O maior ativo da Avianca são seus slots em Congonhas, e o desaparecimento da empresa deve favorecer todos os seus concorrentes, redistribuindo seus 13% de participação de mercado.

É por isso que o leilão – desenhado pelo maior credor da empresa, o fundo Elliott – tem despertado paixões e uma troca de acusações entre os principais players do setor.

Enquanto isso, o querosene está começando a faltar, e a Avianca corre o risco de parar antes do leilão de recuperação judicial, marcado para 7 de maio.

Desde que firmaram um acordo com o Elliott, comprometendo-se a participar do leilão, Latam e GOL já injetaram US$ 13 milhões cada uma para manter a Avianca no ar. Ambas também estão arcando com os custos de acomodar mais de 15 mil passageiros que tiveram seus voos cancelados.

Antes do acordo, quando sua proposta estava na mesa, a Azul também injetou US$ 13 milhões.

Para minimizar sua queima de caixa, a Avianca devolveu 48 de seus 53 aviões desde o fim do ano passado. Só sobraram os voos da Ponte Aérea, Brasília e Salvador.

Se a Avianca parar antes do leilão, os slots serão redistribuídos pela ANAC. Pela regra, Latam, GOL e Azul ficariam com um terço cada uma. A regra também diz que, se aparecer um novo player que não atua no aeroporto, este teria direito a 50% dos slots.

Foi este cenário que a Azul quis evitar quando fez a proposta de US$ 105 milhões para ficar com os ativos da companhia no mês passado.

Para a Azul, arrematar os 268 slots da Avianca em Congonhas – 7,7% do total – seria a grande chance de colocar os dois pés no mercado mais atraente do país.

Hoje a Azul tem 4,9% dos slots de Congonhas mas não voa a Ponte, enquanto a Latam tem 44,6% e a GOL, 42%. Para entrar na Ponte, a Azul diz que precisaria ter frequência e horários de qualidade.

A rota Rio-SP garante margens de 20% para as companhias aéreas – e uma eventual entrada da Azul poderia pressionar um pouco essas margens num primeiro momento.

Mas, no médio e longo prazos, uma eventual entrada da Azul não significaria preços estruturalmente mais baixos. Estudos acadêmicos feitos no Brasil e lá fora mostram que em aeroportos congestionados há um limite para a queda de preços: a tendência é de acomodação.

Para a Azul, a Ponte oferece um outro upside: o acesso ao passageiro business, que tornaria seu programa de fidelidade muito mais atraente.

E, da mesma forma, foi este cenário que Latam e a GOL quiseram evitar quando apoiaram a proposta do Elliott, desta fez fatiando a empresa em sete Unidades Produtivas Isoladas – ampliando a concorrência pelo espólio e as chances de recuperação dos créditos.

A proposta da Azul, ao contrário, dificultava a entrada de novos competidores. A empresa propôs pagar US$ 105 milhões numa espécie de porteira fechada sem dívidas – mas queria descontar o valor dos empréstimos que fizera e faria para manter a empresa operando – o que deixaria os credores a ver navios.

Mas, segundo diversas fontes, seu maior erro estratégico foi não combinar com o Elliott, dono de quase 70% da dívida de R$ 2,7 bilhões, e um parceiro de mais de duas décadas dos Efromovich.

Antes de trazer Latam e GOL para a mesa, o Elliott procurou a Azul: pediu US$ 90 milhões – mas David Neeleman não aceitou. A Azul estava disposta a desembolsar outros US$ 130 milhões (além dos US$ 105 milhões), mas apenas para investir na operação, e não para resgatar o credor.

A postura da Azul não desagradou apenas o Elliott. Na visão dos Efromovich, segundo fontes próximas aos irmãos, Neeleman trabalhou com as empresas de leasing para asfixiar e tirar as aeronaves da Avianca, em um movimento que teria acelerado o pedido de recuperação judicial em dezembro. Duas das aeronaves do lessor BOC que foram retomadas na véspera do pedido de proteção judicial foram parar na frota da Azul, bem como outras 10 retomadas pela GECAS no mês seguinte.

A Azul diz que não é bem assim.

Diz que pediu às empresas de leasing que deixassem os aviões com a Avianca pois estava preparando uma proposta pela empresa – e que quando sua proposta foi descartada, os aviões passaram a ser devolvidos mais rapidamente.

GOL e Latam se comprometeram a apresentar lances mínimos de US$ 70 milhões cada uma por uma UPI da Avianca – sendo que metade desse valor, já adiantado, vai para o Elliott. Por ajudarem a viabilizar o leilão, Latam e GOL terão direito a um taxa de sucesso caso as UPIs sejam vendidas por mais de US$ 70 milhões.

Os interessados podem se habilitar para o leilão até cinco dias antes. Com a Azul sinalizando que está fora da disputa e no cenário provável de nenhum outsider aparecer, GOL e Latam devem ficar com as UPIs.

Se isso acontecer, o resultado será uma concentração ainda maior em Congonhas. GOL e Latam aumentariam sua participação nos slots disponíveis em cerca de três pontos percentuais cada.

A Azul poderia evitar esse cenário arrematando todas as UPIs, mas a empresa não quer pagar o preço de uma disputa lance a lance em que seus competidores não apenas estariam empenhados em barrá-la, como vão lucrar com o ágio que ela vier a pagar. (Parte do ágio ajudaria a pagar o empréstimo que a própria Azul fez para manter a Avianca operando.)

Por isso a Azul segue no jogo, mas aposta em outra estratégia: a de convencer o regulador dos riscos da concentração do mercado para o consumidor. O CADE não se manifestou no processo de Recuperação Judicial, mas emitiu nota técnica alertando sobre possíveis “efeitos extremamente deletérios” ao ambiente concorrencial caso haja uma maior concentração em Congonhas.

O CADE pode levar as empresas a abrir mão de slots adquiridos em leilão? “Seria uma decisão inédita no Brasil, mas muito comum nos EUA”, diz Alessandro Oliveira, professor de economia da aviação no ITA.

Nas fusões de US Airways com American e da United com a Continental, o Departamento de Justiça americano condicionou a aprovação à venda de slots em aeroportos específicos.

 

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