A Globo acaba de anunciar o fechamento do Ego, o principal site de celebridades do país.
Truman Capote certa vez equiparou a cobertura de celebridades à “mais baixa forma de jornalismo”, mas, para desespero dos eruditos, pouca coisa atrai tanta audiência quanto aquilo que fazem e dizem os (frequentemente) nem tão ricos e os (às vezes) nem tão famosos.
Com o Ego, vai-se a plataforma que informou ao mundo que “Chico Buarque compra baguetes para o lanche da tarde” ou ainda que “Grazi Massafera vai ao banheiro durante sessão de filme”. (Já a manchete hors-concours da categoria – “Caetano estaciona o carro no Leblon nesta quinta-feira” – foi obra do portal Terra, mas é frequentemente atribuída ao Ego, uma evidência da força da marca.)
Lançado em 2006, o Ego é um sucesso absoluto de audiência, o que levou muita gente do meio a coçar a cabeça quando a Globo fez o anúncio hoje cedo. Segundo a Globo, o site atraiu no ano passado 13,2 milhões visitantes únicos por mês, que ao todo acessaram mais de 125 milhões de páginas mensalmente. (A título de comparação, a Folha.com teve 150 milhões views mensais, incluindo todas as suas editorias).
Na semana passada, com a final do Big Brother, o Ego chegou a atrair 5 milhões de visitantes em um único só dia.
Se o tráfego não é o problema, teve gente especulando que a dificuldade era monetizá-lo. “O mais provável é que seja a falta de propaganda,” diz um colunista especializado na cobertura de celebridades. “Para esse tipo de jornalismo, a publicidade não é muito forte.”
Isso é verdade, mas o movimento da Globo tem outra motivação.
A Globo disse que irá “concentrar o foco de sua estratégia digital em seu ambiente de vídeo, Globo Play, e nas verticais de conteúdo, Jornalismo, Entretenimento e Esportes, representadas pelos portais G1, Gshow e Globoesporte.com”. Também será descontinuado o Paparazzo, a editoria do Ego que publica ensaios sensuais. As notícias sobre celebridades e sub-celebridades a partir de agora serão publicadas pelo Gshow.
Para executivos de mídia, o fim do Ego é um movimento ensaiado: há pelo menos dois anos que a Globo passou a chamar os telespectadores a acessar G1, Gshow e Globoesporte.
“Eles estão tentando usar a televisão para construir um ativo digital, e organizar por verticais temáticos ajuda a canalizar o tráfego,” diz o executivo de uma empresa de mídia. “Hoje eles têm uma dispersão muito grande porque a Globo tem muitas marcas. O G1 compete com o site do jornal O Globo, e assim por diante.”
Ao organizar o conteúdo ao redor de temas, a Globo abre caminho para, no futuro, unificar as áreas comerciais. Hoje, O Globo tem seu departamento comercial, e o G1 tem outro. No futuro, o mais provável é que um único time de vendas deverá abordar os anunciantes e oferecer todo o tráfego do vertical temático.
Um experimento parecido começou a ser feito na RBS. Desde o início do mês, o esforço comercial do grupo deixou de ser organizado por unidades de negócio — TV, rádio e jornal — para se tornar multiplataforma. Agora, um time unificado de executivos de contas vende publicidade para todos os canais do grupo.
Isso não significa que o jornalismo de fofoca, como o feito pelo Ego, não tenha suas questões freudianas.
Nos últimos anos, esse jornalismo passou a enfrentar uma nova concorrência: os fãs (ou curiosos) podem acompanhar a vida das celebridades pelas redes sociais dos próprios protagonistas – com um tipo de intimidade e acesso que nem o melhor dos jornalistas era capaz de garantir.
As marcas perceberam que era possível eliminar o intermediário também na publicidade. Agora, os famosos aparecem em suas redes – Twitter, Facebook, Instagram ou Snapchat – consumindo os produtos (e embolsando milhões em anúncios).
“Em vez de anunciar num site que tem notícias sobre todo tipo de celebridade, as marcas fazem parceria com as celebridades que têm mais influência com seu público-alvo, com um investimento menor e mais assertivo. É um jeito muito mais eficiente de fazer propaganda”, diz o diretor de uma agência de publicidade voltada para o meio digital.
A Globo pareceu aludir a essa questão no comunicado sobre o fim do Ego. Segundo o grupo, a decisão foi resultado “de uma reflexão sobre a evolução do mercado de notícias de celebridades no Brasil e no mundo e de novas dinâmicas de interação entre artistas e seus fãs pelas redes sociais”.
Na ‘velha mídia’, um outro veículo sinônimo de ‘celebridade’ trocou de mãos recentemente.
No mês passado, a Abril vendeu sua participação de 49% na Editora Caras para a Spring, que edita a revista Rolling Stone no Brasil. O sócio majoritário da Spring, José Roberto Maluf, já tinha 30% do capital votante.
A Editora Caras tem como carro-chefe a publicação que lhe deu o nome — e que é presença garantida nas salas de espera de consultórios médicos e salões de cabeleireiro.
Assim como em todo mercado impresso, a tiragem vem caindo nos últimos anos, mas a Caras ainda é a quarta maior revista semanal do país. Com 260 mil exemplares semanais, está atrás apenas de Veja, Época e Istoé.
Não se deixe enganar: vai-se o Ego, mas a fofoca ainda vende.