A família Moll, que controla a Rede D’Or, está se comprometendo a destinar parte de todos os seus eventos de liquidez para o Instituto D’Or, o centro de pesquisa dirigido por um dos herdeiros da família e hoje uma das mais prolíficas fontes de produção científica entre instituições brasileiras.
O anúncio — uma das iniciativas filantrópicas mais robustas na história recente do País — equivale a um ‘match’ que vai dobrar o orçamento do IDOR para R$ 1 bilhão nos próximos dez anos, tornando-o uma das instituições privadas mais bem financiadas do País.
“Não estamos nos comprometendo com um percentual fixo porque o que queremos é cumprir esse mínimo de R$ 1 bilhão,” Jorge Moll Filho, o patriarca da família e controlador da companhia, disse ao Brazil Journal.
O compromisso vem em meio ao sucesso espetacular da Rede D’Or no mercado de capitais, onde a rede de hospitais é avaliada em R$ 140 bilhões e tem sido a principal protagonista da consolidação do setor.
O IDOR já é majoritariamente bancado pela Rede D’Or, que colocou R$ 250 milhões no instituto desde sua fundação e deve aportar outros R$ 500 milhões na próxima década — um aporte que deve ser acompanhado pela família.
A contribuição da família virá de eventos de liquidez futuros, como a venda de ações e recebimento de dividendos, mas inclui também eventos já ocorridos, tais como o R$ 1,7 bilhão que os Moll levantaram no IPO e outros R$ 700 milhões no follow-on do mês passado.
O IDOR foi fundado em 2010 depois que Moll quis atrair de volta para o Brasil um de seus filhos, Jorge Moll Neto, o “Gito”, que havia feito seu pós-doutorado em neurociência no National Institutes of Health (NIH). A mulher de Gito, Fernanda, também é médica e neurocientista, e hoje preside o instituto.
De lá para cá, o IDOR se tornou a instituição privada de pesquisa que mais publica internacionalmente entre seus pares brasileiros: seus mais de 100 PhDs acumulam mais de 16 mil citações em revistas científicas como Nature e Science, e publicaram 300 artigos só no ano passado.
O instituto também oferece doutorado, pós-doutorado e cursos de extensão.
Desde que foi fundado, o IDOR criou um histórico forte em neurociência, mas suas linhas de pesquisa vão da cardiologia à oncologia, e da radiologia à medicina intensiva.
A biologia molecular — uma área transversal a todas — também tem ganhado relevância. Com a pandemia, o IDOR abriu 10 linhas de pesquisa sobre a covid para estudar a biologia dos vírus, algo que não fazia antes.
“Não nos furtamos a resolver os problemas do dia-a-dia, mas focamos nos avanços científicos de longo prazo, naquelas apostas que parecem muito abstratas,” diz Gito, hoje um pesquisador visitante em Stanford. “Essa pesquisa ‘curiosity-based’ é o que mais falta no Brasil porque ela é muito arriscada. É por isso que esse apoio que temos recebido da empresa e da família tem sido tão importante.”
O IDOR sempre trabalhou de mãos dadas com a universidade. “Nunca tivemos a pretensão de substituir a universidade, até porque o sistema vigente é muito robusto, mas procuramos cada vez mais fazer perguntas mais ousadas e expandir os horizontes de forma complementar,” diz Gito.
Com o orçamento fortalecido pela doação da família, Gito diz que o IDOR “vai buscar brasileiros que estão fazendo pesquisas fora do País, bem como financiar quem está no Brasil e quer fazer pesquisa fora. A gente sabe que a internacionalização da ciência é fundamental, e estamos fechando acordos com diversas universidades estrangeiras.”
O grande prêmio: fazer um Nobel de medicina surgir no Brasil.
Um breakthrough do IDOR foram as descobertas de seus cientistas sobre o vírus zika no pico da epidemia de 2015 a 2016.
“As mulheres do Nordeste começaram a ver seus filhos nascendo com microcefalia, e ninguém sabia de onde aquilo vinha… a situação foi tão dramática que muitas mulheres não estavam mais querendo engravidar,” lembra Gito.
Trabalhando com outras instituições, os pesquisadores do IDOR conseguiram pela primeira vez compreender o papel do vírus na malformação do sistema nervoso fetal.
A concepção de filantropia dos Moll é baseada na tese do livro The Prosperity Paradox, de Clayton Christensen: em vez de jogar dinheiro num problema aparente, é mais eficaz atacar suas causas-raízes por meio da inovação.
O compromisso com o IDOR é o primeiro que reúne toda a família ao redor de uma mesma causa — ainda que cada membro faça doações particulares para outras entidades.
“A gente concluiu que a família consegue fazer mais diferença na pesquisa e na ciência, e decidimos que, se fizermos juntos, conseguimos fazer com escala,” disse Paulo Moll, irmão de Gito e CEO da companhia.
Curiosamente, o pós-doutorado de Gito foi sobre as chamadas ‘emoções morais’ e altruísmo, que incluem a reação do cérebro humano ao ato de doar.
A descoberta: ao fazer doações, o ser humano ativa a mesma área do cérebro que é ativada em atividades de prazer, como o sexo e as drogas. Mas no caso da filantropia, o prazer é coletivo — e pode durar para sempre.