandar a companhia, mas abandonou o cargo menos de um ano depois — logo após a compra da Bematech – alegando problemas de saúde. Semanas depois, retornou ao posto de CEO da IBM, colocando a versão oficial em xeque. 

Dennis está conduzindo também uma guinada da Totvs para o mercado de serviços financeiros — uma ‘techfin’ e não ‘fintech’, como costuma dizer. 

A companhia acaba de estruturar a nova área. A ideia é entrar em meios de pagamento não só para a base de varejo — como já vem fazendo em parceria com a Rede — mas oferecer serviços também para outros segmentos. 

Mais de um terço da folha de pagamento das grandes empresas do país passa pela Totvs e ela poderia, por exemplo, fazer parcerias para distribuir seguros e empréstimos consignados usando sua base de dados. 

Outro serviço potencial: ajudar grandes empresas a fazer cobrança e financiar o capital de giro de seus fornecedores, alavancando as informações que circulam pelo seus sistemas de ERP. 

 

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