Candidatíssimo à presidência da Câmara em fevereiro, Arthur Lira veio a São Paulo para dois dias de conversa com o PIB e o mercado financeiro ontem e hoje. 

11213 1cfd225b 5f04 29ce 244d c3536e4fe5eaO líder do Progressistas (PP) e cacique do Centrão diz que os relatos de que estaria obstruindo votações para pressionar por mais espaço na Comissão Mista de Orçamento não passam de uma narrativa do jornalismo político numa época de falta de notícias. 

Arthur se comprometeu a colocar os três partidos que ele representa para sessões consecutivas de votação entre 16 de novembro e 20 de dezembro. 

“A PEC Emergencial tem que ser votada, e se o Senado demorar muito eu me proponho, com meus partidos, a pautar o PLP 137, do Deputado Mauro Benevides Filho, do Ceará, e a PEC [da Calamidade] do deputado Rigoni,” ele disse ao Brazil Journal. “Essas pautas são essenciais, mais até do que a Tributária.”

O deputado também disse achar ruim a antecipação da campanha à presidência da Câmara, mas passou os 50 minutos da entrevista dizendo inúmeras vezes: “eu não faço a pauta…”

Arthur jurou fidelidade ao ajuste fiscal, disse que o mercado precisa entender como o Congresso funciona “para saber quando e onde pode cobrar” e repetiu que a legislatura atual é uma das mais reformistas e liberais da história do Parlamento. 

Perguntado qual seria a melhor headline que resumiria esta entrevista, o deputado olhou para baixo antes de encarar a câmera do Zoom e disparou: “Arthur Lira tem a pauta certa para o Brasil.”

Deputado, para o brasileiro médio, o Centrão às vezes parece uma entidade mítica, com superpoderes políticos. Defina pra gente: o que é o Centrão?

O Centrão é a força moderadora. O Centro é o equilíbrio. Sem o Centro nada acontece. O Rodrigo [Maia], no discurso dele da aprovação da reforma da Previdência, ressaltou, enalteceu e elogiou que sem o Centrão ele não conseguiria ter votado e não conseguiria ter aprovado… Porque na hora das matérias difíceis, só os deputados de centro, os moderados, que não tem posições radicais de um lado ou de outro, é que aguentam votar determinadas matérias. Sempre pegamos os espinhos do caule das plantas, mas poucas vezes sentimos o cheiro das pétalas. 

Por que a agenda de reformas não anda?

Nós tivemos um ano atípico, isso tem que ser reconhecido. Você não tem como fazer articulações com 513 deputados como eram feitas anteriormente no Plenário, puxando um para o lado, fazendo um acordo com outro, conversando no pé do ouvido… Tudo isso deu uma arrefecida pela Pandemia.  

Depois teve: ‘é a minha reforma Tributária’, é a ‘reforma Tributária do plenário’, é a ‘reforma do Governo’… e nós chegamos ao entendimento de que seria  a reforma tributária possível para o Brasil, de maneira que cumprisse o seu objetivo maior que era de desburocratizar, melhorar a situação, facilitar a vida dos empresários, gerar emprego. 

Outra coisa que eu vinha dizendo é que não cabia a antecipação do processo eleitoral [para a presidência da Câmara]… Quando você fala de processo eleitoral interno, os interesses partidários afloram de uma maneira que você dificulta a vida, você encurta o mandato do deputado Rodrigo [Maia], você encurta o mandato do presidente Alcolumbre e você começa a ter dificuldades internas… e nós tivemos a responsabilidade de não antecipar processos. 

Onde se antecipou o processo no meu ponto de vista? Discussões no Supremo com consultas… A Constituição é clara: é vedada a recondução no mesmo período legislativo para o mesmo cargo daquele integrante. A dúvida que se cria é como o Supremo vai fazer essa análise.

Isso mexeu com o humor das duas casas e aí parou um pouco. Foi o único motivo? Não, mas isso atrapalhou. E aí eu te pergunto: do que está dependendo a pauta da reforma tributária? Da entrega do relatório! O relator está há dois anos com o relatório debaixo do braço e não entregou!  Já ouviu, conversou, viajou, criou-se uma Comissão sem previsão regimental… porque uma comissão especial composta por senadores e deputados não existe no regimento, mas nós fizemos como um gesto para dar participação das duas Casas nesse período de pandemia. E até hoje não temos relatório. Então somos nós [que obstruímos as reformas]? Eu nem faço pauta nem posso votar sem relatório. 

