No fim de 2012, com o Governo Dilma pela metade, Luis Felipe Adaime achava que a economia brasileira ainda passaria anos com baixo crescimento e intervenção do Estado.

Luis Felipe AdaimeAdaime, que já estava há nove anos no mercado financeiro e mais recentemente trabalhava no York Capital, um fundo americano, notou que a maioria das famílias ricas brasileiras estava buscando diversificar seus investimentos, o que queria dizer duas coisas: ‘dolarizar’ parte da carteira, e investir em empresas fora do Brasil. Além disso, grandes investidores americanos e europeus queriam complementar seus investimentos no Brasil com fundos que aplicassem no resto da América Latina.

Com essas duas demandas em mente, em agosto de 2013 Adaime e seus sócios na Newfoundland Capital Management lançaram o Armadillo Fund, que investe em ações de empresas latino-americanas, principalmente no México, Chile, Peru e Colômbia.

Apesar da ideia ser diversificar, o fundo também pode investir no Brasil, mas, hoje, o País está fora da carteira. O motivo: o real sobrevalorizado.

“O real foi das moedas emergentes que menos depreciou ano passado,” diz Adaime. “Ele caiu 11% e, como a gente teve uma inflação de 6,5%, estamos falando de 4,5% de desvalorização real. Para você ter ideia, o peso colombiano caiu 19% com uma inflação de 3,7% [depreciação real de 15,25%], e o peso mexicano depreciou 11,6% com uma inflação de 4% [depreciação real de 7,6%].”

O real é hoje a quarta moeda mais cara do mundo, de acordo com o Big Mac Index, calculado pela The Economist. Para Adaime, “o Brasil só vai ficar barato depois que o dólar bater R$3,10, R$3,20.”

Há fartas evidências empíricas de que o Brasil está caro.

“Se você pega um táxi entre o aeroporto da Cidade do México e o bairro de Polanco, que é tipo o Itaim deles — uma área nobre, onde ficam os bancos — essa corrida fica na casa de 20 dólares. A distância ali é parecida com Itaim-Guarulhos, mas essa corrida em São Paulo custa 165 reais, ou 61 dólares, ou seja, três vezes mais caro.”

No ano passado, de acordo com a Bloomberg, o Armadillo subiu 3,2% em dólar e 16% em reais. Já o índice MSCI Latam, contra o qual o Adaime compete, caiu 15% em dólares. (No Brasil, o índice Bovespa perdeu 2,91% em reais e 13,4% em dólar). O Armadillo esteve nos ‘top 10%’ de um universo de 2.100 fundos com mandatos para investir em países da América Latina em 2014, de acordo com a Bloomberg.

Adaime investe em empresas como a CorpBanca (um banco chileno agora controlado pelo Itaú), a Terpel (a Ultrapar da Colômbia), a Parque Arauco (a BR Malls dos países andinos), e a Alicorp (a Hypermarcas do Peru).

No México, ele mantém uma posição em Terrafina (uma empresa parecida com a BR Properties) e na Gruma (a M Dias Branco de lá).

As viagens de Adaime pela região levaram-no a concluir que, apesar de nosso complexo de superioridade em relação à região, o Brasil ainda tem que comer muita farinha (ou tortilla) para poder se gabar.

“É claro que há muitas empresas com pouca transparência e que não são exemplo pra ninguém, mas no geral, no México, Chile, Colômbia e Peru, o marco regulatório de defesa do minoritário é mais robusto do que aqui,” diz Adaime. “Lá as regras testadas prevalecem, enquanto aqui as empresas às vezes conseguem contorná-las.”

Evidência 1: a forma como o Chile trata seus acionistas minoritários

Em 2012, a Endesa, a multinacional de energia espanhola, queria fazer um mega aumento de capital em sua subsidiária chilena, a Enersis.

A Endesa tentou fazer no Chile exatamente a mesma coisa que o Governo brasileiro fez no aumento de capital da Petrobras de 2010, aquele em que o Governo usou reservas de petróleo em vez de dinheiro. A Endesa propôs uma capitalização em que ela entraria com ativos (cujo valor ele mesmo determinava), enquanto os minoritários da Enersis entrariam com dinheiro vivo — uma disparidade de condições. E mais: assim como o Governo brasileiro na Petrobras de 2010, o controlador se achava no direito de votar na assembleia de acionistas, ignorando o evidente conflito de interesses.

Só que, diferentemente do Brasil, no Chile os fundos de pensão são geridos por profissionais do mercado, e não por nomeação política. Além disso, os fundos de pensão chilenos são gigantes em relação ao tamanho da economia. Seus ativos sob gestão representam 60,7% do PIB chileno, enquanto os fundos brasileiros representam só 12% do PIB no Brasil.

“Lá o Governo está alinhado com o minoritário, porque a aposentadoria da maioria da população depende da aplicação em ações dos fundos de pensão… Resultado: os fundos reclamaram com a CVM de lá. Os ativos que a Endesa queria contribuir para a Enersis, e que ela dizia valer US$ 4,8 bilhões, foram reavaliados em US$ 3,6 bilhões, e eles não permitiram que a Endesa votasse na assembleia. Uma transação que ia diluir os minoritários agressivamente, como foi o caso da Petrobras, acabou sendo justa e positiva para os minoritários.”

Evidência 2: a forma como a Colômbia trata suas estatais

“Nas estatais na Colômbia, os funcionários não são concursados nem têm estabilidade. A Ecopetrol, que é a Petrobras de lá, é livre para contratar e demitir. As estatais são organizadas como empresas privadas, só que o Governo é o acionista controlador. Então, uma situação como essa que vimos na Petrobras, em que os investimentos geraram desperdício e perdas enormes para a empresa, muito dificilmente aconteceria por lá, porque o CEO perderia o emprego na hora.”

Entre 2011 e 2013, o retorno sobre o patrimônio da Ecopetrol foi de cerca de 25%, enquanto o da Petrobras foi de 7,8%.

Evidência 3: a capacidade do México de romper com o passado e fazer reformas

“No México, você tem um problema de corrupção endêmico, mas o País acabou de fazer sete reformas — abriram o mercado de petróleo, reformaram o sistema financeiro para baixar os spreads bancários, mexeram na lei trabalhista para facilitar contratar e demitir, mexeram no setor de telecom para quebrar o monopólio da Telmex, etc.. ,” diz Adaime. “No Brasil, quando é que nós vamos fazer sete reformas?”

ARMADILLO-FUND