Veículos de imprensa dos EUA estão publicando hoje editoriais em que denunciam os ataques de Donald Trump à mídia e defendem a liberdade de imprensa.
 
As publicações se uniram em resposta a uma campanha organizada pelo The Boston Globe, que disse semana passada que Trump move uma “guerra suja contra a imprensa livre.”
 
“Propomos publicar um editorial em 16 de agosto sobre os perigos do ataque da administração Trump à imprensa e pedimos a outros que se comprometam a publicar seus próprios editoriais na mesma data”, disse o Globe.
 
Na terça-feira, mais de 200 jornais já haviam aderido à campanha; ontem à noite, já eram 350.
 
Fora dos EUA, o The Guardian de Londres escreveu em editorial que “Donald Trump não é o primeiro presidente dos EUA a atacar a imprensa ou a se sentir injustamente tratado por ela. Mas é o primeiro que parece ter uma política calculada e consistente de minar, deslegitimar e até pôr em risco o trabalho da imprensa.”
 
A tentativa de Trump de deslegitimar o papel da imprensa começou ainda na campanha com a frase “fake news” — usada para rotular qualquer matéria que desagradasse ao então candidato. Depois da eleição a coisa escalou, e o Presidente já chegou a dizer a pérola: “O que você está vendo e o que você está lendo não é o que está acontecendo.” 
 
Num comício recente, ele apontou os repórteres cobrindo o evento e disse que eles “apenas inventam estórias”, além de chamar a imprensa de “o inimigo do povo”.
  
O publisher do The New York Times, A.G. Sulzberger, teve uma conversa recente com Trump.  
 
“Eu disse a ele que, embora a frase ‘fake news’ seja falsa e nociva, estou muito mais preocupado com a rotulação de jornalistas como ‘o inimigo do povo’. Eu avisei que esta linguagem inflamatória está contribuindo para o aumento das ameaças contra os jornalistas e levará à violência”.
 
Para Sulzberger, isso é particularmente verdadeiro no exterior, onde os governos estão usando as palavras de Trump como pretexto para reprimir os jornalistas. Ele disse que avisou o presidente que seus ataques estavam “colocando vidas em risco” e “minando os ideais democráticos de nossa nação”.
 
Desde o pós-guerra, os EUA sempre foram referência para as democracias do mundo na observação de valores democráticos — principalmente a liberdade de imrensa.

A tradição vem dos fundadores do país.  Em 1787, Thomas Jefferson escreveu sobre a importância de uma imprensa livre para o controle do governo.  

“Se eu tivesse que decidir entre ter um governo sem jornais ou ter jornais sem governo, eu não hesitaria em um momento em escolher a última opção,” Jefferson disse numa carta.

 
Um texto de Rui Barbosa escrito na Bahia de 1920, “A Imprensa e o dever da verdade”, talvez sirva como a contribuição brasileira a esta preocupação global.
 
“A imprensa é a vista da nação. Por ela é que a nação acompanha o que  lhe passa ao perto e ao longe, enxerga o que lhe malfazem, devassa o que lhe ocultam e tramam, colhe o que lhe sonegam, ou roubam, percebe onde lhe alvejam, ou nodoam, mede o que lhe cerceiam, ou destroem, vela pelo que lhe interessa e se acautela do que a ameaça.

Sem vista mal se vive. Vida sem vista é vida no escuro, vida na soledade, vida no medo, morte em vida: receia de tudo, dependência de todos; rumo à mercê do acaso; a cada passo acidentes, perigos, despenhadeiros. Tal condição do país, onde a publicidade se avariou, e, em vez de ser os olhos, por onde se lhe exerce a visão, ou o cristal que lhe a clareia, é a obscuridade, onde se perde a ruim lente, que lha turva ou a droga maligna, que lha perverte obstando-lhe a noticia da realidade, ou não lha deixando senão adulterada, invertida, enganosa.

Já lhe não era pouco ser o órgão visual da nação. Mas a imprensa, entre os povos livres, não é só o instrumento da vista, não é unicamente o aparelho de ver, a serventia de um só sentido. Participa, nesses organismos coletivos, de quase todas as funções vitais.”