A economia global está na pior, mas as Bolsas americanas estão bombando como nunca.

Para Bill Ackman, o motivo é claro: índices como o S&P 500 e o Nasdaq representam as empresas líderes da economia, e a disrupção econômica causada pela covid tende a esmagar os concorrentes menores, levando as grandes a ganhar mercado.

O fundador da Pershing Square conversou com André Esteves numa live esta semana

Abaixo, um trecho da entrevista em que Ackman responde ao controlador do BTG se haveria uma bolha no mercado americano.

10289 604b6e81 d5f0 0288 0000 ba350b237a4aVocê também é uma pessoa de mercado e, como você sabe, “o mercado” é uma generalização. Ele tem setores específicos que podem estar sub ou sobrevalorizados. O mercado não está totalmente errado. O que acontece é que as grandes empresas dominantes… temos o Starbucks no portfólio, por exemplo, que é uma rede de cafeterias dominante. 

O que acontece com a pandemia é a que as redes pequenas e locais de café estão sendo dizimadas. Elas não têm os recursos, aplicações digitais, o delivery e a robustez financeira das empresas dominantes.

A pandemia é mais ou menos como a maré baixando… é aquilo que o Warren Buffett diz, ‘quando a maré baixa é que vemos quem estava nadando nu’. Na China tinha uma rede chamada Luckin Coffee que normalmente competia com a Starbucks e que, no final, era uma fraude. Foi a pandemia que revelou isso. 

As companhias dominantes estão ganhando share, elas têm a estrutura de capital necessária para sobreviver e vão sair mais fortes da crise. 

A Lowe’s é um ótimo exemplo. As lojas pequenas de materiais de construção estão sofrendo, mas a Lowe’s está tendo o melhor ano de sua história: o same-store sales está crescendo 35%… E isso só é possível porque eles tem um supply chain que permite ter acesso aos produtos que os consumidores querem, tem lojas amplas com pé direito alto onde as pessoas se sentem seguras e confortáveis. Então, eu acho que a história dos mercados hoje é a história das grandes companhias dominantes conseguindo uma melhor posição competitiva. 

De um lado você tem as Amazons, os Googles, os Facebooks da vida, empresas cujos negócios foram beneficiados e valem muito mais por conta da pandemia. Do outro lado, você tem os negócios menores e locais, que vão sofrer muito. Mas no mercado de ações você não tem uma representação desses pequenos negócios, não tem um índice dos pequenos negócios. 

Então, o que você está vendo no mercado de ações é o crescimento da dominação das grandes companhias e acho que isso está refletido de forma muito precisa no mercado e no preço das ações. E você tem que adicionar a isso o nível atual da taxa de juros, que permite que as empresas troquem dívida cara por barata ou levantem dinheiro com juro baixo. Isso obviamente é positivo para os acionistas e é bom para construir um modelo de fluxo de caixa descontado para o negócio. 

Acho que esses dois fatores combinados sugerem que o mercado ainda tem espaço para subir. 

Esteves respondeu que o cenário é parecido no Brasil, e complementou:

10066 480c5028 caa5 0008 0bd4 b4b0861863c8É o que alguns têm chamado de ‘corporate inequality’ (desigualdade corporativa). Fala-se muito na desigualdade, e você tem uma desigualdade grande entre as companhias, com algumas tendo mais acesso ao mercado de capitais. Num país como o Brasil, em que os ciclos são muito agressivos, quando você tem acesso aos mercados isso faz uma diferença enorme. 

Alguns varejistas brasileiros, por exemplo, foram muito rápido ao mercado, se capitalizaram e conseguiram capital adicional para investir e eventualmente até adquirir market share das empresas que não têm o mesmo acesso. 

E o mesmo pode ser dito sobre a tecnologia. Além do acesso ao mercado de capitais, o acesso à tecnologia é muito importante. As companhias que têm um uso melhor da tecnologia e que se beneficiam mais dessa transformação digital vão se sair melhor.

Esses dois eventos combinados estão criando uma nova classe de companhias que tende a representar a maior parte do mercado. Claro que aqui [no Brasil] a questão política e macroeconômica pesa mais do que num mercado maduro, mas o fenômeno corporativo é exatamente igual ao dos Estados Unidos.