Em menos de um ano, os recursos de inteligência artificial generativa – ou GenAI, em inglês – deixaram de ser mera experimentação e já vão ganhando escala e impactando os resultados das empresas.
“Esse é o ponto de inflexão que estamos vendo ocorrer neste exato momento,” disse Francessca Vasquez, vice-presidente para serviços profissionais da Amazon Web Services e líder do Centro de Inovação em IA Generativa da empresa. Ela falou com o Brazil Journal durante uma visita a São Paulo.
Na conversa, a executiva comentou como alguns setores já começam a ser afetados diretamente pelas novas ferramentas de IA e como as companhias estão se preparando para essa transformação. Falou ainda sobre a relevância do investimento de US$ 4 bilhões feito pela Amazon na Anthropic – a concorrente direta da OpenAI.
O avanço da IA contribuiu para o aumento de 13% no faturamento da AWS, a líder mundial nos serviços de nuvem, em 2023. As vendas alcançaram US$ 90,8 bilhões, trazendo um lucro operacional de US$ 24,6 bilhões.
Francessca adiantou ao Brazil Journal uma novidade que será anunciada oficialmente em breve: a AWS terá em operação no Brasil um Centro de Inovação em IA Generativa, o programa da empresa para desenvolver soluções ao lado de seus clientes.
“Ainda não posso dar todos os detalhes, mas é algo para este ano,” afirmou a executiva. “Vamos acelerar o Brasil. Os clientes nos pediram isso.”
A seguir, os principais trechos da entrevista.
Como as aplicações comerciais de IA evoluíram no último ano e o que esperar nos próximos meses?
Há um ano, o que víamos era uma série de empresas fazendo as primeiras experimentações com a IA generativa. Elas estavam construindo chat bots, buscas inteligentes e coisas do tipo.
Agora já vemos organizações que já empregam algum tipo de IA generativa para operar volumes crescentes de ‘carga de trabalho’ (workload).
Esse é o ponto de inflexão que estamos vendo ocorrer neste exato momento. Não se trata mais de projetos ou programas-piloto.
Há aplicações em áreas como a experiência do cliente e gerenciamento de informações. Nos serviços financeiros, vemos o uso efetivo na detecção de fraudes.
Um campo promissor para essas ferramentas é a área de saúde, como na descoberta de medicamentos e análise clínica.
Já há impactos mensuráveis?
Estamos começando a ver alguns resultados.
Uma empresa do setor aéreo, por exemplo, conseguiu um crescimento expressivo de receita apenas com base na melhoria de sua pontuação na avaliação dos clientes medida pelo NPS (Net Promoter Score). A IA generativa ajudou a proporcionar uma experiência personalizada muito mais efetiva para os usuários.
Como as empresas devem se preparar para essa nova era da tecnologia?
Elas precisam entender que nem todos os investimentos em tecnologia feitos nos últimos anos serão jogados fora. É preciso construir a partir do que existe, muitas vezes.
Um ponto inegociável é a segurança de dados. Podemos entender isso também como uso responsável da inteligência artificial.
Pela nossa experiência, empresas com histórico de boa gestão da sua base de dados tendem a ser mais rápidas em obter resultados positivos com a IA em seus negócios. Não conheci até hoje uma grande empresa que não acredite que os dados sejam, ao lado das pessoas, o seu ativo mais importante.
Em nossa plataforma, temos aprimorado os recursos que chamamos de guardrails. Também temos contribuído para ajudar os clientes a desenvolverem suas iniciativas responsáveis de IA.
Isso envolve ter modelos de IA mais precisos, com resultados de qualidade e menos ‘alucinações’ com os dados.
A AWS fez recentemente um investimento expressivo na Anthropic. Qual a importância dele no posicionamento da AWS em relação aos concorrentes?
Temos o nosso modelo base de IA proprietário, o Titan, que estamos desenvolvendo há alguns anos. Mas oferecemos uma série de outros modelos de nossos parceiros.
A Anthropic, que desenvolveu o modelo Claude, é uma entre várias empresas que apoiamos.
Devo dizer que, dos muitos projetos que vimos em nosso centro de inovação em IA generativa, 90% deles foram implantados usando alguma versão do Claude.
Os modelos da Anthropic fornecem níveis aprimorados de segurança. Suportam recursos multimodais, de texto, voz e imagem.
Velocidade é algo muito importante quando você trabalha com grandes quantidades de dados, e os modelos da Anthropic lidam com isso de maneira eficiente, reduzindo a latência.
Portanto, estamos entusiasmados com o nosso investimento de US$ 4 bilhões na companhia.
Mas também oferecemos em nossa plataforma suporte para outros modelos, como o Llama, da Meta, além dos modelos da Mistral, da A21 Labs, da Cohere.
Cada um desses modelos pode ser ajustado e se adaptar a necessidades específicas dos clientes.
Uma das grandes preocupações com relação ao investimento em data centers é o elevado consumo de energia. Como a AWS tem se preparado para que isso não seja um obstáculo? A empresa conseguirá alcançar o objetivo de ser net zero até 2040?
Temos essa meta, que foi antecipada em dez anos em relação ao objetivo original de sermos carbono neutro até 2050, e estamos no caminho de alcançá-la.
Acabamos de anunciar uma parceria com uma usina nuclear e continuamos adicionando fontes de energia limpa à nossa infraestrutura global.
A propósito, esse investimento em redução da pegada de carbono é algo que também ajuda reduzir os custos dos data centers.
A disponibilidade de chips mais avançados para os sistemas de IA generativa vinha sendo um gargalo. A oferta já se equilibrou?
Tivemos sim restrições, particularmente em GPUs (unidades de processamento gráfico). A oferta estava muito apertada, mas agora já houve uma melhora.
As cargas de trabalho ainda estão concentradas em treinamento de IA. Quando tivermos mais carga em inferência (a aplicação dos modelos de IA na produção de resultados) aí precisaremos de fato ficar atentos.
Desenvolvemos os nossos próprios chips e mantemos parcerias com grandes fornecedores, entre eles a Nvidia. Estamos trabalhando com eles na construção de um dos maiores supercomputadores do mundo.