Quando saem por São Paulo para distribuir cobertores e roupas para moradores de rua, os voluntários do Aquece SP querem mais do que esquentar o frio: o objetivo é “aquecer a alma, o coração e a cabeça”.
Criado há dois anos como uma campanha do agasalho, o projeto fundado por três amigos de faculdade — Igor Afonso, Yunes Fares e Thomaz Krey — se transformou numa espécie de ponto de apoio para milhares de pessoas que se encontram numa das posições mais vulneráveis (e solitárias) da escala humana.
“O ladrão, as pessoas fogem e tem medo, mas não ignoram. O morador de rua é pior: a maioria das pessoas desvia na rua e trata como se nem existissem,” Yunes disse ao Brazil Journal. “Esse sentimento de invisibilidade é muito duro e é nisso que queremos ajudar. Nosso objetivo é dar visibilidade ao invisível.”
Ainda há, claro, a entrega dos ‘kits’ com roupas, meias, cobertores e alimentos. Mas a ideia da doação é servir mais como um pretexto para se aproximar dos moradores de rua e ganhar confiança, do como um fim por si só.
“O que queremos é bater um papo, escutar a história deles, entender o que estão passando e tentar encontrar outras formas de ajudá-los,” diz Igor. “Quando a gente tá mal a primeira coisa que fazemos é desabafar com um amigo. Essas pessoas muitas vezes não tem ninguém, então esse trabalho de ouvir, dar atenção é o que faz a maior diferença.”
Desde que surgiu, o Aquece SP estima ter ajudado cerca de 6 mil moradores de rua, distribuindo mais de 3 toneladas de cobertores e agasalhos — e dando suporte e carinho. Os números deram um salto este ano: até agora, foram 2 toneladas doadas (mais que o dobro do ano passado) e 4,3 mil pessoas impactadas.
A ajuda parece pequena, mas tem mudado vidas.
Uma delas: a de Kalel, que mora há mais de 15 anos na rua com seus dois filhos — o mais velho com apenas oito anos. Numa das campanhas, o Aquece SP doou um sapato e uma roupa social para Kalel, que se preparava para uma entrevista de emprego.
“Quando encontrei ele de novo, recentemente, ele estava superfeliz e veio me dar um abraço,” diz Igor. “Depois agradeceu a ajuda e contou que tinha conseguido um emprego como ajudante de cozinha.”
O Aquece SP nasceu da experiência dos três amigos com projetos sociais. Eles já participavam de outras ONGs há anos, e queriam fazer mais.
Segundo Igor, os projetos anteriores tinham pouca tração com o público jovem, nenhuma abertura para a inovação e, na maioria das vezes, se resumiam a “doar por doar.”
“Queríamos fazer algo maior. Olho no olho. Que mudasse realmente a vida das pessoas.”
Há alguns meses, o Aquece se juntou com o Abraça, um projeto que atua na comunidade do Areião, em São Bernardo do Campo, dando oficinas e doações para jovens carentes. Agora, os dois estão nos trâmites finais para criar uma ONG que englobe as duas ideias: a “Associação Abraça e Aquece SP”.
O trabalho dos voluntários não se restringe ao inverno, e o projeto funciona durante o ano inteiro. As doações de roupas, cobertores e alimentos podem ser feitas aqui. Para se tornar um voluntário, basta entrar neste link.
“Quando a gente entrega as doações muitos deles falam que nem precisava das roupas, que só o abraço e a conversa já era suficiente,” diz Igor.
Foto: As donas da rua