Há pelo menos sete anos que a CVM alerta o Governo de que corre o risco de um apagão, resultado de eternas restrições orçamentárias e falta de pessoal.

Agora, esse risco parece estar mais próximo do que nunca de se materializar para o regulador do mercado de capitais.

Na tramitação do Orçamento para 2022, o Congresso reduziu em quase 60% a verba para o Ministério da Economia – a pasta de Paulo Guedes foi a que mais perdeu recursos. Num efeito cascata, o Ministério cortou verbas de todas as entidades vinculadas, entre elas a CVM.

Resultado: este ano, a CVM terá para gastar apenas R$ 12,7 milhões, metade do que havia sido proposto no Orçamento – e que por sua vez já era 40% abaixo do orçamento de 2021.

Este é o chamado orçamento discricionário da autarquia, que paga todos os custos à exceção dos salários. Em outras palavras: a CVM terá apenas R$ 1 milhão por mês para contratar funcionários terceirizados, pagar licenças de computadores e investir em sistemas de informática, entre outros itens de primeira necessidade para um regulador.

“É uma completa desmoralização”, uma fonte próxima à CVM disse ao Brazil Journal.

Num artigo publicado no Valor, Marcelo Trindade, sócio do Trindade Advogados e ex-presidente da CVM,  cita reportagens que atribuem o corte orçamentário a uma retaliação do Congresso ao ministro Paulo Guedes, o que, ele diz, torna ainda mais grave o “desmonte de uma entidade como a CVM por aqueles que deveriam defendê-la,” já que a CVM é um órgão de Estado, não de governo.

Trindade sugere aos agentes de mercado que pagam taxas ao regulador que peçam ao Supremo Tribunal Federal o fim dos “ataques à CVM”, antes que ocorra um desastre que pode afetar a poupança popular.

Para o advogado, se o corte não for revertido, quem for convidado a assumir a presidência da CVM nos próximos meses deveria recusar o convite —  o mandato do atual presidente, Marcelo Barbosa, termina em julho.

No relatório mais recente de supervisão de risco da CVM, Barbosa disse que “o contingenciamento de recursos humanos e financeiros na última década vem aumentando progressiva e continuamente os riscos operacionais dos macroprocessos de supervisão e fiscalização da autarquia.”

Para tentar amenizar os efeitos da falta de pessoal, dois anos atrás a CVM fechou acordos de movimentação temporária de pessoal com o BNDES e o BB Tecnologia e Serviços – um orçamento que também deverá ser reduzido.

A CVM não faz um concurso público desde 2010, no final do Governo Lula.

A autarquia tem 610 vagas aprovadas e, destas, 435 estão preenchidas – o déficit é de 30%. Os primeiros alertas de falta de pessoal foram feitos pelo então presidente Leonardo Pereira, em 2015.

A CVM arrecada recursos de taxas que cobra dos participantes do mercado e também de multas em processos e termos de compromisso, mas… o dinheiro vai para o cofre único da União.

Em 2017, quando revisou a dosimetria de suas penas, a autarquia chegou a propor a criação de um fundo de desenvolvimento do mercado, que ficaria com os recursos dos termos de compromisso e seria administrado pela CVM.

A ideia não vingou – e o dinheiro continua indo para Brasília para depois (talvez) voltar.