A Messem e a Faros — dois dos maiores escritórios da XP — desistiram do plano de se tornar uma ‘corretora light’, citando o ônus regulatório da conversão e pavimentando o caminho para que outros AAIs façam o mesmo movimento.
Os dois escritórios — que anunciaram uma fusão em abril e hoje têm R$ 65 bilhões sob custódia — disseram que vão começar a operar sob uma marca única nos próximos meses e focar em crescer seus ativos de forma orgânica e por meio de aquisições.
A reviravolta na estratégia da empresa – rebatizada de Fami Capital – vem em meio a um mercado de capitais moribundo, sorumbático e semi-depressivo, e depois de uma mudança na regulação que passou a permitir a sócios capitalistas investir nos AAIs.
Antes, só os próprios agentes autônomos podiam ser sócios dos escritórios, mas corretoras como XP e BTG fizeram diversos acordos de investimentos envolvendo aportes diretos em seus AAIs – em troca de contratos de exclusividade de longo prazo, mas sem equity – e aportes futuros nas DTVMs a serem constituídas, com XP e BTG tipicamente tornando-se minoritários relevantes destes.
Em maio de 2021, por exemplo, a XP anunciou a compra de 49,9% da futura Messem DTVM. Dias depois, anunciou uma transação pela qual comprou 28% da DTVM da Faros. Nos últimos dias, depois da decisão da Fami de se manter no modelo atual, a XP refez os acordos e recalibrou sua participação no negócio combinado, ficando com um stake entre 30% e 40%.
O acordo da Fami vem semanas depois da Monte Bravo ter obtido junto ao Banco Central sua licença de ‘corretora light’ — ou ‘Participante de Negociação’ (PN), na linguagem técnica — tornando-se o primeiro AAI vinculado à XP a efetivar esse movimento. A EQI, vinculada ao BTG, também conseguiu sua licença dois meses atrás. (As PNs são corretoras plugadas ao backoffice de corretoras plenas, que se responsabilizam pela operação e custódia).
“O tempo vai dizer qual é o modelo vencedor,” Gabriel Leal, o sócio da XP, disse ao Brazil Journal. “Acho que eles [a Monte Bravo] estavam num processo mais avançado e por uma questão cronológica não foi possível voltar atrás.”
Segundo Guilherme Sant’Anna, o diretor de canais da XP, as modelagens da XP mostram que só faz sentido um AAI adotar o modelo de ‘corretora light’ se no futuro ele quiser virar uma corretora full, com todo o backoffice.”
Na XP, há dois outros escritórios — a Blue3 e a Nomos (a fusão da BRA, BS e R5) — que estão em processo de conversão para corretora, aguardando as licenças do BC.
Samy Botsman, o chairman da Fami, disse que a ideia de criar a corretora foi o caminho encontrado para conseguir receber o investimento da XP, dado que a nova regulação da CVM ainda não havia saído.
“Mas quando nos juntamos e vimos a complexidade de montar uma corretora, mesmo sendo light, começamos a repensar,” disse Samy. “Nosso processo estava em fase final no BC, mas quando saiu a legislação acendeu o sinal amarelo e começamos a fazer conta, ver as questões operacionais, fiscais, e calcular todos os riscos,” sem falar numa alíquota de imposto de renda maior, de 40% para as corretoras.
Mauro Silveira, o CEO da Fami, disse que a análise feita pela empresa mostrou que os resultados mais expressivos da corretora só viriam anos adiante. “Com esse modelo, que estamos chamando de ‘AAI turbinado’, já termos um resultado relevante no D+0, e com muito menos complexidade,” disse Mauro.
A Fami está mirando no exemplo da CapTrust, um misto de investment advisor e gestora nos EUA que tem quase US$ 800 bilhões em ativos (US$ 630 bi em AUC, e US$ 115 bi em AUM) e foi recentemente investida por fundos do Carlyle.
“É uma empresa super geradora de caixa e que inspira muito a gente. Por que não adotar esse formato mais leve para buscar crescimento e geração de caixa?” disse Mauro.
O objetivo da Fami é atingir R$ 100 bilhões em AUC até o final do ano que vem. Parte desse crescimento virá de aquisições, particularmente no segmento de multifamily office, que hoje responde por R$ 10 bilhões dos R$ 65 bilhões da custódia da empresa e atende os clientes com mais de R$ 25 milhões em liquidez.
A Fami tem ainda R$ 5 bi em sua assessoria digital e os R$ 50 bi restantes no segmento de alta renda (acima de R$ 1 milhão) e private (acima de R$ 10 milhões).