Em dois dias, tudo mudou no mercado.
O imponderável da saúde do Presidente Lula e um Banco Central mais duro do que o previsto estão furando “a bolha do pessimismo exagerado”, acelerando o movimento de descompressão que começou na segunda-feira.
Como se já não sobrassem incertezas, a saúde do Presidente e as consequências políticas de sua enfermidade são o mais novo fator fazendo preço nos ativos brasileiros.
Chega a ser mórbido – mas há uma realidade econômica por trás de um ambiente em que os ativos se valorizam quando o Presidente está na UTI.
O Ibovespa operava em ligeira baixa até pouco antes das 16h30, quando piscou na tela a notícia de que o Presidente passará por um novo procedimento cirúrgico para impedir sangramentos no cérebro.
Instantaneamente, o Ibovespa virou para forte alta de 2%, antes de fechar do pregão em 129.593 pontos, uma valorização de 1,06% e a terceira sessão seguida de ganhos. Ao mesmo tempo, o dólar recuou abaixo de R$ 6 pela primeira vez em duas semanas.
“O mercado vinha devolvendo parte dos prêmios, com a expectativa de uma ação mais firme do Copom. Mas a virada ocorrida às 16h30 foi 100% uma reação à notícia envolvendo a saúde de Lula,” resumiu o estrategista de uma gestora.
Às 19h02, já com o mercado fechado, o Copom deu mais uma paulada nos vendidos: um aumento de 1 ponto na Selic para 12,25% e uma surpresa hawkish que não estava no cenário-base do mercado. O colegiado do BC indicou, em seu comunicado, que deverá fazer “ajustes de mesma magnitude nas próximas duas reuniões.”
Em outras palavras, o BC falou duro e restabeleceu o forward guidance. Agora, se não houver surpresas pelo caminho, a Selic estará em pelo menos 14,25% até 19 de março – uma dose de juros que pode ser suficiente para reverter parte da desancoragem das expectativas de inflação e retirar prêmio da curva de juros.
“O Banco Central está comprando uma credibilidade tremenda nesta transição de Roberto Campos para Gabriel Galípolo,” disse um banqueiro.
Na avaliação do economista-chefe de um banco de investimento, a decisão foi “bastante correta.”
“Estava esperando 100 basis points de aumento, mas não imaginava que iriam dar guidance,” comentou. “Foi muito bom.”
O BC anunciou também que fará dois leilões de linhas de dólares nesta quinta-feira, de até R$ 4 bilhões, com o compromisso de recompra.
Essa tripla conjunção de fatores – Lula no estaleiro, um Copom hawkish e intervenção cambial – deve fechar os prêmios de risco embutidos nos juros futuros.
“As últimas 48 horas podem ter sido um wakeup call. Havia um pessimismo irracional,” disse o diretor de um banco. “O mercado havia entrado em uma espiral inacreditável, com os ativos descontados a níveis semelhantes ou até piores aos da crise de 2015.”
Nas últimas semanas, praticamente todo o sellside havia “capitulado,” disse um gestor, passando a recomendar a venda de ativos brasileiros, incluindo aí os analistas e gestores estrangeiros. “Podemos ver o estouro dessa bolha de pessimismo.”
Banqueiros e gestores disseram ao Brazil Journal que a perspectiva de enfraquecimento nas chances de reeleição de Lula foi o principal gatilho para a liquidação de posições vendidas contra o real e as ações brasileiras nos últimos dias.
A reversão dessas posições pode ganhar força nesta quinta-feira, reagindo às ações incisivas do BC.
“É fato que existe um grau de confiança do mercado muito baixo em relação ao Governo. Mas é uma balela essa história de que estamos em dominância fiscal. De repente só se falava nisso,” comentou o tesoureiro de um dos maiores bancos do País.
Em sua avaliação, o cenário hoje é bem mais confortável do que o vivido na crise de 2015.
“Não existe uma inflação reprimida como havia no Governo Dilma. O câmbio não está reprimido, como estava com as intervenções do Tombini [o então presidente do BC]. Não há defasagem significativa dos combustíveis, e a Petrobras está pagando dividendos,” comentou. “A situação é outra – e a enfermidade do Lula pode ter aberto um alçapão para muita gente no mercado.”
LULANOMICS
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