De implicadas na Lava Jato a vítimas da crise – incluindo todas as interseções entre os dois riscos – nunca antes na história deste País tantas grandes empresas estiveram com a corda no pescoço.

E o impacto disto é preocupante para os bancos: segundo um estudo detalhado feito pelo Credit Suisse, as dívidas de grandes empresas ‘problemáticas’ – muito endividadas ou com geração de caixa apertada em relação aos juros a vencer – representam 55% do patrimônio do sistema bancário, mais que o dobro da média de 27% dos últimos dez anos.

A exposição bancária a grandes devedores em dificuldades é uma dúvida que assombra há tempos o mercado. Mas, diante da pouca abertura de informações por parte das instituições financeiras, sempre foi difícil achar uma resposta.

O time do Credit Suisse optou, então, por procurá-la em outro lugar: nos balanços das devedoras.

Partiu da base de dados da consultoria Economática, que leva em conta 410 empresas não-financeiras de capital aberto, e definiu uma espécie de grupo de risco: empresas com relação entre dívida líquida e geração de caixa acima de três vezes, ou índice de cobertura de juros (resultado operacional/despesas financeiras) abaixo de 1,5x.  Com base nesses parâmetros, o CS encontrou R$ 558 bilhões em dívidas ‘problemáticas’. 

Como a dívida total das empresas da amostra Economática (R$ 1,07 trilhão) respondia por 68,2% do estoque da dívida corporativa brasileira divulgada pelo Banco Central (R$ 1,58 trilhão), uma extrapolação para todo o sistema leva a conta dos empréstimos na UTI para R$ 818 bilhões.

(Detalhe importante: a Petrobras foi excluída da amostra porque, apesar do endividamento alto, o CS considera que seu risco de calote é igual ao risco soberano).

Como os bancos nacionais têm, em média, 53% de todas as dívidas corporativas do País (entre empréstimos e títulos de dívida), é razoável assumir que tenham a mesma ’share’ dos abacaxis, o que afunila o número para R$ 434 bilhões.

Por fim, do estoque total de R$ 198,3 bilhões em provisões para calote, o banco calcula que R$ 81,8 bilhões são referentes a grandes empresas. Subtraindo-se esse montante, temos o resultado: o saldo de exposição líquida aos grandes e problemáticos é de R$ 352,7 bilhões – contra um patrimônio total dos bancos de R$ 636,5 bilhões.

Evidentemente, trata-se de uma conta aproximada e nem todos esses empréstimos vão se tornar inadimplentes. E, mesmo entre aqueles que eventualmente derem o calote, a perda não será de 100%. 

Mas o estudo do CS foi além das provisões e capturou o risco dos inúmeros financiamentos que vem sendo renegociados e rolados nos últimos meses – o famoso jogo de ‘extend and pretend,’ que evita uma perda no curto prazo mas, em alguns casos, apenas adia o problema.

As provisões para perdas efetivas vêm aumentando trimestre a trimestre. Mas quando comparadas com a evolução das “dívidas problemáticas”, elas ainda estão baixas: nas contas do CS, ao fim do segundo trimestre, as provisões totais dos bancos para grandes empresas representavam apenas 18,7% dos empréstimos para companhias muito endividadas.

Para retornar à média histórica, próxima dos 30%, as provisões somente para o crédito aos grandes teriam que aumentar R$ 118,3 bilhões — o equivalente a 60% do total de provisões de todo o sistema, incluindo varejo e pequenas e médias.

Os números levantados também dão uma medida do aperto das empresas nacionais.

A relação entre dívida líquida e Ebitda da amostra está em 2,7 vezes (excluindo Petrobras) neste ano, muito acima da média de 1,6 dos últimos 15 anos. Pior: 56,5% das empresas analisadas estavam com índice acima de três vezes, contra média de 33,2% nos últimos dez anos.

Diante desse cenário, o banco acredita que, mesmo com a melhora na economia, uma recuperação rápida nos indicadores de inadimplência é improvável, e o risco de crise de liquidez não está completamente afastado. 

“A retomada da economia e a implantação de uma política fiscal crível para reduzir as taxas de juros são cruciais para eliminar o risco de um aperto de crédito de uma vez por todas”, alertam os analistas.