A semana vai terminando com a queda vertiginosa de popularidade do presidente. Não deveria surpreender, já que a maior oposição ao novo governo parece ser ele próprio. As seguidas crises auto infligidas pelos recém-eleitos surpreendem e desanimam quem torce pelo País.

O fantasma que ameaça a nova administração, porém, é o seu passado recente — e não me refiro aqui aos escândalos revelados pela imprensa.

A principal agenda do governo é a aprovação da Nova Previdência. O problema, porém, é que suas principais lideranças, no Planalto e no Congresso, foram contra a reforma proposta por Temer, cujos principais aspectos eram bem semelhantes aos da proposta bolsonarista. Foram contra, inclusive, a versão mais suave, relatada pelo deputado Artur Maia. O próprio presidente, deve-se lembrar, omitiu-se durante a tramitação no Congresso e foi evasivo sobre o tema na campanha eleitoral.

Agora, o governo pede que o Legislativo aprove uma reforma ainda mais dura. Compreende-se o constrangimento e a ambiguidade do seu entorno. Afinal, trata-se de renegar o que foi dito há pouco menos de um ano. Para agravar, boa parte da base aliada foi eleita defendendo interesses corporativos de grupos de servidores, os mais afetados pela proposta de reforma.

Mas resta uma razão para mitigar o pessimismo. O centro, o velho centro da política, pode ser acusado de tudo, mas com frequência coloca o interesse do país acima da política pequena.

No primeiro governo Lula, PSDB e DEM estavam na oposição, porém apoiaram diversas medidas propostas pelo Executivo, incluindo a reforma da previdência dos servidores públicos. Ambos ignoraram as disputas típicas do baixo clero e foram na contramão da nossa tradição mesquinha. A velha liderança preferiu cuidar do País em vez de ceder ao oportunismo da retórica populista.

Vale lembrar que, durante o governo FHC, a oposição miúda do PT rejeitava as propostas do Executivo independente do seu mérito. O objetivo era apenas derrotar o governo, mesmo que isso significasse prejudicar o País. O mesmo fez a oposição mesquinha ao governo Temer, o que inclui diversas lideranças do atual governo.

O PT pagou o preço do seu oportunismo no segundo governo Dilma:  a oposição retribuiu a miudeza com que fora tratada, contribuindo para aumentar a recessão avassaladora. Mais uma vez, o País pagou o preço.

A esperança é que, agora, o velho centro da política passe por cima das provocações do baixo clero e que, mais uma vez, apoie uma reforma mais do que atrasada.

O governo demonizou a velha política e se define, contraditoriamente, como “liberal na economia e conservador nos costumes”. Ainda presos na retórica eleitoral, alguns aliados dinamitam pontes ao ignorar o passado recente e se arrogar profetas do novo mundo. Quase tudo o que propõem, porém, foi elaborado pelo governo Temer, aquele mesmo que criticaram com tanta veemência.

Como a roda gira, a aprovação da agenda prioritária do novo governo depende da serenidade dos políticos tradicionais e socialdemocratas, muitos dos quais procuraram viabilizar as reformas de Temer por maiores que fossem suas restrições ao governo. Esses velhos políticos respeitam a divergência e tentam apoiar as medidas benéficas ao País, passando por cima da maledicência agressiva de baixo calão.

Tomara que o Planalto não aliene quem pode impedir a volta da crise e, de quebra, interromper sua própria rápida degradação. É hora de pacificação, reconhecimento de erros do passado e convite à conversa. Melhor deixar as armas na entrada.

Marcos Lisboa é economista.