Depois de mais um trimestre que educadamente pode-se chamar de ‘desafiador’, a Via está apresentando ao mercado seu plano estratégico para 2025 — uma série de iniciativas que buscam “arrumar a casa” para deixar a varejista pronta para voltar a crescer.
A dona das Casas Bahia e do Ponto dividiu o plano em duas frentes: as ações operacionais e outras ligadas à estrutura de capital.
O plano de reestruturação é a primeira grande medida do CEO Renato Franklin, que assumiu a Via em maio depois de uma década à frente da Movida.
“É um plano de revisão completa da estratégia, e tudo começa com a mudança do nosso objetivo,” ele disse ao Brazil Journal. “No ciclo anterior, o objetivo era crescer GMV e expandir a plataforma, com reforço do digital e abertura de novas lojas. Agora, queremos monetizar o que já temos.”
A primeira medida do lado operacional foi a demissão de seis mil pessoas — de um total de 45 mil — o que vai gerar uma economia de R$ 370 milhões/ano.
A segunda foi uma revisão das categorias de mercadorias próprias (1P), com a eliminação de 23 categorias que passarão a ser vendidas apenas no marketplace. Renato disse que essas categorias tinham margens menores no 1P do que no 3P, o que justificou a revisão.
A companhia calcula que isso vai liberar cerca de R$ 150 milhões em estoque e gerar um ganho de R$ 50 milhões no lucro antes dos impostos (LAIR) ao longo dos próximos meses.
A Via também decidiu fechar 50 lojas e colocou outras 50 na UTI, o que significa que elas precisarão passar por um ajuste no custo de aluguel, no estoque e na margem para não terem o mesmo destino. Essa medida vai liberar mais R$ 200 milhões em estoque e gerar um ganho de entre R$ 80 milhões a R$ 150 milhões na LAIR.
Para completar o pacote, a companhia fez uma revisão no seu marketing, saindo do modelo de agência, o que deve gerar uma economia de mais R$ 200 milhões/ano, nas contas do CEO.
Renato disse que todas essas medidas juntas devem gerar um ganho de R$ 1 bilhão no lucro antes dos impostos, levando o resultado para perto do positivo. No primeiro semestre deste ano, o LAIR da Via ficou negativo em R$ 1,4 bilhão.
Na estrutura de capital, a primeira medida vai ser mudar o funding do crediário. Hoje, o funding vem dos bancos, que antecipam o fluxo de caixa do consumidor final para a varejista em troca de juros. Esses créditos — chamados de CDCI — representam hoje cerca de R$ 5 bilhões, quase metade da dívida da companhia.
“O que vamos fazer é passar a colocar o crediário num FIDC, o que vai trazer diversos benefícios,” disse o CFO Élcio Ito. “Além de conseguirmos taxas e condições melhores, porque a qualidade da carteira é muito boa, vamos liberar R$ 5 bilhões em limite bancário que vamos poder usar para outras coisas, por exemplo para refinanciar dívidas de curto prazo.”
Com o funding de mercado, a Via também espera conseguir expandir a concessão do crediário, uma alavanca importante de geração de valor para a empresa.
Renato nota que, além de gerar muito retorno, a oferta de crediário facilita a venda de serviços (como seguros e garantia estendida), que têm uma margem muito boa. “Com o novo modelo de funding, vamos ganhar mais R$ 250 milhões de LAIR com vendas adicionais de crediário e serviços,” disse o CEO.
Outro plano é diversificar suas fontes de financiamento — buscando acessar capital no exterior e com agências de fomento — e continuar trabalhando para monetizar seus créditos fiscais.
O objetivo é monetizar mais R$ 1,25 bi no segundo semestre, a mesma quantia da primeira metade do ano. A companhia também está projetando liberar R$ 1 bi de estoque — parte por conta da saída das 23 categorias do 1P — e gerar mais R$ 500 milhões de caixa por iniciativas como sale and leaseback de lojas.
O plano de reestruturação vem num momento delicado para a varejista — em que rumores de que a companhia poderia estar perto de uma recuperação judicial circulam insistentemente no mercado.
Renato garante que não há a menor possibilidade disso acontecer. A companhia, diz ele, tem R$ 2,8 bilhões de caixa e praticamente nenhum vencimento de dívidas até o final do ano. No segundo e terceiro tri do ano que vem, os vencimentos somam R$ 1,5 bi.
“Meu maior equity é minha carreira, e joguei tudo aqui dentro,” disse o CEO. “Minha visão é que estamos no vale do varejo, do mercado de ações e da companhia. Então o upside que tem pela frente é gigantesco. E o risco de execução é baixo, porque não estamos fazendo nada mirabolante. É um ‘back to the basics’. Vamos fazer o que sabemos fazer bem e o que gera dinheiro.”
No segundo trimestre, a Via manteve seu GMV e receita praticamente estáveis, mas viu uma piora relevante do EBITDA, do lucro antes dos impostos e do lucro líquido.
O EBITDA ajustado caiu 32%, para R$ 469 milhões, em linha com o consenso do mercado (R$ 459 mi).
A LAIR ficou negativa em R$ 843 milhões, enquanto o sellside esperava um prejuízo menor, de R$ 557 mi; e o bottom line veio negativo em R$ 492 milhões, em comparação ao consenso de R$ 328 mi.
A margem bruta também caiu, de 31,4% para 28,4%, basicamente porque a Via foi mais agressiva em promoções no trimestre para começar a limpar o estoque das 23 categorias que ela decidiu parar de vender.