Em 2025, estamos de volta à lei da selva.

É assim que a consultoria Eurasia resume o que podemos esperar de um ano que deve ser moldado pela volta de Donald Trump e o contínuo enfraquecimento das instituições de governança global.

Em seu tradicional relatório de maiores riscos globais, divulgado no início de cada ano, a Eurasia coloca o “déficit de liderança mundial” como a principal ameaça geopolítica do momento.

“Nossos desafios são globais, sejam eles relacionados a clima, tecnologia, economia ou segurança. Eles não poderão ser superados sem uma maior cooperação internacional – mas os atores políticos mais essenciais para fortalecer as instituições globais estão se movendo na direção contrária.”

Esses atores são sobretudo os EUA e a China, as nações mais poderosas do mundo, mas que “rejeitam responsabilidade pelo resto do planeta.”

O documento é assinado por Ian Bremmer, o presidente da Eurasia, e Cliff Kupchan, o chairman do grupo.

Ian Bremmer

Segundo os analistas, estamos retornando para um mundo no qual “os mais fortes fazem o que bem desejam, enquanto os mais fracos são condenados a sofrer.”

“Não é uma trajetória sustentável,” dizem.

O Brasil é citado como possível atingido pela guerra comercial – num momento em que já sente o impacto do dólar mais caro e da invasão dos importados chineses.

“O Brasil é um alerta,” escreveram os analistas. “A recente turbulência – desencadeada pela frustração com o pacote fiscal – mostra o quão rápido os desafios locais podem se tornar uma espiral quando combinados com pressões externas de juros mais elevados, dólar mais forte, e uma demanda global mais fraca.”

Para a Eurasia, mesmo países com fundamentos mais sólidos vão descobrir que enfrentarão restrições em 2025. 

A seguir, os dez maiores riscos mundiais de acordo com o relatório – e como o Brasil poderá ser atingido.

1. O G-ZERO VENCE

O maior risco do ano não é nenhum evento em particular – e sim o impacto cumulativo do déficit de liderança em um mundo de ruptura da ordem global. É o ‘G-Zero,’ na definição de Bremmer.

“É uma era na qual nenhum poder ou grupo de poderes está disposto ou tem a capacidade de liderar a agenda global e manter a ordem internacional,” diz a consultoria. 

A tendência se agrava porque dezenas de milhões de cidadãos não acreditam mais nos “ideais globalistas” de suas lideranças.

“O aumento da desigualdade, as mudanças demográficas e as transformações tecnológicas inebriantes fizeram com que muitas dessas pessoas não confiem mais no governo e nem mesmo na democracia,” afirmaram os autores do relatório.

Para os analistas, estamos entrando em um período que lembra os anos 1930 e o início da Guerra Fria.

“O risco de cauda de acontecer algo verdadeiramente catastrófico cresce a cada dia,” sustentam os analistas.

 2. REGRAS DE DON

A erosão das instituições independentes de contrapeso ao Executivo e o enfraquecimento do império da lei ampliaram a dependência dos EUA nas decisões de um único homem: Donald Trump.

Para os analistas, Trump assume o segundo mandato mais experiente e mais organizado do que em 2017 – e terá a seu lado uma equipe mais alinhada ideologicamente do que em seu primeiro governo.  

“A indiferença de Trump ante os valores tradicionais dos EUA farão de 2025 e dos próximos anos uma temporada aberta de vandalismo político.”

3. RUPTURA EUA-CHINA

A volta de Trump poderá levar a um rompimento atabalhoado da relação mais importante da geopolítica internacional – o que poderá evoluir para uma crise econômica internacional.

Para a Eurasia, uma fratura nas relações entre EUA e China vai aprofundar as suspeitas de lado a lado, ampliar animosidades e aumentar o risco de um escalonamento indesejado das hostilidades.

4. TRUMPONOMICS

Trump vai herdar uma economia aquecida, mas suas políticas protecionistas poderão trazer mais inflação e menos crescimento. Os aspectos mais negativos devem ser o aumento das tarifas contra importados e o combate à imigração.

