Há muito tempo a Bovespa não via um caso de ativismo societário tão veloz e furioso.
Carlos Terepins renunciou ao comando da Even ontem à noite em meio ao avanço crescente de um grupo de investidores liderados por Alexandre Grendene.
De maio para cá, o fundo Melpar, administrado pela Nova Milano (o family office de Grendene), comprou mais de 25% da Even na Bolsa, tornando-se de longe o maior acionista da incorporadora e sinalizando que queria a saída de Terepins, o fundador e CEO da empresa.
Apesar de ser a face pública da Nova Milano, Grendene não está sozinho na tomada de controle da Even.
Outros cotistas do Melpar incluem a família Zaffari, donos da rede de supermercados gaúcha de mesmo nome; os irmãos Helio e Salo Seibel, proprietários da Leroy Merlin no Brasil e acionistas relevantes da Duratex; a família Vidigal, herdeiros do banqueiro do Mercantil Finasa, Gastão Eduardo de Bueno Vidigal; e a família Gazzola, que vendeu a empresa de refeições corporativas Puras ao grupo francês Sodexo em 2011.
Aglutinando todos eles: Leandro Melnick, sócio da Even no Rio Grande do Sul e o único cotista do Melpar que conhece profundamente o negócio de incorporação.
De acordo com pessoas que acompanharam os bastidores, antes de começar a acumular as ações da Even, emissários de Grendene se reuniram com Terepins para discutir sua visão estratégica para a empresa. Estes investidores queriam que Terepins deixasse o dia a dia e ficasse na presidência do conselho.
Terepins resistiu à ideia e, de acordo com duas pessoas envolvidas nas conversas, duvidou que o grupo de Grendene fosse construir uma posição substancial na empresa.
Em junho, isso começou a mudar. A Nova Milano ultrapassou 10% do capital da Even e sinalizou que caminhava para 15%. Recentemente, colocou um representante seu no conselho.
A Even é quase consensualmente elogiada por sua performance operacional, mas Terepins sofreu críticas do mercado por não ter reduzido o tamanho da empresa rapidamente quando ficou claro, no ano passado, que 2015 seria um ano desastroso para o setor. Os investidores pediam maior disciplina na alocação de capital — uma agenda que é, em tese, compartilhada pelo grupo da Nova Milano.
A ação da Even hoje negocia a metade de seu valor patrimonial, e Grendene e companhia acreditam que, ao reduzir drasticamente os lançamentos e transformar em caixa o banco de terrenos e os recebíveis, o preço da ação convergirá para seu valor patrimonial, gerando ganhos expressivos para sua posição.
Para além da crítica sobre alocação de capital, o mercado considerava que Terepins, com apenas 6% da Even, controlava a empresa como se fosse dono de 100% por ter montado um conselho de administração que lhe era amigável. Críticos deste modelo, investidores externos defendiam um conselho com mais poder, que se reunisse mensalmente e assumisse mais responsabilidades.
Com a renúncia de Terepins, o mais provável é que o novo CEO da Even seja Leandro Melnick. Ele já é sócio da Even por meio da Melnick Even, uma incorporadora em Porto Alegre na qual Melnick tem 20% e a Even, 80%.
Uma eventual gestão Melnick já começaria com uma dúvida. Alguns acionistas da Even querem saber se Melnick, como o mentor do investimento na Even e aglutinador do grupo de investidores, tem algum arranjo para receber remuneração atrelada à performance do fundo. A existência de um arranjo assim geraria uma série de outros questionamentos.
Uma assembleia geral extraordinária deve ser convocada nas próximas semanas para eleger um novo conselho. A Nova Milano, hoje dona de quase 30% da Even, quer eleger a maioria do conselho, mas Terepins e outros minoritários ainda devem ser representados na nova configuração.
“Talvez estejamos saindo de uma situação em que um cara que é do ramo e tem só 5% da empresa mandava em 100%, para outra, em que um grupo com 25%, e sem ser do ramo, mande em 100% do negócio,” disse um acionista. “O ponto-chave aqui é: qual a representatividade que a Nova Milano merece em virtude de sua posição na empresa?” De acordo com uma fonte, os planos da Nova Milano são de chegar a 40% do capital da Even.
Ironicamente, a reviravolta de ontem associa a Even ao nome de Grendene, cujo histórico com o mercado de capitais envolve dois episódios que muitos gestores gostariam de poder esquecer: o IPO da própria Grendene e da Unicasa, que fabrica móveis de cozinha. Ambas as empresas viram o preço de suas ações implodir semanas depois de seus IPOs na Bovespa, quando seus resultados decepcionaram significativamente o mercado.