SEATTLE – A Amazon Web Services entrou em operação em 2006 para atender às necessidades de armazenamento e processamento de dados da própria Amazon – mas de lá pra cá, tornou-se o maior serviço de nuvem do mundo, dona de 30% do mercado e tendo como clientes gigantes da economia global.
Agora, a empresa está sendo catapultada pela inteligência artificial. No último tri, faturou US$ 33 bilhões, 20% a mais que no ano anterior.
Dois anos atrás a companhia abriu um centro de inovação em AI para ajudar seus clientes a criar soluções e implantar recursos usando a nova tecnologia – e quem saiu na frente já colhe resultados.
“O valor que as empresas e as organizações do setor público obterão ao longo do tempo é imenso. Isso é um fato,” Sri Elaprolu, o diretor do centro de inovação, disse ao Brazil Journal. Para ele, isso justifica os trilhões de dólares previstos em investimentos na infraestrutura de computação nos próximos anos.
Na entrevista abaixo, o executivo fala sobre como vencer a frustração de algumas empresas de não saber como aplicar a nova tecnologia, e lista exemplos de grandes empresas – inclusive do Brasil – que já estão obtendo resultados expressivos.
Muitas empresas seguem relutantes em abraçar a inteligência artificial, outras relatam frustração com os resultados alcançados até agora. A AI vale de fato todo esse investimento maciço que tem sido feito em escala global?
Estamos trabalhando ao lado de milhares de clientes em todo o mundo, muitos no Brasil. Há algumas lições que aprendemos ao longo desses projetos.
No início, houve muita empolgação. As pessoas querem trabalhar com AI generativa porque é o tema do momento, sem realmente refletir sobre as questões centrais: qual problema estamos resolvendo, qual o resultado esperado, como vamos operar a solução em produção e como vamos mantê-la em funcionamento.
Havia muitos projetos e experimentos sendo realizados sem uma análise completa do valor que se desejava gerar. Isso foi em 2023.

O que aprendemos desde então é que existem algumas coisas fundamentais que você precisa acertar.
Não há dúvida de que a AI generativa e a AI agente são algumas das tecnologias mais fundamentalmente transformadoras que já tivemos.
Pela nossa experiência interna na Amazon, nossa filosofia de trabalho começa com o resultado em mente. Não comece a rodar um modelo ou uma tecnologia e tente fazer algo com isso sem saber ao certo o motivo. Concentre-se no resultado de negócios que deseja alcançar.
Talvez você queira aumentar a receita, talvez queira reduzir o tempo de lançamento de um produto no mercado, talvez você atue no setor farmacêutico e queira acelerar a pesquisa e a inovação. Talvez você trabalhe no setor de serviços financeiros, como a Nasdaq, e queira aumentar sua capacidade de monitoramento para identificar problemas mais rapidamente.
Ou digamos que você esteja na DoorDash (aplicativo de entrega de comida mais popular dos EUA) e queira melhorar a experiência do seu cliente. Esse é o resultado desejado.
Comece definindo qual o resultado que você deseja alcançar. Escolha casos de uso de alto impacto e valor para o seu negócio. Não use nenhuma tecnologia específica ainda. Esse é o primeiro passo.
Em seguida, você define como vai medir a solução que construir. Como vai avaliar se ela atingiu o objetivo? Se você não tiver critérios de sucesso definidos, é muito improvável que o projeto tenha futuro.
Defina os casos de uso, os critérios de sucesso, tenha um plano de desenvolvimento, mas também teste no mundo real. Não teste em laboratório apenas, pois isso pode gerar falsos positivos.
Terceiro, certifique-se de ter um plano para escalar a produção. Esse é provavelmente um dos problemas fundamentais que vemos com clientes que não iniciam a produção: eles têm bons projetos-piloto, mas não sabem como escalar.
Eles não pensaram em segurança, não pensaram em custos, não pensaram em dores de cabeça operacionais, em requisitos operacionais. Eles não pensaram nisso.
Por último, aí sim entra o fornecimento de recursos tecnológicos.
Vemos muito entusiasmo em realizar projetos e experimentos, mas é preciso pensar nisso como um projeto completo, do início ao fim, que entra em produção e precisa, de fato, ser escalável e gerar valor para o negócio.
Ao aplicarmos essa filosofia desde o primeiro dia, o que temos observado é que a taxa de conversão ou sucesso do trabalho que realizamos com os clientes, entrando em produção neste ano, já atingiu 65% e continua crescendo.
Como medir os resultados para se chegar a um número, como esses 65%?
Vou te dar um exemplo do DoorDash.
Eles querem melhorar a experiência do cliente. Nós dizemos: “Ok, aqui está como devemos medir, esse é o valor que queremos gerar”.
E então começamos a construir uma solução. Assim que ela for testada e estiver pronta, a empresa a aplica em situações reais e começa a monitorar o valor que está gerando.
Você então está implementado no mundo real, para gerar resultados reais de negócios e você está vendo o retorno do investimento. Isso representa 65%.
Em alguns casos, o resultado vem em até 45 dias. Não são meses. Da ideia à produção em 45 dias.
É aí que vemos que, se você fizer as coisas certas, focando em casos de uso de alto valor alinhados às necessidades do negócio, definindo claramente o que é sucesso, alocando recursos de forma clara e identificando os recursos necessários, tanto financeiros quanto humanos e de tempo, você pode gerar muito valor de produção a partir disso.
Quais setores estão mais aptos e mais preparados para adotar essas inovações?
Uma das características da AI generativa é a sua aplicabilidade em todos os setores. É possível, de fato, obter valor em qualquer indústria.
