A Faria Lima passou o dia em agonia com uma matéria da Folha dando conta de que o Governo prepara uma elevação da tributação dos rendimentos de pessoas físicas que ganham acima de R$ 1 milhão ao ano.
Seria o ‘imposto mínimo dos milionários,’ um instrumento tributário para aumentar a carga efetiva dos brasileiros mais ricos, que auferem a maior parte de seus rendimentos em dividendos, lucros de participações acionárias ou aplicações financeiras.
Uma fonte do Governo disse ao Brazil Journal, no entanto, que a medida seria neutra para a arrecadação, e visaria apenas compensar os R$ 35 bilhões necessários para aumentar a faixa de isenção de IR para R$ 5.000 – uma promessa de campanha do Presidente Lula.
“Mas esta é uma de quatro ideias em estudo, e não é uma prioridade neste momento, em que os esforços da Fazenda se concentram em estruturar políticas que assegurem o cumprimento das metas fiscais,” disse a fonte.
Hoje não pagam IR as pessoas que ganham até dois salários mínimos – isto é, R$ 2.824.
Estimativas feitas pelo mercado colocam o custo do aumento da faixa de isenção entre R$ 70 bilhões e R$ 110 bilhões ao ano.
Mas nas contas do Governo, esses números são exagerados: a nova faixa de isenção custaria R$ 35 bilhões/ano.
Outra fonte que acompanha as discussões disse que o aumento da faixa de isenção para R$ 5.000 “não é algo que deve ser feito agora; o plano é construir um caminho para que a promessa se concretize até o final do Governo em 2026.”
O aumento da tributação de quem ganha mais faz parte do projeto de reforma do Imposto de Renda, em que um dos pilares será reduzir a regressividade do sistema – ou seja, reverter a atual situação em que as pessoas que mais ganham são as que proporcionalmente pagam menos IR.
Segundo estimativas da Receita, há cerca de 250 mil pessoas físicas com rendimento anual superior a R$ 1 milhão.
Se a eventual proposta do imposto mínimo for adiante, seria colocada uma tributação adicional de até 15% – e assim reduzir as disparidades hoje existentes em relação a contribuintes em regime da CLT.
Enquanto um trabalhador com carteira assinada paga alíquota de IR de até 27,5%, quem se enquadra no Simples tem um imposto efetivo médio de 6% e quem está no Lucro Presumido desembolsa em torno de 11%.
Para quem paga pelo Lucro Real, raramente a alíquota máxima chega a 35%. (Nos EUA, ela é de 37%, e na Europa costuma passar dos 40%.)
Isso porque a alíquota corporativa máxima no Brasil é de 34%, mas a efetiva é de 20% em razão das deduções legais.
Outra especulação que azedou o humor na Faria Lima e do Leblon foi a de que o Governo poderia adotar algum tipo de ‘exit tax’, para tributar o capital que deixa o País e coibir a fuga de divisas.
Mas a fonte do Governo ouvida pelo Brazil Journal assegurou que não há nada em avaliação nesse sentido.
Nos últimos meses, a Fazenda e o Planejamento vem trabalhando em conjunto para desenhar medidas estruturais que possam reduzir as despesas ao longo do tempo – sobretudo algumas indexadas ao mínimo – e desacelerar o ritmo de avanço nos gastos.
O cardápio de alternativas já foi apresentado ao Presidente Lula, que ainda precisa tomar uma decisão.
Enquanto o Presidente não decide, as expectativas pioram e os juros longos continuam abrindo – na prática, anulando o efeito da Moody’s ter colocado o País a um degrau do investment grade.
No Tesouro Direto, a taxa de juros da NTN-B 2029 subiu para 6,7% – a maior em quase um ano.
Num mercado local cético sobre a convicção de Lula e de boa parte do Governo sobre a necessidade de entregar um superávit fiscal, também fez preço hoje um relatório em que a Eurasia comentou as ameaças de surgirem novas medidas de contabilidade criativa para contornar as restrições orçamentárias.
Para a Eurasia, é improvável que Lula dê apoio a cortes significativos nas despesas.
Segundo a consultoria, em 2025 e 2026 os limites de gastos do arcabouço vão se tornar mais incisivos, em um momento no qual Lula e seus aliados estarão se preparando para uma possível campanha de reeleição. É um embate fadado a ser combatido por Fernando Haddad e sua equipe no esforço de preservar as restrições no lado dos gastos.
“A contabilidade criativa será o risco mais significativo,” disse a Eurasia, num cenário em que o arcabouço poderá ser “formalmente modificado ou perder substância com diversas alterações.”
O ônus de reverter as expectativas continua com o Planalto.