Não são vocês, mas quem é? Não dá para colocar num CPF só, é uma conjuntura toda?

Institucionalmente quem pauta são os presidentes junto com o colégio de líderes. Mas quem faz a pauta da Câmara e do Senado são os respectivos presidentes. Além disso, qualquer projeto só estará apto para votação depois que cumprir os procedimentos regimentais, tiver uma apresentação do relatório, for aprovado na Comissão e aí sim vem para o plenário. Nós não temos sequer o relatório e aí falam que a culpa é nossa. Tem que dar nomes às situações para que se cobre de quem realmente precisa. 

De todas as reformas que estão na mesa, qual senhor considera mais urgente? E qual considera que tem mais consenso?

Fico na dúvida, porque temos que conter gastos, temos que ter limites, temos que criar pisos.  Nós como Congresso, o que eu mais combato é que o orçamento é uma peça nossa… a desvinculação do orçamento é muito importante. A desindexação, os gatilhos, os pisos que você tem que dar para ativar esses gatilhos. Isso está na PEC Emergencial… ela tem que ser votada, e se o Senado demorar, eu me proponho, com meus partidos, a pautar o PLP 137, do Deputado Mauro Benevides Filho, do Ceará, e a PEC [da Calamidade] do [deputado] Rigoni. E a Câmara vota, e eu sei que o Rodrigo vai ajudar porque é a pauta dele, ele tem esse compromisso de ajustar esses assuntos. Se o Senado demorar, a gente pauta.

Se a gente puder, nossa participação vai ser intensa, cinco dias por semana… vamos propor isso ao presidente Rodrigo Maia, para que entre o dia 16 de novembro e 20 de dezembro a gente possa fazer sessões ininterruptas, de segunda a sexta, para nos dedicarmos full time para entregar esses três assuntos que falei. 

Governadores de diversos Estados reunidos hoje num evento da Aliança disseram que a reforma administrativa precisa ser “para todos os Poderes, todos os entes federativos e incluir civis e militares.” O senhor está disposto a uma reforma administrativa que atinja diretamente as corporações?

Não vejo problema para isso. Eu acho que todos tem que fazer e contribuir. E partindo de um marco temporal de que a reforma é daqui para frente — como foi a previdenciária — é lógico que você não está alterando o jogo com ele andando. Isso diminuirá… como fizemos também na previdência, em que separamos Estados e municípios… eu acredito que o resultado foi bom porque tiramos Estados e municípios. Porque os deputados irem para os seus Estados para serem recebidos no aeroporto com sindicatos, policiais civis, policiais militares, fiscais de renda, professores, não teria a menor possibilidade. 

No caso da administrativa, tem alguns partidos na Câmara que defendem retroagir ou não. Eu acho que ela tem que ser feita como medida de sinalização que na frente as coisas terão um encaixe diferente do que acontece hoje. 

Qual diagnóstico o senhor faz da economia brasileira, olhando não só a fotografia de hoje mas o filme dos próximos dois anos? 

Eu tenho muita preocupação com a saída da pandemia. E tenho conversado muito com o Ministro Paulo Guedes, que tem dado uma visão mais ampla, mais pra frente… às vezes eu me preocupo um pouco com o hoje. Como líder tenho que dizer o seguinte: eu preciso do governo bem, para que o meu deputado vá para a base e receba o apoio da população ao que ele está fazendo no Congresso. E em determinadas regiões uma coisa pesa mais do que outra. 

Nós temos um problema, a economia tem que continuar pujante, temos que dar todas as demonstrações de cuidado com o gasto, respeitando absolutamente o Teto de Gastos, cumprindo todas as metas fiscais, fazendo todas as indicações possíveis. O que eu não consigo fazer é mágica… não consigo pegar um deputado que vai para sua base, com o governo mal de repente, e que ele venha a votar uma matéria árdua contra aquele segmento mais aquele outro e aquele outro. 