Mas as áreas onde vemos muito mais atividade neste momento são as de serviços financeiros.
A razão para isso é que os serviços financeiros sempre utilizaram machine learning, seja para detecção de fraudes ou para outros fins. Eles estão familiarizados com isso. Portanto, para eles, a transição para a AI de última geração é uma evolução mais fácil.
Poderia dar exemplos no Brasil?
O iFood, no setor de entrega de comida, utilizava machine learning para recomendar pratos aos seus clientes e auxiliá-los na escolha da comida. Com a AI generativa, eles aprimoraram essa experiência significativamente, permitindo que os clientes façam pedidos e recebam recomendações personalizadas sobre qual seria o prato ou a combinação ideal para o seu pedido.
Para os restaurantes, é uma oportunidade para aumentar as vendas e a taxa de cliques, o que é um bom resultado para todos os envolvidos.
No Itaú, eles estão trabalhando conosco em diversas áreas de AI generativa. Podem recomendar os melhores produtos de investimento para maximizar resultados. Se eu conseguir fazer isso, a taxa de cliques aumenta. Consequentemente, as taxas de conversão também aumentam. Assim, o cliente obtém mais valor e banco também como consequência
Você não será apresentado a dezenas de produtos que não lhe interessa, certo? Portanto, trata-se de personalizar essa experiência para que o valor aumente tanto para os clientes quanto para a instituição.
Outro exemplo é o Mercado Livre. Eles atendem muitos vendedores terceirizados.
Grandes empresas podem montar suas próprias equipes de machine learning e desenvolver recursos por conta própria. O que o Mercado Livre fez foi lançar um produto chamado GenAds para vendedores menores, que podem criar anúncios online e informações de produtos muito mais atraentes e realistas.
Assim, conseguem aumentar em 25% a taxa de cliques – o que se traduz em um valor enorme, para um pequeno vendedor.
Além da experiência do cliente, quais as áreas em que a AI pode ter maior impacto? No fluxo interno de trabalho das empresas, por exemplo?
Existem quatro áreas onde vemos aplicações mais significativas.
Em primeiro lugar, vem a experiência do cliente. É uma área enorme. Se você é cliente de um banco, não quer que eu ligue todos os dias para lhe vender algo. Queremos que a experiência seja melhorada.
Em segundo lugar, está a eficiência interna. Ou seja, melhorar a forma como faço as coisas. Então, voltando ao exemplo da Nasdaq, se eu conseguir aprimorar minha capacidade de monitoramento de mercado, isso será bom para os clientes e, mais importante ainda, será bom para mim.
Se estou em uma montadora de veículos, posso obter uma melhoria na detecção de defeitos. Portanto, a eficiência interna também é uma área importante.
A próxima área aborda tudo relacionado ao desenvolvimento de software. Uma das áreas em que a AI generativa se destaca é a programação.
Se eu quiser desenvolver uma nova funcionalidade ou um novo produto, antes de escrever qualquer coisa, quero começar a experimentar com a ideia.
Você já deve ter ouvido falar de coisas como vibe coding. É um método iterativo no qual uso linguagem simples para descrever o que quero fazer e ver o produto sendo construído em tempo real. Todo o ciclo de vida do desenvolvimento de software está sendo repensado.
A última área seria a de novos produtos, novas funcionalidades que não eram viáveis antes, onde se pode inovar.
Se você atua no setor farmacêutico, a quantidade de pesquisa necessária para lançar um novo medicamento é enorme.
Se eu puder reduzir esse tempo usando AI para me auxiliar na pesquisa será bom para mim como empresa, mas também para o mundo todo. Poderei levar medicamentos adequados ao mercado de forma mais rápida e com um melhor custo-benefício.
O que vem a seguir? Quais serão as novas frentes da AI?
A capacidade de raciocínio nos permite avançar para o próximo nível, que é a automação por meio de agentes.
Se analisarmos os últimos dois anos e meio, principalmente o primeiro ano, vimos o surgimento da AI generativa, dos grandes modelos de aprendizado, os LLMs. Os últimos meses foram marcados pela entrada em atuação dos agentes. Acreditamos que 2026 será um ano de grande implantação e adoção da AI generativa nesse novo nível.
Podemos imaginar que o trabalho administrativo poderá, em larga escala, ser totalmente automatizado.
E a chamada AI física, como os robôs humanóides. Será uma realidade para breve?
Isso está começando a ganhar força agora, com a AI sendo incorporada à robótica.
Lançamos recentemente um programa de bolsas de AI física. Estamos trabalhando com oito startups, em colaboração com a Nvidia e a MassRobotics, para entender casos de uso no mundo real.
Se você pensar no que a Amazon já faz no setor de robótica, verá que existem muitas aplicações para a AI física. Podemos imaginar isso no setor automotivo. Podemos imaginar no setor industrial e de manufatura.
As empresas estão fazendo investimentos de capital gigantescos para a construção da infraestrutura de AI. É necessário todo esse dinheiro?
Do ponto de vista da AWS, a AI é sem dúvida a maior transformação pela qual já passamos e pela qual ainda passaremos. Não há dúvidas.
O valor que as empresas e as organizações do setor público obterão ao longo do tempo é imenso. Isso é um fato. Há consenso geral de que será uma grande transformação.
A questão é como fazer isso acontecer de forma eficaz.
Há muito espaço para inovação nos data centers – tanto na otimização do uso como no desenvolvimento de hardware. Cada chip mais eficiente em consumo de energia que conseguirmos lançar no mercado será benéfico para todo o setor. E também para todos os nossos clientes.











