E se o Fed der uma pancada nos juros seguindo o script da era Volcker?

Num relatório publicado hoje, o Credit Suisse se debruçou sobre as consequências para a inflação e o crescimento no Brasil de um aperto monetário mais duro nos EUA – um cenário que os mercados começaram a precificar nos últimos dias.

Até muito recentemente, o consenso era que os emergentes mais adiantados no ciclo de aperto monetário – como o Brasil, onde a Selic já foi de 2% para 11,75% – estariam blindados de uma alta de juros nos EUA. O Real se beneficiou muito dessa visão: afinal, com as commodities em alta e o diferencial de juros em um dos mais elevados níveis históricos, os fundamentos justificavam um câmbio mais apreciado.

Mas para a economista-chefe do Credit Suisse, Solange Srour, essa era uma visão baseada em um aperto moderado dos juros americanos, e não para qualquer grau de aperto.

Os impactos de um ciclo de aperto mais forte nos EUA sobre os mercados emergentes são conhecidos: o menor diferencial entre as taxas de juros dos emergentes em relação ao EUA leva a uma depreciação das moedas em relação ao dólar, um aumento na inflação ao consumidor e um redução no crescimento econômico (como consequência da menor poder de compra e do aperto monetário).

Para o Brasil, o CS estima que a cada aumento de 100 pontos-base na Fed Funds haveria os seguintes impactos quantitativos:

i) uma depreciação da taxa de câmbio real de 8% no primeiro trimestre depois da alta;

ii) um aumento da inflação em 0,4 ponto percentual ao longo de oito trimestres;

iii) uma redução de 0,2 pontos percentuais do crescimento do PIB em relação ao trimestre anterior ao longo de quatro trimestres;

iv) um aumento de 0,7 pontos percentuais da taxa de juros Selic ao longo de quatro trimestres.

Com base em tais impactos, o CS estima que a inflação provavelmente ficaria acima do limite superior da meta em 2023, pelo terceiro ano consecutivo, e até em 2024, possivelmente o quarto ano consecutivo.

Por exemplo, se o Fed indicar uma taxa de 4,5% no fim de 2023, 150 pontos-base acima da expectativa atual do mercado, a inflação no Brasil subiria de 4,4% para 4,9% em 2023, acima do teto da meta de 4,75%, e 3,9% para 4,5% em 2024, já batendo no teto da meta (que é justamente 4,5% em 2024).

Em cenários mais extremos, à la Volcker na década de 80, com a Fed funds subindo para 6% ou 7,5%, a inflação ficaria acima do teto da meta em ambos os anos de 2023 e de 2024 — com Fed funds em 6%, estima uma inflação de 5,4% e 5,1% em 2023 e 2024 respectivamente, e com Fed funds em 7,5%, a inflação seria ainda maior 5,9% e 5,6% em 2023 e 2024, respectivamente.

A tempestade lá fora chega num momento em que – mais uma vez – o Brasil foi complacente com reformas e tem hoje a segunda maior relação dívida bruta/PIB entre as economias emergentes, altas taxas de juro real e nominal e regras fiscais pouco críveis.