“Nothing in this world can take the place of persistence. Talent will not; nothing is more common than unsuccessful people with talent. Genius will not; unrewarded genius is almost a proverb. Education will not; the world is full of educated derelicts.” — atribuído a Calvin Coolidge (ex-presidente dos EUA)
Em Fome de Poder, o Kroc vivido por Michael Keaton é um vendedor de uma máquina ‘revolucionária’ que permite fazer cinco milkshakes ao mesmo tempo, mas talvez esteja à frente de seu tempo. Ele roda os EUA de carro até se deparar com as filas gigantes em uma pequena lanchonete em San Bernardino, Califórnia, dos irmãos Dick and Mac McDonald — muito educados, talentosos, e que tiveram uma ideia genial.
Cardápio simplificado: só hamburger, batata frita e suco de laranja (depois vieram Coca-Cola e milkshake); tudo preparado seguindo os princípios de uma linha de produção fordista, com uma cozinha milimetricamente planejada para otimizar cada processo. Nada de louças, talheres ou mesa. Vendendo hambúrguer a 15 centavos, os McDonald estavam a um passo de revolucionar os hábitos alimentares da humanidade.

Constantemente tendo suas ideias de crescimento e expansão podadas pelos irmãos McDonald, Kroc conseguiu neutralizá-los ao transformar as franquias num bilionário negócio imobiliário. A McDonald’s Corporation, esta sim fundada por Ray Kroc, tirava (e ainda tira) seu ganha-pão não de royalties ou da venda de hambúrguer, mas alugando imóveis para os franqueados.
Com uma reconstituição iconográfica preciosa de cardápios, logos, embalagens e restaurantes antigos, Fome de Poder, dirigido por John Lee Hancock, é mais um grande filme de uma categoria que começa a surgir nas telonas: biografias não-autorizadas de grandes negócios e seus empreendedores.
Segue a mesma linha de A Rede Social, que aliás, assim como o McDonald’s, tem uma pré-história pouco lisonjeira, já que o Facebook teria nascido a partir de uma ideia roubada de colegas de Mark Zuckerberg em Harvard.
Depois de muita briga, Kroc fecha um acordo para adquirir o negócio dos irmãos por US$ 2,7 milhões (equivalente hoje a US$ 21,8 milhões) e a promessa verbal — nunca cumprida — de lhes repassar 1% dos lucros. Kroc e sua corporação sempre negaram esse acordo, que é retratado no filme e sustentado pelos netos dos McDonald. Estes ainda perdem o direito de usar o próprio sobrenome na loja de San Bernardino, que acabou por fechar as portas depois da inauguração de um novo McDonald’s a poucos metros dali.
Baseado na autobiografia do próprio Kroc (‘Grinding It Out’) e em conversas com os netos de Dick e Mac, o filme passa ao largo das questões de saúde que envolvem o fast food, objeto de outro filme sobre a rede, Super Size Me. Mas ao contrário de Super Size Me, Fome de Poder causou zero impacto na imagem dos arcos dourados.
O foco, como evidencia o título em inglês — The Founder, ou ‘O Fundador’ — é o próprio Kroc e suas práticas negociais.
A história era parcialmente conhecida da comunidade McDonald’s. “A gente sempre soube que os irmãos receberam um milhão de dólares cada um. O que a gente não sabia era do 1%. Mas é a versão dos irmãos.”
O DNA agressivo do fundador continou no sangue da empresa. No Brasil, o McDonald’s quase levou os franqueados à falência no final dos anos 90, quando a desvalorização do Real fez os contratos de financiamento em dólar explodir. Na época, a companhia obrigava os franqueados a tomar uma linha de crédito criada especialmente para eles no BankBoston. Bizarramente, a linha era dolarizada, ainda que toda a receita das lojas fosse em reais. Depois da desvalorização, a empresa ainda foi dura com os franqueados, o que gerou uma grave crise de relacionamento e imagem. No final, o McDonald’s acabou substituindo seu presidente no Brasil e renegociando contratos.
Em 2007, a matriz nos EUA vendeu os negócios da América Latina para os argentinos da Arcos Dorados. Passaram seis anos sem abrir uma loja no Brasil e, mais recentemente, voltaram a crescer. Hoje são 900 lojas e a empresa quer abrir 80 por ano a partir do ano que vem.