André EstevesDesde que a Squadra Investimentos anunciou no mês passado que comprou 5% do capital do BTG Pactual na Bolsa, outros gestores voltaram a avaliar a ação do banco, atraídos por um retorno sobre o patrimônio de 15% e uma posição de caixa substancial.

Mas conversas com pessoas próximas ao BTG — que lutou corajosamente e sobreviveu uma corrida bancária depois da prisão de seu CEO e sócio controlador — sugerem que o banco não tem mais o punch necessário para gerar os resultados de outrora, e talvez tenha perdido a cola fundamental que une os sócios em partnerships deste tipo.

Parte do clima de ‘gloom and doom’ que hoje assola aquele que já foi o banco de investimento mais agressivo do País tem sua origem na própria economia, que ao longo do último ano não gerou os M&As e IPOs que fazem a fortuna dos bankers. Mas a maior parte do problema está na dinâmica dos sócios do BTG com André Esteves, antes seu líder inconteste, hoje um figura divisiva.

Nos últimos meses, o banco sofreu uma série de defecções importantes.  

James Oliveira, um sócio antigo responsável pela área de gestão de recursos e que tinha 5,9% da partnership que controla 80% do banco, pediu o boné, abrindo mão de uma soma avassaladora: ao sair, teve que vender suas ações ao valor de mercado, então ao redor de R$14 — um desconto de 33% sobre o valor patrimonial, que é de R$21;

Persio Arida, que assumiu como chairman do banco quando Esteves ficou preso, não é mais um executivo com funções diárias no BTG, permanecendo apenas no conselho;

Marco Gonçalves, o rainmaker da área de fusões e aquisições, deixou o banco depois de ter atraído atenção indesejada com o célebre episódio dos gastos numa boate em Nova York;

Marcelo Hallack e Rodrigo Pavan, que lideravam o private equity desde a saída de Carlos Fonseca, também deixaram o banco entre o ano passado e este;

Por fim, quatro executivos do wealth management se recolocaram em outras instituições: três no Santander e um na JGP.  

As rachaduras na partnership começaram a aparecer assim que Esteves voltou ao banco. O stress épico que atingiu o balanço do BTG foi sentido também nas famílias dos sócios e em seu patrimônio pessoal, que mergulhou junto com as ações do banco. O BTG vale hoje metade do que valia no pico. Enquanto o chefe estava em Bangu, os sócios moveram montanhas para salvar a casa.  Apesar disso, no mesmo dia em que sua prisão domiciliar foi suspensa, Esteves voltou ao banco — sem sequer comunicar a alguns sócios — como se pudesse retomar o filme onde havia sido interrompido. A natureza da relação dos sócios com seu líder máximo mudara; só ele não parecia se dar conta.

O distanciamento se aprofundou em setembro, quando os sócios se reuniram para redistribuir participações societárias, um processo meritocrático que acontece todo ano. Ali, houve um desentendimento no chamado G7, o grupo que reúne os sete principais sócios do banco.  Alguns sócios argumentaram que Esteves deveria vender parte de suas ações para os novos sócios, permitindo a ascensão de gente que comera o pão que a Lava Jato amassou quando Esteves estava preso e o banco quase ruiu.  Mas quem esperava um Esteves mais solidário — quem sabe um homem mudado pelas circunstâncias da prisão — se decepcionou.  O banqueiro bateu o pé e não se diluiu. (Coube aos demais sócios abrir mão de suas ações para que outros comprassem.)

Além disso, a frustração cresceu quando o banco pagou bônus abaixo do esperado, de forma a garantir um retorno patrimonial de pelo menos 15% e não ficar abaixo do CDI do ano, o que teria decepcionado os acionistas externos.

Ao contrário do Garantia, que sempre teve uma liderança clara, a história do Pactual é marcada por inúmeras viradas de mesa entre os sócios, inclusive com a expulsão de seu fundador, Luiz Cézar Fernandes.  Ciente disso, antes do IPO, ainda no auge de seu prestígio e fortuna, Esteves foi capaz de instaurar uma governança que lhe dava poder absoluto, diferente das outras partnerships em que o controle é difuso. Mas isso mudou depois que ele foi para a prisão. 

O Banco Central exigiu a conversão de suas ações votantes em não votantes, e Esteves — cujo cargo atual é apenas o de senior adviser do BTG — está hoje numa posição mais vulnerável dentro da partnership. “Tem gente que acha que é possível conviver com ele, e outros estãos insatisfeitos e querem sair,” diz um ex-executivo. “Mas aquele velho sonho da partnership acabou.”

A regra da partnership do BTG era simples: os sócios compravam e vendiam sua participação a valor patrimonial.  Mas depois do IPO, a regra de saída mudou: agora, eles têm que vender a valor patrimonial ou a valor de mercado, o que for menor. Com a ação negociando a R$ 14,50 no início de janeiro, muitos sócios não tinham alternativa a não ser esperar.  Mas, de lá para cá, o papel andou, e agora negocia a R$ 19, oferecendo um incentivo a muita gente que estava pensando em sair. Muitos sócios rezam para que o banco não se veja envolvido em outros episódios que voltem a deprimir o preço da ação.

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Como sempre fez ao longo de sua carreira, Esteves continua almoçando, jantando e respirando o BTG.  Nos últimos meses, tem jogado seu carisma e capacidade de persuasão para convencer famílias bilionárias de São Paulo a investir na área de gestão de fortunas do banco, que administra cerca de R$ 74 bilhões.

O banqueiro tem dito aos potenciais clientes que ele mesmo orientará os investimentos e, para tranquilizar quem lhe pergunta sobre o risco do BTG, ele responde que o investidor pode escolher custodiar os ativos junto a terceiros.

Um dos clientes potenciais procurados por Esteves — que ainda se diz indeciso — notou que o wealth management do banco era o segundo maior investidor na Silverado, a gestora de fundos de crédito cujo negócio implodiu espetacularmente ano passado, machucando o JP Morgan (o maior cliente) e diversos family offices de São Paulo.  Outro se preocupa com conflitos de interesse na alocação de recursos num momento em que o banco ainda está se recompondo: é comum a área de gestão patrimonial alocar o dinheiro de clientes em fundos de private equity e produtos próprios.

Os esforços de Esteves — que envolvem convites para jantar em sua casa e garrafas de Petrus e Château Margaux — servirão como uma espécie de teste de credibilidade para o banqueiro, que tem demonstrado resiliência extraordinária para quem foi do topo do mundo ao quase ostracismo; ele ainda mantém seu mojo?

Clientes potenciais que foram abordados por Esteves dizem que ele não perdeu sua capacidade de sedução.  “Não mudou nada,” diz um deles.