Há anos, o mercado de mídia dos EUA convive com o boato — cíclico — de que Michael Bloomberg gostaria de usar parte de sua fortuna de 33 bilhões de dólares para comprar o The New York Times, que vale cerca de 2 bilhões de dólares na Bolsa de Nova York.
Na sexta-feira, o boato ressurgiu com força depois que a New York Magazine revelou que o próprio Bloomberg manifestou seu interesse diretamente à família Sulzberger, que controla o Times, no final de seu mandato como prefeito de Nova York.
Com todo mundo falando do assunto, Lloyd Grove, editor do site The Daily Beast, revelou uma conversa que teve com o publisher do Times e controlador da Times Company, Arthur O. Sulzberger Jr., sobre uma suposta oferta de Bloomberg.
Em julho de 2013, durante um café da manhã com Sulzberger na sede do jornal, Grove perguntou ao publisher sobre os boatos.
“O Times não… está… à venda!” respondeu Sulzberger — batendo a mão espalmada sobre a mesa e enunciando as palavras para dar ênfase, de acordo com o relato de Grove.
Quando Grove insistiu — “NuncajQuery32107844832562465929_1502033489790” — deu-se o seguinte diálogo:
“Quantos filhos você tem?” Sulzberger perguntou.
“Dois”, disse Grove.
“E algum deles está à venda?”
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O interesse de Bloomberg pelo NYT e a eventual necessidade de uma capitalização da empresa pelos Sulzberger convidam a uma reflexão sobre o modelo de financiamento da imprensa num momento de transição delicado.
A base de assinantes dos jornais impressos declina há anos. Já o faturamento de publicidade dos jornais na internet tem subido, mas não o suficiente para compensar a queda na publicidade impressa.
Enquanto o jornalismo impresso tenta adaptar seu modelo de negócios e fazer esta travessia, muita gente acha que o jornalismo de qualidade só poderá ser salvo por bilionários com espírito público, ‘self made men’ interessados em manter a independência editorial que fez a fama de muitos jornais.
O modelo que todo mundo tem em mente é a compra em 2013 do The Washington Post, o jornal que ajudou a derrubar um presidente americano, por Jeff Bezos, o bilionário controlador da Amazon.
Bezos disse, na época, que iria dar ao Post a estabilidade financeira necessária para que o jornal pudesse experimentar com seu modelo de negócios até achar uma nova fórmula sustentável.
Bloomberg não seria o primeiro bilionário a se envolver com o NYT.
Em janeiro de 2009, o jornal precisou de capital, e achou US$250 milhões nos bolsos de Carlos Slim, controlador da Telmex e da América Móvil (a dona da Claro), e que reveza com Bill Gates o título de homem mais rico do mundo.
Depois de emprestar dinheiro a 14,1% ao ano, Slim agora é dono de 16,8% das ações preferenciais da Times Company. (Os Sulzberger detêm as ações que efetivamente controlam o jornal).
O Times já quitou a dívida, mas a vida continua dura para o jornalismo impresso.
No fim do ano, o Times cortou mais 100 funcionários em sua redação — para poder contratar mais gente para o seu site, como programadores de internet e jornalistas de vídeo.
O jornal faz estes cortes há seis anos. Demitiu 100 pessoas em 2008, outras 100 em 2009, e 30 outras no início de 2013.
Apesar destes cortes (e incluindo as novas contratações), a redação do NYT tem hoje 1.230 funcionários, mais ou menos o mesmo número do final de 2013.
Os pesados investimentos na área digital levaram a Times Company a um prejuízo operacional de 9 milhões de dólares no terceiro trimestre do ano passado (o último divulgado), comparado a um lucro operacional de 12,9 milhões no mesmo trimestre do ano anterior. A ação do NYT está em queda de 9% nos últimos doze meses.
Não está claro que bilionários altruístas — pelo menos no caso de Bezos, ele parece reconhecer a importância do jornalismo independente como um bem difuso, de valor para a sociedade — serão a salvação dos jornais.
Mas talvez sejam os mecenas de uma transição que ninguém sabe bem onde vai dar.
Diz um analista que se interessa pelo assunto: “O desafio dos jornais é mostrar que o bom conteúdo tem um custo, e que você tem que pagar por ele. Muitos jornais, como o próprio The New York Times e o The Wall Street Journal, criaram paywalls que deram certo, mas a maior parte do conteúdo jornalístico ainda está de graça na internet, e isso, para o bem do bom jornalismo, tem que mudar.”