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“Trump deve seguir suas promessas de campanha, e os efeitos serão maiores do que os empresários e os investidores estão esperando,” comentaram.

Em um documento com comentários sobre as implicações para o Brasil, a equipe regional da Eurasia estimou que as dificuldades para o Governo Lula poderão se agravar, caso as políticas de Trump de fato aumentem a inflação nos EUA e fortaleçam o dólar.

“Os riscos das políticas de Trump amplificam os riscos econômicos para o Brasil em 2025 – e um agravamento das condições financeiras internacionais, como alta dos juros lá fora, pode desestabilizar a política interna brasileira,” disse Silvio Cascione, o diretor da Eurasia no Brasil.

“Uma queda na popularidade de Lula poderá agravar ainda mais o quadro – com Lula buscando políticas insustentáveis para recuperar a aprovação popular,” o analista disse ao Brazil Journal. “Podemos entrar em uma espiral negativa, cujo desenlace é difícil de prever.”

Para a Eurasia, um cenário global negativo aumentaria as chances de um candidato de oposição vencer em 2026 — mas também inflamaria o sentimento antissistema e abriria as portas para um resultado inesperado.

A consultoria acredita que o PT perdeu força mas segue competitivo – e aposta na manutenção da atividade econômica aquecida para ter maiores chances de vitória em 2026, de maneira similar ao que ocorreu em 2006 na crise pós-Mensalão e em 2014, quando Dilma conseguiu se reeleger apesar de a crise contratada na economia.

5. RÚSSIA AINDA REBELDE

Nenhum país está fazendo mais para subverter a ordem global do que a Rússia. Em 2025, os esforços de Vladimir Putin vão se intensificar.

6. IRÃ NAS CORDAS

O Oriente Médio continuará sendo um barril de pólvora – e a razão principal é que o Irã está na sua posição de maior fragilidade em décadas.

Para a Eurasia, Trump dificilmente conseguirá deter Benjamin Netanyahu caso o israelense decida ampliar uma escalada contra Teerã, particularmente na tentativa de deter o programa nuclear iraniano – e qualquer erro de cálculo estratégico poderá inflamar ainda mais a região.

 7. EMPOBRECENDO O MUNDO

As duas maiores economias globais vão exportar ‘disrupção’ para todo o mundo – acelerando a “fragmentação geoeconômica” que deverá perdurar por anos, mesmo depois do governo Trump e até mesmo para além de Xi Jinping.

“A economia mundial está prestes a aprender uma lição dolorosa: quando as duas maiores economias do mundo se viram para dentro, todo mundo paga o preço.”

 8. IA LIBERTADA

A maioria dos países optou por uma regulamentação frágil da inteligência artificial, e não existe uma coordenação internacional para controlar o uso da tecnologia.

Os riscos dos dados colaterais da IA vão continuar crescendo, diz a Eurasia.

9. ESPAÇOS DESGOVERNADOS

O déficit de liderança impacta também a governança internacional de áreas comuns, como os oceanos, os leitos dos mares – e até mesmo o espaço aéreo.

“Territórios sem governo vão se transformar em terreno fértil para ameaças transnacionais, como terrorismo, crime organizado, e hackers” escreveram os analistas.

Eventualmente, são riscos que podem transbordar fronteiras e não se restringir a regiões diretamente afetadas.

10. IMPASSE NO MÉXICO

O México enfrentará desafios enormes, diante do conflito externo com Trump e as tensões internas causadas pela reforma constitucional e pela piora fiscal.

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Segundo a Eurasia, as habilidades diplomáticas e políticas da presidente Claudia Sheinbaum serão testadas em breve.

“No longo prazo, o México está bem-posicionado. O país tem demografia favorável e baixo custo trabalhista,” relataram os analistas. “Ele deverá se beneficiar do nearshoring e de sua integração com a maior economia do mundo. Mas Sheinbaum, em seu primeiro ano, terá que enfrentar ventos contrários para destravar esse potencial.”