Ray Dalio está preocupado com a cruzada de Donald Trump contra a China – e recalibrando seu portfólio para fazer frente às consequências.

Em artigo publicado hoje em seu LinkedIn, o gestor do maior hedge fund do mundo, com US$ 160 bilhões sob administração, sentenciou: a guerra comercial com Pequim pode ser apenas o início de uma mudança geopolítica irreversível que pode levar a outros tipos de guerra – de capitais, tecnológica e até aquela envolvendo balas de verdade. 

10338 b9ca24ea f0ac 0ecf 0000 4853c0a7ff4a“Não estou dizendo que isso é provável e nem estou certo de que minha leitura está correta. Estou dizendo apenas que parece que as chances aumentaram relativamente ao cenário que se tinha antes”, diz, para começo de conversa.

Dalio vinha apostando que Pequim e Washington chegariam a um acordo. Mas a declaração de Trump de que pretende mais que dobrar a aposta e impor mais US$ 100 bilhões em tarifas contra a China – adicionais aos US$ 50 bilhões iniciais – temperou seu otimismo. A China disse que vai responder ‘dólar por dólar’.

A pergunta de vários bilhões de dólares é se Trump está blefando ou fazendo um convite aberto ao conflito, com consequências imponderáveis.

Dalio enumera razões para se apostar no segundo cenário. Primeiro, ele elenca as declarações recentes de indicados por Trump a cargos-chave, como Robert Lighthizer, o United States Trade Representative; Peter Navarro, chefe do Conselho Nacional de Comércio criado por Trump ano passado; e John Bolton, recém colocado à frente do Conselho Nacional de Segurança. 

“Além de aparentemente querer ser mais combativa com a China, essa administração parece pronta para sair do acordo iraniano quando ele for reavaliado em maio, o que pode provavelmente levar a alguma forma de conflito com o Irã e outros países que assinaram esse acordo.”

Dalio diz que o mundo passa por uma fase perigosamente parecida com o final dos anos 1930, que antecederam a última Grande Guerra. 

Em ambos os casos, há um grande fluxo de liquidez que puxou os mercados e a economia para cima, ao mesmo tempo em que a desigualdade aumentou levando à ascensão de líderes populistas –– que prosperam exatamente quando uma parte relevante da população acredita que o sistema não trabalha a seu favor. Outra similaridade: há novas potências mundiais desafiando a supremacia daquelas já estabelecidas. 

“A guerra ocorre porque o poder ascendente naturalmente quer mais poder, e o poder dominante naturalmente não quer ceder, então começa um teste de poderes. Ele normalmente começa com pequenos confrontos, que caminham para grande confrontos. A dinâmica é cíclica: guerras levam a períodos de paz, que levam à guerra e assim por diante”, diz, citando a ‘Armadilha de Tucídides’, tese do historiador grego que postulou que a ascensão de potências leva a conflitos inevitáveis. 

Ainda recorrendo à História, Dalio avalia que outro sinal importante é a ascensão do ‘capitalismo de Estado’, que ocorre quando o governo redireciona os negócios ao serviço do país, e não do acionista, para se certificar de que, no caso de guerra, os recursos produtivos serão suficientes. 

 

“Por exemplo, um país pode decidir que precisa de uma indústria siderúrgica mais forte em caso de guerra, mesmo que este não seja o uso mais econômico de seus recursos, porque teme ser cortado de fontes de importantes fornecimento e ativos estratégicos. … Correndo o risco de ler mais do que devia neste movimento, as recentes intervenções de Trump na economia – como por exemplo, sua ordem direta proibindo a Broadcom de comprar a Qualcomm – vão notadamente neste sentido”. 

Para além do conflito armado, o gestor aponta que há o risco de uma guerra de capitais – na qual os Estados Unidos teriam menos vantagem que na guerra comercial. 
 
“Do lado oposto de um déficit comercial ou de conta corrente, está um superávit de capital (isto é, nossos empréstimos ou venda de bônus para a China para financiar os déficits, o que levou os chineses a ter um grande estoque de nossa dívida). Por isso, pode-se argumentar que essa guerra comercial vire também uma guerra de capitais”, diz. 
 
“Isso seria mais feio que uma guerra comercial.  Quem quer que tenha a opinião de que os EUA possuem vantagem numa guerra comercial porque têm um grande déficit (e por isso mais a ganhar) tem que pensar o mesmo sobre a China numa guerra de capitais, porque ela tem o maior déficit.”
 
E o que fazer com os ativos neste cenário? “Nossa filosofia para administrar dinheiro durante essas mudanças geopolíticas é saber onde está nosso diferencial, e neutralizar as posições onde não temos nenhum diferencial ao mesmo tempo em que nos certificamos que nossos portfólios estão líquidos (para ser flexíveis) e diversificados (para não ter riscos concentrados). Nosso conselho é que você faça o mesmo”.

 

A caricatura de Donald Trump (acima) foi adaptada de imagens licenciadas (Creative Commons) do photostream de Michael Vadon no flickr.

 
SAIBA MAIS