Se você circula pelo Itaim, já começou a desviar das patinetes que cortam a ciclofaixa da Faria Lima e as calçadas estreitas da região ou já subiu em uma delas para chegar mais rápido naquela reunião a algumas quadras.

É melhor redobrar a atenção.

Nas próximas semanas, a Ride que se fundiu recentemente com a mexicana Grin vai inundar as ruas de São Paulo com quase mil scooters, aumentando em dez vezes seu volume atual, num mercado onde a concorrência promete ser brutal e no qual a velocidade de expansão deve ser um dos fatores decisivos para o sucesso.

A Yellow, que conta hoje com quase 200 scooters, também tem grandes ambições: quer chegar a pelo menos cinco cidades no País até o fim de dezembro e vai abrir em julho uma fábrica própria de patinetes que deve garantir uma redução expressiva de custos e, ainda mais importante, uma maior agilidade na expansão.

Os investimentos das duas startups, que desbravaram praticamentes juntas o mercado brasileiro de e-scooters, vem num momento em que a América do Sul entra de vez no radar dos grandes players globais: a Lime e a Bird ambas com valuations de mais de US$ 1 bilhão e presença em mais de 100 cidades já estão começando a operar no México e em discussões com a Prefeitura de São Paulo para obter uma licença e começar a atuar também por aqui, fontes do mercado disseram ao Brazil Journal.

Em comparação com o bike sharing, a expansão das scooters é um pouco mais complexa e lenta. Em diversas cidades, como é o caso de São Paulo, as patinetes não são classificadas como veículos, e portanto só podem ser usadas em ciclofaixas, ciclovias ou na calçada o que limita o perímetro possível de atuação.

Mas o business traz algumas vantagens: a curva de adoção é muito rápida e as patinetes se pagam num espaço mais curto de tempo em comparação com as bikes. Em pouco mais de 12 meses de vida, a Bird e Lime já fizeram mais de 10 milhões de viagens cada uma em todo o mundo.

“As pessoas se interessam pelas scooters, porque elas resolvem um problema fundamental: a falta de opções de mobilidade, principalmente em cidades grandes e caóticas como São Paulo”, diz Paula Nader, sócia da Ride junto com Marcelo Loureiro e Guilherme Freire.

Segundo ela, as patinetes e bikes não competem entre si: enquanto as bicicletas são usadas mais para o first e last mile, o uso mais intenso das scooters é no meio do dia, por exemplo, para se locomover para almoçar ou percorrer curtas distâncias.

As duas empresas estão capitalizadas e prontas para ganhar território.

Um pouco antes da fusão com a Ride, a Grin fechou uma rodada de US$ 45 milhões e deve fazer uma nova captação de recursos até o fim deste ano; já a Yellow, que também atua com o compartilhamento de bikes, levantou US$ 63 milhões há dois meses, no maior ‘Series A’ do venture capital da América Latina.

Além de São Paulo, a Grin já atua na Cidade do México, Bogotá, Guadalajara e está entrando agora em Florianópolis (por enquanto num teste com a prefeitura); a Yellow está em São Paulo e começou a operar no Rio de Janeiro ontem. 

Hoje, a Tembici, empresa que opera as bikes do Itaú, anunciou que vai lançar semana que vem um serviço de scooters elétricas no Rio, em parceria com a Petrobrás. A meta é que até o final de janeiro 500 patinetes da marca estejam em operação. 

A Ride foi fundada em fevereiro deste ano por Loureiro, que morou os últimos dez anos em Santa Mônica, na Califórnia, onde fundou uma startup de bike-sharing peer-to-peer chamada Spinlister (na plataforma, os donos de bicicletas podem alugar suas bikes para outras pessoas). Foi lá que ele viu nascer o mercado de e-scooters.

A Ride começou a funcionar de fato seis meses depois de sua fundação e foi a primeira a lançar o serviço no Brasil. (A Yellow lançou as patinetes num estágio beta na mesma época, mas só deu escala neste mês; e a Scoo, um player menor que também opera por aqui, inaugurou o serviço algumas semanas depois).

A fusão com a mexicana Grin veio apenas dois meses depois da Ride colocar as patinetes na rua. Além de criar um player com atuação maior na América Latina, capilaridade e capacidade para se expandir em outros países e regiões, o casamento faz sentido por causa do supply chain – um dos pontos mais sensíveis do mercado das patinetes elétricas.

Antes da fusão, a brasileira produzia as patinetes numa fábrica terceirizada. Agora, todas as scooters são compradas da chinesa Segway, a mesma que produz para a Lime e a Bird.

Assim como os concorrentes, a Ride (que adotou agora o nome da Grin), opera num modelo conhecido como ‘dockless’: o usuário desbloqueia e aluga a scooter com um aplicativo, usa pelo tempo que quiser e depois deixa a patinete em algum ponto de estacionamento dentro da área de cobertura.

No Brasil, a regulação ainda não permite operar no modelo chamado de ‘free float’, no qual as patinetes podem ser deixadas em qualquer lugar da cidade, mas já há discussões nesse sentido.

A Grin conta hoje com mais de 50 pontos comerciais parceiros em São Paulo, entre lojas de rua, bares e lanchonetes; a Yellow já tem cerca de 100.

Para usar as patinetes, a Grin cobra R$ 2 para desbloquear e mais R$ 2 por cada bloco de cinco minutos, sendo que os dois primeiros minutos são de graça.

Para ganhar escala nas quatro cidades em que já opera, uma das apostas da Grin é uma parceria estratégica fechada recentemente com a Rappi, o app de multidelivery. Pela parceria, os usuários da Rappi podem desbloquear as patinetes com o aplicativo (e num primeiro momento ganham passeios gratuitos pagos por ela).

Hoje, a Grin já conta com mais de 100 mil usuários nas quatro cidades em que atua (ela não abre o número individualmente). Em termos de patinetes, a meta é chegar a 10 mil nas quatro regiões já nas próximas semanas.

Apesar de ter se inspirado na Lime e Bird, a Grin quer seguir um caminho diferente das precursoras do setor, que começaram a atuar à revelia do poder público.

A falta de diálogo já trouxe problemas para as americanas: em maio, todas as companhias de scooters foram banidas de São Francisco e a cidade abriu um processo para obtenção de uma licença limitando o acesso a só duas empresas (a Lime e a Bird ficaram de fora).

Nader admite que a entrada de novos competidores globais deve mudar a dinâmica do mercado brasileiro, que ainda está engatinhando.

Mas a empreendedora, que antes de subir nas patinetes era CMO do Santander, está otimista com as perspectivas para a empresa e o mercado: “Somos agora um player latino americano. E o sucesso do negócio pode ter muita relação com fôlego de investimentos, mas tem a ver também com capacidade de execução e conhecimento do mercado local.”

SAIBA MAIS:

Por que as verdinhas estão indo para a Yellow