São frequentes as queixas de que construímos uma cultura da complacência, piorada pela falta de reconhecimento dos méritos.
Se há um lugar onde a complacência não existe, e que merece nosso reconhecimento público, este lugar é o Insper.
Sonhado por Claudio Haddad e erguido com o apoio de generosos doadores — de coragem, dinheiro, tempo e vida — o Insper está completando 20 anos como um polo de esperança para o empreendedorismo brasileiro na educação superior.
As ideias certas ajudam a transformar seu próprio tempo e moldar o futuro, ainda mais no campo da educação.
Anísio Teixeira (1900-1971), um dos pais da educação básica no Brasil, estudou em Columbia, onde se aproximou de John Dewey (1859-1952), referência histórica na educação americana e uma expressão do pragmatismo que ganharia a Guerra, enfrentaria a Guerra Fria, construiria a maior economia do século, pousaria na Lua — sem falarmos em cinema e jazz.
Anísio, um menino de modestas posses, professor de escola pública e sensível visionário, viu em Dewey os princípios e conceitos que poderiam levar à democracia: permanente ação do cidadão, tendo por base a educação ao alcance de todos, como direito de oportunidade, e não apenas privilégio.
Anísio aprendeu que as ideias, mesmo as promissoras, não se realizam somente por sua formulação. Precisam ser experimentadas e testadas até serem comprovadas. A melhor educação é a que faz de si mesma o seu próprio experimento, ambientado e estimulado por profissionais altamente motivados a ponto de excitar os interesses, acolher a curiosidade e desenhar sua trajetória, chegando a vincular conhecimento e aplicação. Mais que ambiente, para isso é necessário uma ambiência. O ambiente é feito de objetos, a ambiência, de “pessoas e valores que, em seus atos, integram as relações”.
O Insper se tornou essa ambiência, e seu potencial supera, em muito, suas próprias paredes.
A democracia é um tempespaço construído a cada gesto, não dura por si mesma e precisa ser mantida por valores. Só a educação desenvolve e consolida estes valores de maneira suficiente, ainda assim impermanente. É a governança, e não apenas um governo, que viabiliza a permanência. Enquanto repetir os mesmos hábitos é tarefa de gestores, mudar mentalidades é um desafio de estadistas. Se não existem, é porque o sistema não os forma e, quando surgem, os restringe.
No Insper, práticas como transdisciplina, sócio-afetividade, empirismo e indução, modelagem, produção de métodos e conhecimentos aplicáveis, com o necessário alicerce em “hardskills” para galgar “softskills” — e vice versa — denotam uma conquista rara: é na ambiência com que se estimula a aprendizagem como um vivo experimento, que se ensina e se aprende, no convívio, toda a integridade que deseja a educação.
Há de ser gostoso, útil, justo e belo, para que assim seja político e um dia seja público. É assim que verdades sonhadas se tornam realidades construídas. Elas prosseguem, se desdobram, são buscadas porque deram certo e, se mais buscadas, necessitam mais apoio. Conhecer é o primeiro passo desse apoio. Reconhecer o mérito é o segundo. No entanto, não bastam esses primeiros passos, há um terceiro: emocionar-se ao perceber o potencial que ali reside.
Cada vez mais, doadores do Insper proporcionam bolsas a alunos que precisam delas. Já é alguma coisa, mas ainda é pouco.
Faz parte da elegância de quem de fato faz não se auto promover. Num mundo tão ruidoso por tão pouco, essa elegância pode ser ruim ao dificultar que se conheçam, e reconheçam, as boas obras. Se é verdade que todo narcisismo é descarado, o seu excesso, hoje evidente, não pode inibir os eficazes de mostrar as suas conquistas e pedir apoio a elas. Entrevistada sobre sua recente, e ótima, biografia de Freud, Elizabeth Roudinesco comenta que se Freud estivesse vivo não estudaria a histeria, mas o narcisismo.
Enquanto uns fazem barulho e rapinam para si, outros, silentes, contribuem imensamente sem ruído. Desde seu início o Insper, moto próprio, instituiu uma “Comissão Externa de Avaliação”, se expondo integralmente, pedindo sugestões contributivas e acolhendo críticas. Num macro cenário no qual tantos se ocultam temendo julgamentos, o Insper se revela e os solicita. Com isso cresce e ganha autoridade moral, educando pelo exemplo.
Há tempos fala-se em capitalismo sustentável. As ideologias podem debater e combater o quanto quiserem, mas os problemas da vida real seguem os mesmos, e alguns, como o Insper, escolhem resolvê-los.
Volto ao tema das bolsas. Que tal formarmos mais gestores públicos, que jamais esquecerão tê-las recebido, retornando redobrada a confiança merecida? Que tal ajudar a construir uma nação a partir do seu melhor, renunciando o criticismo depressivo em seu crônico desânimo?
Entre muitos (mas que ainda são poucos), Michael Perlman é um dos construtores que comemora esses 20 anos. Há poucos dias, no intervalo da reunião de avaliação, admirados com os números, refletíamos sobre as bolsas.
— Já pensou na quantidade de jovens que poderiam estar aqui? perguntou Michael.
Por piores que pareçam as notícias, há brasileiros preparando o Brasil que desejamos. Cabe a nós ajudar.
José Ernesto Bologna é professor, fundador da Ethos Sharewoods Consultoria e membro da Comissão Externa de Avaliação do Insper.