No mundo do marketing, a regra do jogo sempre foi ‘cada um no seu quadrado.’  Mas num país em recessão e com verbas cada vez mais minúsculas, a criatividade é a última esperança de quem precisa produzir resultado — ou procurar um novo emprego.

Ter ideias de como uma empresa pode ajudar a outra é o intrigante ganha-pão da Cross Networking, que transforma as necessidades de uns na oportunidade de outros.

“As marcas dependem umas das outras, mas não sabem tirar proveito disso,” diz Tatianna Oliva, a CEO da Cross. “O simples ato de tomar um café com leite envolve quatro marcas: a do café, a da xícara, o açúcar e o leite.”

O business da Cross brotou da escassez.  

Tati, como é mais conhecida, trabalhava na organização do Camarote da Brahma no início dos anos 2000. Miguel Patrício, o mitológico diretor de marketing da Ambev, decidiu que as camisetas do camarote precisavam de um ‘up’. O objetivo era melhorar a experiência do convidados e, claro, ainda assim reduzir os custos. Tati recrutou um jovem estilista de nome Amir Slama para desenhar as camisetas.  “Eu sabia que ele era um cara com visão de negócios,” diz ela sobre o fundador da Rosa Chá. 

Tatianna OlivaA parceria saiu: a Ambev sequer colocou a mão no bolso, e Slama se beneficiou do marketing. (A Rosa Chá fez as camisetas por dois anos, seguida da Ellus, Carina Duek, Agua de Coco e outros.)

Um caso clássico foi o das bolachas de chopp — aquelas esferas de papelão usadas que servem como repouso da tulipa.  A Ambev, para variar, estava tentando economizar. Na época, a companhia mandava fabricar 13 milhões de bolachas de chopp por ano, que custavam algo como 3 centavos cada. Tatianna notou o óbvio: um dos lados da bolacha tinha o logo da Brahma; o outro, nada.

“Se eu conseguisse achar uma marca para estar ali, dividindo aquele custo, eu já economizava 50% pra Ambev,” relembra.

Na época, a Piraquê —  marca de biscoitos dominante no Rio — queria uma entrada maior em São Paulo. Tati sentou-se com Alexandre Colombo, um dos herdeiros e diretor de marketing da Piraquê, e propôs a parceria: ‘presuntinho Piraquê com chopp da Brahma: uma combinação perfeita’. 

Tatianna é eficaz porque consegue manter um olhar fresco sobre tudo. Para isso, evita se envolver nas minúcias de cada projeto.  Prefere dar a ideia-mãe para o time, e depois participa de reuniões à medida que os gargalos aparecem.

“Todo canal de venda é uma oportunidade para outra marca, mas às vezes, só um lado vê a inovação.” Seu trabalho é convencer os céticos — e abrir os olhos de quem não quer ver.

Seu cliente mais novo é a Femme, uma rede de laboratórios especializada na saúde da mulher que atende cerca de 20.000 clientes por mês. Tati já vê uma empresa como a Johnson & Johnson oferecendo uma bolsa com amostras de seus produtos femininos (ou da linha bebê) para as mulheres na sala de espera.  “Além de aliviar aquela tensão do exame, o cliente poderia degustar os produtos da Unilever, da Procter ou da Nestlé.”

O Café do Centro — investida do Pátria — está usando a Cross como uma extensão de sua área de trade marketing. Objetivo: penetrar canais de venda que demandam mais do que apenas bom produto e preço. “Alguns canais dependem de networking e abordagem diferenciada.  Não basta dizer pro dono do restaurante que você está apresentando um café ótimo.  Ele vai dizer ‘meu café já é bom’.  Você tem que mostrar para ele como ele vai vender mais café.”

Uma ideia: conquistar redes hoteleiras com cápsulas do café.

Às vezes, a Cross gera valor de forma discreta.  Por exemplo, Tati está aproximando uma tradicional rede de doces de uma marca de leite condensado que quer aumentar seu perfil. A marca vai fornecer o condensado por um preço abaixo do que a doceria paga hoje. Um vai ganhar um novo cliente, o outro vai economizar num de seus insumos mais importantes. (Os detalhes ainda estão sendo cozinhados.)

O repórter pergunta a Tatianna se gerar esse tipo de economias não seria responsabilidade da área de compras da doceria, que deveria fazer uma espécie de orçamento base-zero todo ano.  Ela sentencia: “Qualquer negócio, quando fica grande, deixa escapar oportunidades.”

Tati é uma fábrica de carisma e uma metralhadora de ideias. Seu networking ‘padrão Iguatemi’ também ajuda.  Casada há 16 anos com o empresário José Victor Oliva e mãe de duas filhas, Tati almoça com diretores de marketing e janta com donos de empresas.

Certa vez, a Danone queria aumentar a visibilidade do Dino, o personagem que ilustra a embalagem do Danoninho.  Tati procurou a Faber-Castell para criar um produto ‘co-branded’, o Dino Toy, operando o milagre de migrar a marca Danoninho da gôndola de frios para a de brinquedos.

“O que a gente faz é o menos óbvio, que é exatamente o mais difícil do cliente imaginar.”