Temos que atentar que nós não temos o direito de engessar o governo como foi feito na Argentina. O cara ficou segmentado ali e depois entregou de uma maneira mais ampla e terminou como terminou, devolveu para a esquerda. O que temos de emergencial? Temos que encontrar dentro do Teto, respeitando todos os princípios, uma saída social para atender os que vão sentir primeiro na pele. No meu Estado, o desemprego aumentou assustadoramente. Quando acontecer o desmanche de tudo que votamos esse ano no Congresso, a economia vai sofrer. 

Temos que fazer nosso dever de casa. E para isso, queria colocar claramente para vocês que é importante, com muita serenidade, que a gente converse com transparência, com honestidade e diga: ‘não é possível fazer isso sem esse pré-requisito, Paulo Guedes’. Você tem que olhar com cuidado para o Renda Cidadã, o Renda Verde Amarela, o Renda Mínima, o Renda o que for… dentro de todos os parâmetros de respeito ao Teto. E nós vamos ter que arrumar o espaço fiscal para isso. 

Mas se nós não socorrermos as pessoas, vamos ter um desencadeamento de problemas sociais que talvez se reverta na economia de maneira frontal. Uma ebulição. Não é um movimento de rua não, mas um movimento mais pesado do que tivemos nos anos anteriores. 

Deputado, mas é possível fazer essa conta fechar? É possível achar o espaço orçamentário para um novo programa social, ou para um programa mais robusto para o ano que vem?

Tenho certeza que é possível. Agora, é dolorido. Não é fácil. Vai ter que cortar na pele. Por isso estou dizendo: se o governo estiver bem lá na ponta, com perspectiva de andar tudo direitinho, a população te dando cobertura, o cara volta de pulmão cheio. Passa a eleição municipal, os deputados e senadores voltam de pulmão cheio! Satisfeitos com as eleições ou não, mas com o sentimento da aprovação do governo, da estabilidade, e o cara volta com a disposição de votar temas áridos. Se ele não votar não vamos ter nada. É importante que a gente tenha isso no nosso radar com clareza. 

O senhor explicou a dificuldade dos deputados de votarem temas áridos… mas o que o senhor está dizendo é que se o governo conseguir produzir esse programa de Renda Mínima, isso reenergiza a base e os deputados conseguem aí sim fazer votações duras?

O Brasil é dividido em cinco regiões. O Sul pensa de um jeito, o Sudeste pensa parecido. O Centro-Oeste já diverge um pouco… e o Norte e Nordeste pensam completamente diferente!  São outras realidades. E nós temos nove Estados do Nordeste, mais um tanto no Norte. Sabemos que será necessário socorrer os mais necessitados, senão essas regiões vão contribuir muito para o enfraquecimento das possibilidades de votos de matérias difíceis.

Deixa eu ver se entendi.  Os deputados voltam da eleição municipal dispostos a fazer votações duras apenas se houver um programa de renda mínima, é isso?

Se houver uma possibilidade de saída para as pessoas que estão muito abaixo da linha da pobreza… 

O que foi que fez o governo melhorar sua aceitação? Falam que foi o auxílio emergencial. Não foi. Nós fazemos as pesquisas e, em março, o Bolsonaro tinha 70%-80% de rejeição em Alagoas. Quando ele fez o primeiro discurso dizendo que “pobre não tem como fazer quarentena”, que o vendedor de churrasquinho não tem como fazer quarentena, que o cara que está com a geladeira vazia não vai ver o filho morrendo de fome com medo do vírus… aquilo foi devastador, muito mal compreendido e até talvez mal colocado. Mas a partir dali, o discurso do presidente entrou nas camadas mais baixas. Começamos a ver uma mudança de eleitores. Uma mobilização. E quando entrou o auxílio, não tenha dúvida, ele foi imprescindível, essencial, necessário para a manutenção da economia, manutenção dos Estados mais pobres, e da economia dos municípios menores. 

