A entrada da Linx no mercado de cartões é tão óbvia que a pergunta parece inevitável: por que não fizeram isso antes?
A empresa anunciou ontem a criação de uma subadquirente, entrando num mercado que transformou a PagSeguro e a Stone em gigantes de dezenas de bilhões de reais e tem, segundo a própria Linx, potencial para triplicar sua receita.
Em sua disputa pelo mercado das concorrentes, a Linx tem vantagens naturais.
A companhia é a líder isolada, com mais de 40% de share, no mercado de softwares de gestão de varejo e está em boa parte dos pontos de vendas dos varejistas formais do País – da padaria da esquina a gigantes como o Walmart, e incluindo a maior parte do varejo de moda.
Se metade dos R$ 250 bilhões que passam pelos seus sistemas de gestão se transformarem em pagamentos processados pela Linx Pay, a nova empresa pode ser tornar a quarta maior do mercado, atrás apenas daquelas ligadas a grandes bancos – Cielo, Rede e GetNet. A Stone e a Pagseguro – as potências emergentes do mercado – processam R$ 48 bilhões e R$ 38 bilhões por ano, respectivamente.
Considerando um ‘take rate’ de 1,3% por transação, o novo empreendimento pode se traduziria num faturamento anual de R$ 1,6 bi – mais de duas vezes os R$ 700 milhões que a Linx deve faturar este ano.
Desafios de execução à parte, a iniciativa é o movimento mais transformacional da Linx, uma empresa celebrada pelos gestores fundamentalistas mas que, com R$ 3 bilhões de valor de mercado, voa abaixo do radar de muitos investidores.
Adicionar o prefixo ‘fin’ a uma empresa de ‘tech’ pode fazer essa realidade mudar.
Em reação ao anúncio, a ação subiu 8% com um volume cinco vezes acima da média.
“A companhia vale R$ 3 bi, e vem com uma potencial Stone, de R$ 25 bi, dentro”, diz um gestor que carrega o papel.
O lançamento do Linx Pay é o sinal mais evidente de uma transformação que vem acontecendo há pelo menos um ano e meio na companhia.
Denis Piovezan, um executivo com passagens pelo Banco Ibi e pela Brasil Plural, entrou na Linx há pouco mais de um ano para focar na monetização de um potencial pouco explorado: o acesso às transações financeiras dos varejistas que já são clientes da empresa. Ele reporta diretamente ao CEO, Alberto Menache.
O caminho em direção à fintech começou com uma oferta diferente de TEF, o sistema que permite que a máquina de cartão seja integrada aos terminais do ponto de venda e faz a comunicação entre o estabelecimento e a operadora do cartão.
O TEF da Linx consegue determinar qual credenciadora tem a condição mais vantajosa para determinada operação e fecha automaticamente a transação com ela.
Hoje, cerca de 40% da base da Linx usam o TEF da empresa – pagando uma assinatura fixa num pacote que inclui ainda uma solução de conciliação, que garante que a adquirente está repassando e cobrando tudo direitinho.
O passo seguinte veio com uma parceria comercial com a Rede: a Linx recebe uma comissão por cada transação que converte para a credenciadora do Itaú. Funciona assim: se a Linx percebe, por exemplo, que um cliente está usando mais a Cielo porque as taxas da Rede estão mais caras no crédito, pode comunicar à credenciadora para fechar uma condição mais atrativa.
A subcredenciadora é a evolução deste modelo.
Agora quem determinará as taxas é a Linx, apropriando-se de um economics muito maior no negócio. A Linx seguirá usando o sistema de credenciamento da Rede, que atuará como prestadora de serviço.
Além disso, a Linx oferecerá também a antecipação de recebíveis, completando o pacote de serviços que normalmente é avaliado pelo cliente quando vai decidir qual a credenciadora mais atrativa (muitas vezes o MDR é mais caro, mas a taxa de desconto da antecipação faz o combo valer a pena).
Segundo Piovezan, o funding para a antecipação de recebíveis virá da Rede – e a Linx terá uma comissão do negócio. “É um casamento que está funcionando muito bem”, disse ao Brazil Journal.
Analistas, no entanto, apostam que é apenas questão de tempo para que a Linx vire um ‘full acquirer’.
Por atuar com varejistas com faturamento na casa de pelo menos centenas de milhares de reais, a Linx Pay deve competir mais diretamente com as credenciadoras dos grandes bancos e com a Stone.
Piovezan já sinaliza que a ideia não é brigar por preço, mas oferecer uma proposta de valor com os serviços agregados.
Numa apresentação feita ontem a analistas, a Linx deu uma ideia de onde pretende se posicionar em preço: nas simulações de potencial receita, a empresa usou como hipótese um ‘take rate’ de 1,3% – contra 1,48% da Cielo, 1,72% da Rede, 1,28% da Getnet e 1,09% da Stone.
A metamorfose da Linx inclui ainda outra área que vem sendo apontada como um filé por parte dos investidores: os serviços omnichannel.
Desenvolvido pela empresa, o OMS (Order Management System) integra todo o sistema de vendas online e offline do varejista. Mais especificamente: ele faz o controle de estoques num mundo cada vez mais complexo, em que o cliente pode tanto comprar na Internet e retirar na loja quanto comprar na loja e receber em casa.
A solução também calcula automaticamente o frete mais barato e a empresa de logística que pode entregar mais rápido, integra franquias ao sistema de ecommerce da matriz e calcula eficiências fiscais no processo.
“Isso preenche uma lacuna imensa no mercado brasileiro, onde até empresas mais avançadas nessa integração, como o Magazine Luiza, ainda escorregam”, diz um gestor da Faria Lima.
A combinação do OMS com a nova solução de ecommerce da Linx (fruto de uma aquisição recente) está atraindo gente grande. Segundo o BTG, a Linx já vendeu suas novas soluções a nove grandes varejistas – incluindo Hering, Restoque, Marisa e Via Varejo.
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