A Caipirinha, o autorretrato cubista pintado por Tarsila do Amaral em 1923 e cujo título faz referência à sua origem no interior paulista, foi vendida agora à noite por R$ 57,5 milhões.

O óleo sobre tela, de 60 cm x 81 cm, produzido um ano após a Semana de Arte Moderna enquanto Tarsila estava em Paris, tinha um lance mínimo de R$ 47,6 milhões. 

O comprador foi um colecionador brasileiro que (ainda) não foi identificado. O leilão — um total de 19 lances em incrementos de R$ 500 mil — acabou em 15 minutos.

O preço estabelece um novo recorde para uma obra de arte em leilões em solo nacional. Até então, os recordes de vendas públicas no país eram de Superfície Modulada nº 4, de Lygia Clark, que trocou de mãos por R$ 5,3 milhões em 2013, e Vaso de flores, de Alberto da Veiga Guignard, arrematado dois anos depois por R$ 5,7 milhões (ambos valores da época, sem correção).

O leilão foi organizado por Jones Bergamin, o Peninha, presidente da Bolsa de Arte. 

Seis interessados na obra se cadastraram para o leilão 48 horas antes.

Tarsila deu A Caipirinha — então seu melhor quadro — de presente para Olívia Guedes Penteado, a grande patrona dos modernistas nos anos 1920. O quadro ficou na família de Olívia por três gerações, até que seu neto, Goffredo Silva Telles, o vendeu ao empresário Salim Taufic Schahin nos anos 90. 

Com a falência da Schahin, os bancos credores botaram a obra no prego — tecnicamente, uma ‘venda por alienação de instrumento particular.’ 

A venda de hoje é o capítulo mais recente de uma redescoberta de Tarsila, cuja vida ganhou carga dramática quando a artista perdeu o marido Oswald de Andrade para a jovem Pagu e em seguida sofreu com a falência das fazendas de café no crash de 1929.

A revalorização de sua obra começou em 1995, quando o empresário argentino Eduardo Costantini comprou o Abaporu por US$ 1,3 milhão durante um leilão em Nova York, depois de a obra ter sido oferecida a diversos industriais e banqueiros paulistas.

Mais tarde, Costantini fez do Abaporu a atração central do Malba, o Museu de Arte Latina de Buenos Aires, inaugurado em 2001.

Em 2018, o MoMa e o Art Institute of Chicago co-organizaram a retrospectiva “Tarsila do Amaral: Inventing Modern Art in Brazil”, a primeira mostra dedicada à artista nos EUA. 

No ano seguinte, o MoMa foi além: pagou estimados US$ 20 milhões para incorporar A Lua (1928) à sua coleção. O quadro pertencia ao casal Milton Guper e Fanny Feffer, que o havia comprado diretamente de Tarsila nos anos 50.

Com o mundo todo reconhecendo Tarsila, o Brasil parecia finalmente pronto para apreciar sua arte. Foi quando o MASP abriu suas galerias para “Tarsila Popular”, que teve mais de 400 mil visitantes e fez o próprio museu mudar de patamar.

“O País descobriu uma artista cuja vida teve paixão e solidão, drama e complexidade. A Tarsila é a Frida Khalo de um país maior,” diz Ronaldo Cézar Coelho, que emprestou sua Tarsila — ‘Composição (Figura só)’ — ao MASP em regime de comodato.  

A Tarsila de Ronaldo foi a estrela de Tarsila Popular e, ao final da mostra, Ronaldo a emprestou ao MASP por mais três anos. E quando o período acabar?  

“Essa Tarsila não cabe mais na minha sala,” diz o investidor. “Ela cresceu muito fora de casa…”

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