PARIS – César Marcos Júnior é um tipo peculiar de influencer: aquele que fez da morte um modo de vida.

Graças à postagem de vídeos engraçados sobre seu cotidiano como coveiro em cemitérios de Paris, o goiano de 36 anos acumula centenas de milhares de seguidores no Instagram, TikTok e YouTube, onde é conhecido como Júnior Covas.

O trabalho tem dado tão certo que empresas brasileiras como o Grupo Zelo, de assistência funerária, e francesas como a rede Jardiland, de produtos para jardins, animais e decoração, já associaram suas marcas aos conteúdos postados por Júnior.

Seus procedimentos de rotina nos cemitérios vão desde a simples manutenção de túmulos, passando por enterros e até uma complexa exumação.

César Marcos Junior“Mas minhas filmagens não mostram enterros e corpos exumados. Tomo muito cuidado com isso. Nos meus vidéos as pessoas acompanham o meu trabalho com quase ninguém mais presente na tela,” conta.

Recentemente, o goiano postou um vídeo sobre o mau estado em que se encontrava o túmulo da princesa Januária de Bragança, filha de D. Pedro I, que descansa eternamente no famoso Père-Lachaise, o cemitério que também é a morada de personalidades como Jim Morrison, Allan Kardec e Chopin.

“Dei um grau no túmulo da princesa. Logo depois surgiram um monte de perguntas, como onde achar o túmulo, que produto usei para limpar o mármore etc”. Numa postagem dias depois, Junior – que primeiramente tinha limpado o túmulo sem cobrar – aparece comprando flores, terra e vasos na Jardiland para enfeitar o túmulo da princesa.

“O segredo é saber produzir um conteúdo em função da empresa patrocinadora,” ensina Júnior, que recentemente recebeu propostas de patrocínio de empresas de seguro de vida e de ferramentas. (Ele não diz quanto ganha com os vídeos nem o salário como coveiro.)

O goiano conta que começou a postar conteúdo em 2020, mas como eram muito sérios, não repercutiam. “As pessoas reagiam dizendo, ‘ai credo!’”.

Mas, quando o “Senhor das Covas” – como ele se autodenomina – decidiu descontrair e fazer as brincadeiras sobre seu dia a dia, o público começou a se engajar.

“Eu dizia para mim mesmo, ‘cara você tem que ser você mesmo, um cara que gosta de fazer piadas, brincar com as palavras. Foi então que fiz um vídeo dizendo que estava com o pé na cova. E aí, mostrei que eu estava trabalhando,” diz ele sobre o começo das brincadeiras.

“As pessoas achavam que eu interpretava um personagem quando se deram conta que eu era um coveiro de verdade.”Para Júnior, a morte é o assunto mais difícil de gerar material para o humor, mas tem dado certo por fazer piadas com a sua profissão – e não com as mortes das pessoas.

Num dos vídeos, ele está no meio de um cemitério e diz que “60% das pessoas quando descobrem que sou coveiro falam credo; os outros 40% não falam nada, até porque já viraram meus clientes,” brinca.

O coveiro conta que antes de fazer qualquer publicação pensa muito bem nas palavras e imagens que vai usar. “Se eu falar assim: ‘você vai morrer’, provavelmente ninguém mais vai me seguir. Mas se eu disser, ‘você vai virar meu cliente’, a abordagem muda, tende a ser engraçado, faz as pessoas sorrirem.”

Antes de vir para a França, Júnior chegou a cursar publicidade na PUC-Goiânia, mas não concluiu o curso por falta de grana. Trabalhou como auxiliar administrativo na Assembleia Legislativa e, em 2016, instalou-se definitivamente em Paris, onde mora sua irmã. Hoje, o brasileiro chefia uma equipe de coveiros de uma empresa fúnebre que presta serviço para diversos cemitérios de Paris.

“O trabalho não é fácil,” conta. “Temos hora para começar, por volta das 8h, mas não temos hora para terminar. Tanto no inverno quanto no verão, trabalhar com temperaturas extremas é terrível. Não tem clima bom para quem trabalha em lugares abertos.”

Ao trabalhar em cemitérios, ele teve uma outra visão da profissão e foi aos poucos “convertendo”, como diz, seus “futuros clientes” ou “futuros inquilinos”.

“As pessoas sempre me perguntam, “mas você não tem medo de trabalhar num cemitério? Respondo não. Tenho medo de dois caras em cima de uma moto no escuro. O cemitério é um lugar de paz.”

Agora, o goiano tem um novo projeto para as redes sociais. Em breve, vai postar vídeos de entrevistas com pessoas famosas e também desconhecidas em Paris. “O objetivo é pegar as pessoas desprevenidas, na rua, em suas casas, em locais que a gente sabe que ela vai estar e fazer perguntas fúnebres”.

“Temos de desmistificar a morte, este assunto tabu que muita gente evita”, diz. “Não quero chocar ninguém com os meus conteúdos e, sim, que entendam que um dia tudo acaba. Os meus vídeos são um convite para ter um papo sobre o assunto. É como se eu dissesse, então, vamos conversar? Já pensou sobre este tema?”