Você tirar essa perspectiva de uma hora para a outra, com o aumento do desemprego e com essa camada sendo a primeira a ser atingida, o que vamos esperar? Vamos esperar convulsão, turbulência. E o deputado que vai para lá, com a base dele efervescente, vai votar gatilho, desvinculação? Quando você falar em desvinculação de saúde e educação naquele Congresso, você não imagina a confusão que vai dar. Mas eu prefiro trabalhar com meu deputado corajoso. E para ele ter coragem, ele precisa que o governo, que nós, que os empresários, façamos isso que estou dizendo. Vamos conversar com transparência… qual nossa preocupação? Não aumentar despesa e respeitar o Teto. Se conseguirmos fazer essa equação, qual o problema de fazer o que é necessário fazer?

Mas é muito difícil achar esse espaço fiscal, especialmente quando pegamos as reformas e falamos: é daqui para frente, não vamos mexer no para trás, que é direito adquirido. Porque aí o espaço fiscal vai vir muito ao longo do tempo e você precisa do caixa agora…

Eu não sou um expert em economia. Eu entendo um pouco de política. Mas acho que nosso problema hoje é de confiança. Temos trilhões de rolagem de dívidas que vão vencer nos próximos anos. Precisamos do dinheiro externo, e o cara não vai olhar para o Brasil no meio dessa confusão. Nós precisamos dar sinais, e os sinais funcionam como atrativos. A aprovação de uma reforma administrativa é um excelente sinal. A aprovação de uma reforma tributária mais justa é outro excelente sinal. A aprovação de uma PEC do Pacto Federativo é três vezes um excelente sinal! São sinalizações que fazem a subjetividade do mercado andar. E é nossa obrigação fazer, e vamos fazer. 

Qual probabilidade o senhor atribui a que esse Congresso surpreenda o mercado e, entre 16 de novembro e 20 de dezembro, faça o que o senhor disse que dá para fazer?

Eu estou me comprometendo pelos partidos que temos união. O Congresso é muito maior. É o presidente da Casa que indica qualquer pauta. Vamos cobrar os relatórios que foram entregues, cobrar a entrega, e cobrir o que estou dizendo. A minha predisposição, o que estou disposto a fazer, me comprometo publicamente, é dizer justamente isso. Os partidos de Centro estão dispostos, a — a partir do primeiro dia pós eleições municipais até o último dia do recesso — a fazer tempo integral para nos dedicarmos a construção de consenso e de matérias que sinalizarão de maneira muito positiva. Quando trabalhamos no mesmo sentido trabalhamos com muito mais rapidez. 

O senhor falou de vários sinais que o Congresso pode mandar com a aprovação da PLP e da PEC. Tem algum sinal que o Congresso vai mandar de privatização da Eletrobras?

Existe um acordo de texto no Senado já, não de voto, mas de texto. E precisa que seja pautado pela Câmara. Minha resposta acho que deixa bem claro de quem é a responsabilidade da privatização…. 

Olhando de fora, a gente tem a impressão de que Brasília só aprova coisas quando está com a faca no pescoço, quando a vaca já está prestes a desmoronar no brejo, aí passa. Agora, uma coisa orgânica não tem, é só na crise. Agora que o dólar está em R$ 5,80, quando bater R$ 6 talvez passe alguma coisa…

Primeiro que eu não entendo, e ninguém com quem eu converso entende, esse nível do dólar. A não ser mesmo pela falta do dólar externo, falta realmente de capital. Mas quero frisar de novo que quem faz a pauta não sou eu. Quem faz a pauta não é líder partidário, quem faz a pauta do Congresso é presidente de Câmara e do Senado. Estávamos num momento de muita participação e de muita ascensão e de muita vontade política num ano em que já tínhamos entregue a previdência, de maneira tranquila. Íamos entregar no primeiro semestre a tributária. Mas atravessamos um momento muito complicado. A pandemia mexeu com todo mundo. Você não pode de uma maneira simplista dizer que o Congresso não trabalha, que o pessoal não faz nada. Esse mandato, essa legislatura, é extremamente reformista, é extremamente liberal, ela tem dado sinais de não ter uma pauta bomba tocada por nenhum partido ou defendida por nenhum bloco. Você não teve dificuldades impostas por nós, mas por uma realidade mundial.