O Rio tem uma relação íntima e histórica com a arte.
Nos anos 50 e 60, a capital cultural do País era o endereço de grandes galerias como a Bonino e a Petite Galerie, e de grandes coleções como Jean Boghici, Sergio Fadel, Roberto Marinho e, claro, Gilberto Chateaubriand. Por meio de instituições como o Parque Lage e o MAM, o Rio também foi o berço de movimentos que serviram como farol para a cultura nacional.
Mas com o esvaziamento econômico da cidade nas últimas décadas – e competindo com eventos como a Bienal Internacional de São Paulo e a SP-Arte – criar uma feira no Rio do zero e torná-la uma referência na América Latina é algo a ser aplaudido.
Brenda Valansi conseguiu isso com a ArtRio, a feira que ela fundou em 2010 com o sonho de colocar a Cidade Maravilhosa no crescente circuito das feiras de arte internacional.
Em seu início, a ArtRio era focada principalmente nas galerias internacionais – que traziam suas obras para o Brasil mirando o bolso (e as paredes) dos colecionadores brasileiros.
Com a crise econômica do Governo Dilma, no entanto, “o mercado começou a esfriar, e as galerias vinham aqui e já não vendiam tanto,” Brenda disse ao Brazil Journal. “Percebemos que precisávamos mudar os nossos esforços.”
A saída foi focar nas galerias brasileiras e nos artistas locais, e bancar a vinda de colecionadores internacionais interessados na arte brasileira. “O Brasil é muito rico na sua produção artística. É um dos poucos países onde você consegue fazer uma feira de arte só de artistas e marchands brasileiros,” disse a fundadora, que antes de criar a ArtRio teve uma breve carreira de artista depois de trabalhar como veterinária em Nova York.
A aposta está dando certo. A feira vem crescendo ano a ano e já se firmou como um evento indispensável no calendário cultural da cidade.
“Nem só de samba vive o carioca,” o prefeito Eduardo Paes disse ao Brazil Journal. “A ArtRio reforça a nossa vocação como protagonistas na produção de grandes eventos.”
A edição deste ano – que começou hoje e vai até domingo – atraiu 90 galerias e 120 colecionadores internacionais. Nestes cinco dias, a feira deve receber quase 60 mil pessoas, 10 mil a mais que no ano passado.
O faturamento também deve crescer, já que a ArtRio conseguiu atrair mais patrocinadores do que o ano passado, e 14 galerias a mais, que pagam para ter um estande na feira. (A venda dos ingressos tem uma representatividade pequena na receita, já que muitos são dados sem custo aos patrocinadores).
Montada na Marina da Glória, na beira de uma Baía da Guanabara frequentemente encharcada de sol e com o Pão de Açúcar ao fundo, a ArtRio 2023 tem alguns diferenciais em relação às edições passadas.
“Teve uma volta forte da abstração este ano, de obras mais leves, mais frescas,” disse Brenda. “Nas edições passadas vínhamos de assuntos super necessários, mas mais densos, mais duros. Este ano temos esses assuntos também, mas numa posição de menos protagonismo.”
O argentino Leopol Mones Cazon, da galeria Isla Flotante, de Buenos Aires, está voltando à ArtRio depois de oito anos. “Essa é a feira mais bonita do mundo,” ele disse ao Brazil Journal enquanto visitava o espaço um dia antes da abertura.
A ArtRio nasceu quando Brenda e sua então sócia Elisangela Valadares quiseram trazer para o Rio o mesmo conceito de feiras internacionais que viam em outros países. Pouco depois, Alexandre Accioly e Luiz Calainho – talvez os dois maiores empreendedores da noite carioca – entraram na operação, mas Brenda comprou a participação dos três sócios em 2017. Dois anos depois, a Dream Factory – dona de eventos como o Rock in Rio e The Town – comprou 50% do capital da feira.
Hoje, Brenda diz ter planos de criar mais feiras, provavelmente menores, em outras cidades do Brasil, já que “tem muitos lugares que ainda não têm feiras de arte e onde isso pode ser explorado.”
Outro plano é voltar às origens e trazer de novo as galerias internacionais para expor na feira – mas só quando o mercado brasileiro der sinais de que consegue absorver essa oferta.
“Estou começando a sentir um cheiro de mudança. Esse ano conseguimos trazer cinco galerias internacionais. Todas são da América Latina, mas já é um primeiro passo.”
Jones Bergamin, o Peninha, dono da Bolsa de Arte, diz que a ArtRio “copia um pouco o estilo da cidade.”
“É uma feira com bom gosto, sem stress… Pequena, mas do tamanho certo pra dar tempo de ver. Não tenta ser gigantesca. Todo mundo está descontraído lá dentro. Os próprios marchands que expõem aqui em São Paulo quando chegam no Rio estão mais descontraídos. Eles olham para o Pão de Açúcar do stand deles, saem ali no pátio e vêem a Baía da Guanabara… Só isso já relaxa.”