Entre as muitas frustrações e angústias trazidas por essa pandemia, meu problema é pequeno e, diante de tanta gente que perdeu sua fonte de renda, até me sinto um pouco culpado por externá-lo. Se estou fazendo isso é para compartilhar o que acredito ser uma angústia de muitos e, quem sabe, poder repensar sobre a decisão que tomamos aqui em casa.

Nossa filha de 7 anos recém completados está em pleno processo de alfabetização. Lendo quase tudo, mas ainda de forma hesitante, sem fluência ou entonação. Pelo que tenho acompanhado das aulas online, na média dos demais colegas.

Na semana passada os pais foram comunicados que, a partir de hoje, as crianças teriam 3 horas diárias de aula pelo computador. Até então, era uma hora só e as dificuldades já eram grandes, tanto para os alunos como para a professora. Minha primeira reação foi ficar indignado, pois tenho como impossível manter a concentração da criança por tanto tempo, além de serem insalubres o tempo de exposição à tela e a falta de condições ergonômicas adequadas. Sem falar que foram diversos os momentos em que ela tentou sem sucesso ganhar a atenção da professora para fazer uma pergunta e sequer posso responsabilizar a professora por conta disso, que está se desdobrando para fazer o melhor para 21 alunos. E, pior, sem levar em consideração a dificuldade dos pais em transformar sua casa em anexo escolar.

Mesmo assim, tento me confortar, pois minha situação é muito mais confortável do que a de diversos outros pais de colegas que, tendo outros filhos, precisarão se adaptar de forma muito mais trabalhosa. 

Nos 5 dias que tive para absorver a notícia, a indignação foi cedendo lugar à frustração e à preocupação em buscar solução alternativa. Vi pais cogitando tirar os filhos do colégio, vi pais afirmando categoricamente que já dão o ano como perdido e que o melhor mesmo seria repetir tudo no ano que vem, vi pais recorrendo a outros métodos paralelos de ensino, comprando apostilas Kumon, vi pais despreocupados achando que no final tudo vai dar certo e vi pais assumindo para si a tarefa de educadores. 

Não acredito mais que as aulas presenciais sejam retomadas esse ano. Pelo que apurei, era para minha filha estar aprendendo a escrever com letra cursiva e deduzi que deixar isso para depois da retomada poderia significar um prejuízo educacional enorme (pode ser que eu esteja exagerando, admito). Se admitirmos que ninguém estava preparado para este tipo de aula, não estamos nem falando de risco de prejuízo, mas de prejuízo inevitável.

A escola, reconheço, não tem muitas opções. É obrigada a dar uma carga horária mínima para as crianças e, por isso, não pôde adotar o que para mim teria sido a solução ideal: menor tempo de aula para turmas menores, possibilitando um acompanhamento mais de perto. Três horas diárias para uma turma de 21 crianças de 7 anos atende aos requisitos mínimos, mas apenas de forma burocrática, cumprindo tabela, sem preocupação com a qualidade. Mas como não temos Ministro da Educação, quem irá se preocupar com isso? As preocupações com a educação infantil parecem estar no fim da fila das prioridades, e vejo com tristeza escolas infantis demitindo funcionários e fechando as portas.

Voltando ao meu universo particular, minha filha única, nestes mais de 100 dias, mal teve contato com outras crianças de sua idade e tem passado quase todo o seu tempo livre assistindo TV, o que nos incomoda bastante. Como eu e minha mulher estamos em esquema de home office e não podemos dar a atenção devida, acabamos desistindo de nos estressar.

Resolvi conversar com sua professora do ano anterior, que já havia lecionado para turmas de 1º ano, e acabamos acertando para que ela viesse aqui em casa, nos ajudar neste momento tão delicado. As aulas online serão assistidas enquanto ela tiver interesse e paciência (não iremos desestimular, mas não iremos forçar), mas ela terá este acompanhamento individual. Sem tanta preocupação com conteúdo, mas com o cuidado e a atenção que só aula presencial pode proporcionar. Com o objetivo principal, quisemos deixar claro, de fazer com que o aprendizado seja prazeroso.

Não temos como saber se estamos fazendo o certo. Nem sabemos se existe “o” certo. Estamos nos guiando pela intuição, preocupados em dar a ela o melhor que podemos. Pudemos perceber que ela ficou super feliz em reencontrar sua antiga professora e que a primeira “aula” fluiu muito bem. Torcer para que isso seja um sinal de que estamos trilhando um bom caminho.

Bruno Rabello é casado com a Vânia e pai da Alix.